O pêndulo da vida e da fé

Alfredo J. Gonçalves

Toda fé ou crença oscila dentro de um espectro em forma de semicírculo, que vai do extremo da confinça ao outro extremo da dúvida. Duas características, porém, possuem o pêndulo: jamais se detêm num dos extremos, por um lado, e , por outro, tampouco se detêm no meio de sua linha curva, que seria seu ponto de equlíbrio. Pelo contrário, perigosa e paradoxalmente busca sempre o limite do espectro, quase chegando a romper a trajetória do arco e, ao mesmo tempo, evita descansar no ponto central, como que fugindo da inércia.

Movimento idêntico verifica-se na existência humana. Nossa travessia pela face da terra costuma ser intrinsecamente irrequieta. De forma continua e não raro contraditória, nos aventuramos na descoberta das zonas fronteiriças e, simultaneamente, tendemos a fugir da quietude, com o receio consciente ou inconsciente de que ela se transforme em tédio. Explica-se, assim, o "cor inquietum" de que fala Santo Agostinho em suas Confissões. Não é difícil concluir com o poeta e escritor brasileiro Guimarães Rosa que, de fato, "viver é perigoso".
Mas há algo mais perturbador. Se é verdade que pulamos de aventura em aventura, com o risco de ultrapassar os limites e oscilar à beira do abismo, também é certo que, no fundo, a alma humana tem sede de repouso.

Anseia pela paz e pelo sossego, ainda que seja em fracção de segundos, um raio fugaz, mas nem por isso menos intenso e imperioso. E aqui, com relativa frequência, ocorre um curtocircuito: não obstante desejar ardentemente o repouso e a paz, a alma teme o encontro consigo mesma, fugindo à verdade do espelho e refugiando-se numa região obscura e selvagem que, de forma imprecisa, tudo oculta em nebulosidade indistinta e indefinida.

Igual movimento pendular pode ser verificado nas intuições, sentimentos e emoções. De maneira particular em momentos de sofrimento e fragilidade, oscilamos frequentemente entre a alegria e a tristeza. Mais ainda, entre uma euforia repentina e inexplicável e uma repentina e inexplicável depressão. Num momento olhamos através da janela e contemplamos um céu azul, límpido, transparente e embriagado de luminosidade; instantes depois, a mesma janela descortina para nós nuvens escuras e sombrias, prestes a desencadear a tempestade. Não foi o horizonte que mudou, e sim o olhar de quem está à janela.

Em determinados dias, o camponês ou o operário saem para o trabalho assobiando e cantarolando; outras vezes, vão praguejando e maldizendo a vida. Por vezes somos surpreendidos pelo sol inclemente, outras, pela chuva inesperada. Há momentos em que temos vontade de gritar um "bom dia" a todos os transeuntes, conhecidos ou não; logo depois, procuramos evitamar e xingar qualquer pessoa que cruze o caminho. Luzes e sombras, canto e pranto, dor e esperança, risos e lágrimas - eis os opostos que, ao mesmo tempo, se atraem e se mesclam, se confundem e se alternam. Às vezes choramos de tanto rir; em seguida, rimos de tanto chorar.

Dúvidas, interrogações e inquietudes constituem o terreno de onde a fé extrai os nutrientes para se manter viva e ativa. Por mais que seja sustentada por qualquer crença, não existe vida humana que não seja acompanhada por mil perguntas. O segredo está em dar-se conta que noventa e nove por cento delas não têm resposta. O que significa que já estão solucionadas!

Alfredo J. Gonçalves. MC, é Conselheiro e Vigário Geral dos Missionários Carlistas.

Fonte: Revista Missões

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