Igreja e Resistência

Isaack Mdindile

"Igreja e Resistência: Um olhar sobre a Igreja nos anos de chumbo" foi o tema refletido nessa quarta-feira, 8 de outubro, pelos quase 400 participantes do Simpósio de Teologia realizado na FAPCOM, Faculdade Paulus de Tecnologia e Comunicação, Vila Mariana, São Paulo. Os presentes foram assessorados por dom José Maria Pires, bispo emérito de João Pessoa, PB. Com seus 95 anos de idade, possuidor de uma fé profunda, adepto de uma teologia libertadora e com uma fantástica coragem evangélica, dom Pelé, como ficou conhecido, tornou-se um símbolo da resistência, dentro e fora da Igreja. Como arcebispo, na época da ditadura militar, atuou de forma incansável pela defesa dos direitos humanos, motivando e fazendo com que a Igreja também se tornasse um meio para se chegar à transformação social.

A realização do Simpósio foi da Comissão dos Estudantes de Teologia de São Paulo (Cetesp), que congrega a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, a Faculdade São Bento, o Centro Universitário Salesiano de São Paulo, o Instituto São Paulo de Estudos Superiores (Itesp/Redentoristas) e as Faculdades Integradas Claretianas.
Dom Pelé começou sua fala afirmando que a Igreja é, antes de tudo, povo de Deus, humanidade inteira, ou seja, uma casa e escola de comunhão. Infelizmente, muitas vezes, esta plenitude de comunhão não existe. E isso, de certo modo, é pior do que a perseguição do islamismo, nazista ou comunista, uma vez que se trata de um ataque à própria Igreja que vem de seu interior, e não de fora - conforme afirmou o arcebispo François X. Nguyen.

Na atualidade, em que o esquecimento é comum, é bom fazer memória e sublinhar que a Igreja, segundo o Documento da Aparecida (2007), é discípula, missionária e agápica. Mas segundo dom José Maria, a Igreja Católica hoje está em agonia. Aliás, as igrejas hoje estão mais na cultura da imagem e menos no compromisso, na competição e não na cooperação. Muitas vezes é só cantar e dançar, sem compromisso com os pobres, ecologia, diálogo com governo e cultura atual.

Neste encontro com alunos e professores, dom Pelé comentou sobre política, eleição e leigos. "A política é difícil a gente analisar, ‘dirty game', mas a Igreja não pode ficar calada nem neutra perante às situações escandalosas como a corrupção, a questão da demarcação das terras indígenas, os gritos dos excluídos, o tráfico humano", acrescentou. A relação entre os padres e leigos deve ser de ajuda mútua. O padre não deve mandar, mas orientar.

Talvez os grandes desafios da humanidade hoje sejam a fome de Deus, de cultura e de pão. Os povos querem tocar Deus, querem a cultura do encontro e o pão que sacia toda a fome. E a Igreja, tanto como povo de Deus, tem muito a ver com isso. A Igreja mais voltada pelo povo, numa linha profética, precisa se atualizar sempre, uma renovação muito séria, que começa por dentro. A vivência da unidade, comunhão ou trabalho conjunto deve começar com bispos, padres e todos os agentes de pastoral.

Sem comunhão, não adianta sonhar com a Igreja em saída, como o papa Francisco fala. Mas, qual é o perfil dos bispos de hoje, que o papa Francisco está nomeando? Será que estão de acordo com o que ele pensa ou são mais controladores do que facilitadores? Hoje quantos bispos são proféticos na nossa geração? Será que os padres, missionários são os primeiros testemunhos da comunhão fraterna? Depois de Vaticano II, se ainda existem bispos da Igreja Católica, que moram em palácios com três pessoas para cuidar deles, talvez isto seja mais escandaloso.

"A Igreja não deve, em primeiro lugar, condenar a realidade humana, mas, antes, ser o lugar da misericórdia gratuita, onde todos possam se sentir acolhidos, amados, perdoados e animados", assim afirma o papa Francisco no seu livro, a Igreja da misericórdia: a minha visão para a Igreja. Portanto, cada comunidade é chamada a repensar urgentemente sua caminhada missionária a partir dos clamores do mundo de hoje; de nossos comodismos, de nossas estruturas clericais, de nossos métodos pouco libertadores e de nossas escravidões.

Quanto mais o mundo é secularizado, mas se torna necessário e importante o diálogo entre crentes e não crentes, porque a Igreja é um povo com muitos rostos. Sendo assim, a função da Igreja no interior da cidade secular deve ser queriguimática - revolução social, libertar os escravos, diaconal'- cura, reconciliação, medicação das feridas sociais, koinonial -apresentação em germe da verdadeira cidade humana e ‘exorcista' - libertação das idolatrias ou das heranças arcaicas que envenenam a vida social.

Fonte: Revista Missões

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