Simpósio Ecumenismo e Missão faz memória da Conferência do Nordeste e do Concílio Vaticano II

Jaime C. Patias

Resgatar a caminhada histórica do movimento ecumênico no Brasil tendo como pano de fundo a Conferência do Nordeste e o Concílio Vaticano II. Este foi o objetivo da primeira conferência realizada na manhã desta sexta, 22, durante o Simpósio Ecumenismo e Missão, que acontece em Vargem Grande Paulista (SP).

A Conferência do Nordeste foi realizada em 1962, um ano após a renúncia do presidente Jânio Quadros e da crise político-militar que culminou com o golpe de 1964 e do período ditatorial de 21 anos. O evento reuniu em Recife (PE), 167 pessoas de 14 denominações, da Igreja Episcopal Anglicana aos Pentecostais, representando todo o espectro do protestantismos brasileiro.

Ao fazer memória desse acontecimento, Dr. Zwinglio Motta Dias, pastor emérito da Igreja Presbiteriana Unida do Brasil e professor-convidado na UF de Juiz de Fora (MG), recordou que, a Conferência do Nordeste pode ser considerada como o primeiro evento organizado pelas instituições eclesiásticas protestantes para tratar das grandes questões sociopolíticas no período posterior à II Guerra Mundial. Segundo ele, o evento "representou um momento significativo nas disputas teológico-ideológicas que cindiam a realidade eclesiástica protestante no país. Ao mesmo tempo introduziu na cena política nacional os movimentos de juventude e de outros setores das igrejas evangélicas".

Na época, o protestantismo brasileiro estava perdendo um dos elementos da sua tradição representado pelo reformismo social que acompanhou os grandes movimentos ativistas do século XVIII e XIX. O protestantismo "recusou a história e o engajamento em vista à mudança social e política em favor de um discurso celestial, dualista e reservado à esfera do privado e do individual".

Por isso, segundo Dr. Zwinglio, a Conferência do Nordeste foi uma tentativa de romper com esta visão na medida em que procurou levar as igrejas a discutirem as questões vitais que envolviam a sociedade brasileira naquele momento para resgatar as verdadeiras forças do testemunho cristão.

"Ao tratar temas vitais que envolviam a sociedade brasileira, a Conferência ofereceu também uma nova leitura bíblico-teológica da realidade humana capaz de induzir e sustentar uma nova perspectiva de compreensão da natureza da missão da igreja no Brasil", destacou o pastor.

"Cristo e o processo revolucionário brasileiro", "a revolução do Reino de Deus", "os profetas em épocas de transformações políticas e sociais", "a missão total da igreja numa sociedade em crise" foram os temas tratados pela Conferência.

Começa um processo de renovação teológica e o que acontecia no Brasil repercutia em toda a América Latina e culminou na criação do movimento "Igreja e Sociedade na América Latina" (ISAL) que muito contribuiu para a cooperação e unidade entre as igrejas protestantes.

Para Dr. Zwinglio, de maneira geral a Conferência do Nordeste acabou por assumir as teses do governo Goulart pelas reformas de base (Agrária, Tributária, Bancária, Urbana, Política, Universitária), defendendo uma política externa independente. Ao mesmo tempo vivia-se um momento de grande criatividade em todos os campos. A palavra de ordem era ‘mudança'. "Assim o Encontro representou um esforço de deixar para trás as formas insípidas de uma religiosidade de um Protestantismo sem raízes na Reforma".

O professor avalia que esse movimento foi derrotado com muitos de seus personagens exilados outros presos, outros ainda foram traídos por muitos "que pensavam que eram seus irmãos em Cristo". Infelizmente "o recado dessa Conferência não foi ouvido. O conservadorismo tomou conta das estruturas eclesiásticas que mantiveram as velhas formas de ser igreja com apoio ao autoritarismo militar no poder".

Por outro lado, Zwinglio argumenta que as ‘minorias abraâmicas', conforme dizia dom Helder Câmara, "encontraram novos caminhos para expressarem sua fidelidade ao projeto de vida anunciado por Jesus de Nazaré". Com isso, "o movimento ecumênico ganhou força e ultrapassou as fronteiras das instituições eclesiásticas. Essas minorias ajudaram a resgatar o essencial dos valores evangélicos".

Houve entre as décadas de 60 e 80 um movimento catalisador de unidade do movimento ecumênico no Brasil. Essa confluência veio na esteira da Teologia da Libertação. Na década de 90 esse movimento enfraqueceu e se fragmentou em diversas teologias e segmentos conduzidos por líderes carismáticos em especial no neopentecostalismo.

Promovido pelo Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC), em parceria com a PUC-PR e as comissões de Ecumenismo, Laicato e Missão da CNBB, o Simpósio Ecumenismo e Missão reúne cerca de 100 pessoas entre leigos(as), consagradas e ordenadas nas diversas Igrejas cristãs, estudantes de teologia e convidados. A programação se estende até o domingo, 24.

Fonte: Revista Missões

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