Pedro e Paulo, propagadores da fé

Ronaldo Lobo *

Junho é o mês das festas populares, entrelaçadas de fé e de religiosidade, repletas de alegria. Neste mês celebramos Santo Antônio, São João Batista e São Pedro e São Paulo. Nossa reflexão será focada nos últimos dois, no seu testemunho de fé na obra da evangelização da Igreja primitiva.

São Pedro e São Paulo, pelo seu desempenho são considerados colunas da Igreja. Os dois são tão distintos, mas, juntos representam o rosto da mesma Igreja. Embora sejam lembrados numa só festa, é impossível colocar estas duas personalidades juntas, tamanhas são as suas diferenças.

Pedro representava a Igreja de Jerusalém, ou seja, o judeu-cristianismo petrino, uma Igreja que acreditava na conversão dos judeus a Jesus. Mais tarde, o próprio Pedro se distanciaria do rigorismo desta Igreja, indo na direção de Antioquia, e depois a Roma.

Paulo, fundador da Igreja gentio-cristã acreditava que a Boa Nova de Jesus devia ser levada também para os gentios, ou seja, para os pagãos. Não é fácil juntar as informações autobiográficas sobre a sua vida, porque, nas suas cartas ele não demonstra interesse em escrever sobre si mesmo. Pelo contrário, o grande missionário preocupa-se na tarefa de orientar a fé e a conduta das suas comunidades. Vendo o seu desempenho, o carisma e o zelo, muitos estudiosos têm considerado Paulo como o verdadeiro fundador do cristianismo.

Tradição
A veneração aos dois vem desde o início da Igreja. Entre os rabiscos encontrados nas paredes das catacumbas, por volta do ano 80, aparecem pedidos de intercessão a São Pedro e São Paulo, ou agradecimentos por graças recebidas. Estes pedidos espontâneos são escritos em latim e grego. Segundo a tradição, os dois foram mortos durante a perseguição aos cristãos pelo imperador Nero nos anos 64 a 67 d.C. Pedro foi crucificado nas colinas do Vaticano e Paulo foi decapitado perto das Águas Sálvias, fora dos muros da cidade, junto a outros condenados.

Contexto
Para a reflexão, escolhemos a leitura do Evangelho de Mateus (Mt 16,13-19). Provavelmente este Evangelho foi escrito na Síria aos judeus-cristãos e gentio-cristãos entre os anos de 75 e 85 d.C. No Evangelho de Mateus, Jesus é comparado a Moisés, que deu a lei aos judeus e escreveu os cinco primeiros livros, chamados de Pentateuco. A preferência por Simão Pedro como porta-voz do grupo dos apóstolos aparece em muitas passagens do Evangelho. Provavelmente ele adquire tal papel depois da ressurreição, ou pelo respeito que gozava sendo o primeiro a ser chamado pelo Senhor. Mais ainda, ele pertence a um grupo seleto de amigos de Jesus, junto com Tiago e João.

Leitura
Na leitura da festa (Mt 16, 13-19) a cena se situa em Cesareia de Filipe, uns 32 km ao norte do mar da Galileia. Nesta região antigamente existia o santuário do deus Pã, deus dos rebanhos e pastores. A coincidência do lugar e o papel que Pedro iria assumir com certeza não são uma mera simulação. Toda a cena quer reafirmar o assunto central do terceiro bloco narrativo do Evangelho de Mateus (Mt 11-16). Isto é, será que os discípulos foram capazes de discernir a partir da pregação de Jesus que ele é o Cristo, o ungido de Deus? Entre os discípulos, Simão responde a pergunta dizendo que Jesus é o Messias. Como consequência disso, ele recebe um segundo nome: Tu és Pedro, e o papel a ser exercido ao longo da vida: sobre esta pedra construirei a minha Igreja.

Logo, na próxima perícope, quando Jesus fala sobre a sua Paixão e Morte, o mesmo Simão preocupado com Jesus diz: Deus não permita tal coisa, Senhor! O discípulo predileto torna-se aliado do opositor (Mt 16, 21-23), alguém que quer impedir Jesus de cumprir a sua missão de salvar a humanidade. Pedro se transforma na pedra de tropeço do Senhor. O trocadilho de pedra para pedra de tropeço pode nos ensinar muita coisa.

Quem é Jesus? É verdade que o povo judeu esperava pelo Messias, mas um Messias glorioso, da linha do rei Davi. As escrituras apontavam também para um Messias servo sofredor, e para o povo sofrido da Judeia, tal Messias não fazia o menor sentido! Mas, imaginar que Jesus seria um Messias plenamente humano, a ponto de enfrentar a morte, como o servo sofredor, não passa pela mente de Pedro nem dos outros discípulos. Jesus faz questão de falar abertamente tal realidade, e os seus apóstolos passam por esta dolorosa realidade quando o fato acontece. Pedro se torna o fiel seguidor e um líder carismático desta Igreja primitiva.

Paulo, por outro lado, encanta seus leitores por seu zelo missionário, já que passou sua infância e juventude em Tarso, no meio da cultura helenística onde fez estudos em retórica (2Cor 10, 10). Ele estudou a Torá como discípulo de Gamaliel, era cidadão romano e versado em grego. Foi o primeiro a perseguir os cristãos (At 8, 59). No caminho de Damasco ocorre a sua conversão. O próprio Paulo falaria desta experiência, considerado o último entre os apóstolos (Gl 1, 12-15).

Na Igreja de Jerusalém, Paulo não tem muita aceitação. Mas Barnabé consegue resgatá-lo, e dar-lhe uma nova oportunidade em Antioquia. Depois ele evangeliza as comunidades do Mediterrâneo, na Ásia Menor e na Grécia, tornando-se um missionário exemplar. Visita e revisita as suas comunidades com grande zelo: "a minha preocupação cotidiana, a atenção que tenho por todas as Igrejas" (2Cor 11, 28). O seu jeito de cativar as pessoas, cultivar a amizade, citar seus nomes nas cartas é impressionante. Por outro lado, na Carta aos Gálatas, Paulo relata o seu confronto com Pedro e com certeza foi o único a enfrentá-lo com tamanha coragem. Para ele, é preciso ter coragem para aderir à fé da Igreja, mesmo se essa contradiz o esquema do mundo contemporâneo. O ponto mais forte de todo seu trabalho seria a sua capacidade de transmitir uma religião semítica num ambiente grego, cultura helenística e pensamento filosófico.

Na sua Carta Apostólica Porta Fidei, o papa Bento XVI declarou o Ano da Fé, com início em 11 de outubro de 2012, no 50º aniversário de abertura do Concílio Vaticano II, com término em 24 de novembro de 2013, Solenidade de Cristo Rei do Universo. "Será um momento de graça e de empenho para uma sempre mais plena conversão a Deus, para reforçar a nossa fé n'Ele e para anunciá-Lo com alegria ao homem do nosso tempo", explicou o papa. Tudo para combater a crise de fé que o mundo contemporâneo enfrenta. Com certeza, estes dois grandes santos, Pedro e Paulo são exemplos a serem seguidos pela fé que guardaram e professaram.

* Ronaldo Lobo, svd, é mestre em Bíblia. Atualmente, formador no Seminário Verbo Divino em Toledo, PR. Publicado na revista Missões, N. 06 - jul-ago. 2012.

Fonte: www.revistamissoes.org.br

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