Por Agência Ecclesia
A religiosa irlandesa Maura Lynch recebeu hoje em Lisboa o Prêmio Norte-Sul 2014 do Conselho da Europa, numa cerimônia presidida por Aníbal Cavaco Silva, chefe de Estado português, na Sala do Senado da Assembleia da República.
A irmã Maura Lynch, cirurgiã e obstetra, está em Uganda desde 1989, onde fundou uma clínica no sudoeste do país, dedicando sua vida a promover a dignidade das mulheres e o acesso aos cuidados de saúde, em particular no tratamento da fístula obstétrica.
"É importante que as pessoas saibam que isto continua a acontecer, que há mulheres que sofrem desta incapacidade degradante, de não controlar a urina", explica à Agência ECCLESIA.
Depois de 20 anos em Angola e mais de duas décadas em Uganda, a religiosa defende uma aposta maior na prevenção, recordando que em muitos países "as mulheres não têm qualquer estatuto", trabalhando no campo e em casa.
As complicações do parto e a falta de acompanhamento médico na gravidez provocam um elevado número de casos de fístula obstétrica (estima-se que existam entre dois a três milhões de casos nos países em desenvolvimento), com fortes consequências sociais e econômicas sobre as mulheres.
"Perdem tudo, a dignidade, a sua família, toda a sua vida, porque se querem esconder. A sociedade também as marginaliza e isso é terrível", relata.
Segundo a irmã Maura Lynch, é "importante educar as mulheres e os homens" para alterar esta situação, que tem como pano de fundo a discriminação.
Além disso, é necessário investir nos cuidados de saúde profissionais, "necessariamente gratuito"; evitando o recurso a parteiras tradicionais sem "qualquer treino", para salvar as vidas dos bebés e das mães.
A serviço das Missionárias Médicas de Maria, Maura Lynch ajuda para que todas as mulheres tratadas na clínica estejam preparadas para a "reintegração na sociedade", com alguma fonte de rendimento, desde pequenas hortas domésticas à costura.
"Cada mulher que vem para a cirurgia fica pelo menos três semanas conosco, até termos a certeza de que está bem", assinala.
A sua vocação nasceu aos 12 anos, na escola, ao ver um filme com o trabalho das religiosas da sua atual congregação, na Nigéria.
"Disse ‘é isso que quero ser' e desde esse dia nunca mudei, sempre quis ser missionária", confessa.
A religiosa proferiu uma conferência dia 29 de junho na Universidade Portuguesa Católica, em Lisboa, com a presença de responsáveis da instituição acadêmica, do Centro Norte-Sul do Conselho da Europa, da Embaixada da Irlanda em Portugal e de Dom Nuno Brás, bispo auxiliar de Lisboa.
O Prêmio Norte-Sul distingue todos os anos duas personalidades que, pela sua ação e exemplo, contribuem para a defesa e promoção dos direitos humanos e do pluralismo democrático, bem como para o fortalecimento da solidariedade destas regiões do mundo.
"Através do seu trabalho e da sua perseverança, a Dra. Maura Lynch tem tido um papel ativo na defesa do direito das mulheres ao acesso aos cuidados primários de saúde, na defesa da sua dignidade e, em muitos casos, da sua sobrevivência. Os reconhecimentos que obteve ao longo da carreira atestam bem a dedicação e determinação da laureada mas, também, a importância da sua obra", disse Aníbal Cavaco Silva na cerimônia oficial de entrega.
O outro distinguido desta edição é André Azoulay, conselheiro senior do rei de Marrocos, desde 1991, que se dedicou à promoção do diálogo entre culturas, populações, mulheres e homens da bacia do Mediterrâneo.