O Golpe Militar de 1964 e a Igreja Católica: entre apoio e resistência

Stephen Gichohi Ngari

"Somente as viúvas farsistas disformadas têm saudade da ditadura". É uma grande farsa dizer que o Golpe Militar de 1964 aconteceu para impedir a introdução do regime comunista no país. É outra farsa dizer que a Igreja apoiou o golpe e não resistiu à ditadura. Com estas colocações, o bispo emérito de Blumenau, SC, dom Angélico Sândalo Bernardino, iniciou a sua colocação no debate sobre o Golpe e a Igreja Católica: entre apoio e resistência.

O debate convocado pelo fórum de participação da V Conferência de Aparecida se realizou no Auditório das Irmãs Paulinas, Rua Domingos de Morais, São Paulo, SP, dia 14 de maio, a partir das 19h. Junto com dom Angélico estavam presentes o professor universitário e pesquisador José Cardonha, José Oscar Beozzo, historiador e coordenador de CESEEP (Centro Ecumênico de Serviço à Evangelização e Educação Popular) e Arivaldo Padilha, metodista, vítima da ditadura.

Na apresentação dos debatedores houve unanimidade em negar a concepção errada que a Igreja apoiou a ditadura. Todos concordaram com dom Bernardino que o Golpe aconteceu para impedir a entrada do comunismo no país. É uma farsa também para os golpistas dizer que o governo do então presidente foi fraco e impopular. Na época, o presidente Goulart contava com uma popularidade de mais que 70% (divulgada na época).

A burguesia capitalista com o apoio da CIA denegriu as reformas populares do presidente como introdução ao comunismo. A mídia e alguns setores da Igreja espalharam este medo. Assim os militares usaram isso como desculpa para derrubar o presidente. Para a maioria, a ditadura era uma nuvem passageira.

Segundo o historiador Beozzo, duas razões impediram o pronunciamento oficial da Igreja durante o golpe até 2 de junho. O presidente da CNBB tinha renunciado ao cargo e não tinha sido eleito o sucessor. Ao mesmo tempo, o episcopado encontrava-se dividido. Alguns bispos apoiavam o Golpe e outros eram contra.
Quando a Igreja se pronunciou em nota oficial de 2 de junho de 1964, ainda manifestava-se a divisão. Enquanto a primeira parte agradecia a Deus pelo momento que salvou a Igreja, a segunda parte denunciava as torturas e violações de direitos humanos sendo praticado pelos militares. A unidade da CNBB contra o regime só aconteceu no ano de 1977.

A parte mais chocante do regime militar foi evidenciada pelos documentos mostrados aos participantes pelo professor José Cardonha. Todos os bispos e muitos padres, religiosos e religiosas tinham sido fichados e perseguidos, especialmente, durantes celebrações e reuniões. O regime tinha toda informação do antes, do durante e do depois das reuniões dos religiosos. Através dos seus infiltrados tiravam fotos dos bispos nas reuniões e roubavam documentos das suas pastas. Nada vindo deles surpreendia o regime militar.

O senhor Padilha, que sofreu nas mãos dos militares, afirmou que a tortura não era acidente ou um caso isolado. Ela foi um instrumento sistemático de interrogatório para disseminar terror na população. O professor Cardonha mostrou como os torturadores camuflavam práticas de tortura usando uma linguagem litúrgica. Uma sessão de tortura chamava-se de missa revolucionária. Receber comunhão no cálice e/ou com a hóstia ‘sagrada' eram torturas com instrumentos variados. A procissão significava fazer os detidos andar nus enquanto eram flagelados.

Fonte: Revista Missões

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