O elitismo incurável de FHC

Roberto Malvezzi (Gogó) *

Fernando Henrique já disse que o PT cresceu nos grotões por falta de informação do povo (UOL, 06/10/2014). Com isso referia-se certamente em grande parte ao Nordeste brasileiro, principalmente o Semiárido.

Eu tinha jurado a mim mesmo que não daria uma única palavra sobre eleições nesse segundo turno, mas uma afirmação como essa é muito mais que um palpite eleitoral. É na verdade a hedionda visão sudestina sobre o Nordeste.

A arrogância é sempre má conselheira. Seria bom que todos nos perguntássemos qual a "agulha" que ele como presidente investiu na região. Em seu tempo foi realizado um dos melhores estudos sobre o Semiárido, ainda que numa lógica tecnicista, chamado de ARIDAS. Entretanto, quedou-se nas gavetas ou nos discos rígidos dos computadores. Ainda por cima tivemos o apagão energético da CHESF, quando quase todo sistema faliu por absoluto descuido com o São Francisco e outras demandas energéticas.

Além do mais, o Semiárido mudou para melhor. Talvez aqui esteja a verdadeira razão do crescimento do PT, embora discordemos de tantas obras faraônicas e para atendimento do capital. Na verdade não foi só o Bolsa Família, ou o aumento do salário mínimo - que no tempo dele valia 60 dólares em contraste com os 300 dólares atuais -, mas também a expansão do abastecimento de água, além de todo apoio dos governos petistas à lógica da convivência com o Semiárido. Assim multiplicaram-se as cisternas para beber, para produzir, a agricultura ecológica, a criação de animais adaptados, numa lista quase infinda de iniciativas da sociedade civil que teve apoio governamental. Mesmo que não publique - por causa de nossas críticas à transposição do São Francisco - o governo tem expandido também as adutoras para muitas cidades do Semiárido. Os desgostos com o PT são muitos e graves, mas não há como negar que houve preocupação com a região.

Ainda mais, nunca a região esteve tão bem informada como nos últimos anos. Expandiu-se a energia elétrica - no tempo dele ainda líamos à luz de vela e lampião na esmagadora maioria das comunidades rurais - e com ela o uso de eletrodomésticos, a internet e os celulares.

Num debate sobre a implantação de uma usina nuclear em Itacuruba, Pernambuco - outro desgosto do governo Dilma encampado por Eduardo Campos - a juventude presente num debate citava os acontecimentos de Fukushima e convocava uma manifestação contrária à obra por torpedos e WhatsApp.

Esses dias, num momento de formação com a juventude do meio rural de Casa Nova e Remanso, Bahia, chamava a atenção que todos sabiam ler e escrever, todos tinham celulares, se comunicavam através das redes sociais, elaboraram um site para registrar seus avanços. Mesmo morando no meio rural, pelo menos a metade tinha acesso diário à internet.

Há poucos tempos atrás seus pais nem sequer sabiam ler. Todas nossas reuniões de formação eram feitas por técnicas de oralidade, como cordéis e músicas facilmente aprendíveis. Eles já tinham sim uma leitura de mundo, mas não tinham a leitura da palavra.

Sim, nessa última grande estiagem, não houve mortalidade humana, nem mesmo a infantil.

Então, o mundo daqui anda bem informado ultimamente. O povo do Semiárido tem razões objetivas para fazer suas escolhas. Parece que o único desinformado é o próprio FHC.

Aliás, depois de uma afirmação como essa, como Aécio ainda poderá pedir os votos dos nordestinos?

* Roberto Malvezzi (Gogó) é Agente da Comissão Pastoral da Terra, Juazeiro, Bahia.

Fonte: Revista Missões

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