Ameaça à vida e aos direitos das comunidades tradicionais pesqueiras

Lideranças participantes do estudo/encontro sobre aquicultura

E DA BIODIVERSIDADE MARINHA E CONTINENTAL
Nós participantes do estudo/encontro sobre aquicultura realizado nos dias 12 e 13 de março de 2012 em Olinda PE, após uma profunda reflexão sobre os impactos socioambientais desta atividade nos territórios tradicionais de pesca artesanal no Brasil e no Chile vimos manifestar nossa solidariedade à luta dos povos e comunidades pesqueiras. Povos que resistem ao modelo de aquicultura industrial e intensiva, que ameaça a biodiversidade do planeta, a soberania alimentar e o patrimônio cultural material e imaterial destas comunidades tradicionais.

Nestes dias escutamos atentamente as experiências e os clamores dos pescadores brasileiros e chilenos que estão sendo expulsos violentamente dos seus territórios com a implantação da aquicultura industrial e intensiva, a exemplo da carcinicultura no Brasil e salmonicultura no Chile. Estas atividades têm promovido nos últimos anos uma destruição verdadeira dos estoques pesqueiros (reservas marinhas) e uma extensiva privatização dos manguezais e das águas (bem como dos espaços de moradia dos pescadores e pescadoras), inviabilizando a soberania alimentar e o processo de reprodução física e cultural das comunidades pesqueiras artesanais.

No Brasil estamos acompanhando com bastante preocupação uma série de iniciativas (investimento público) do Governo através do Ministério da Pesca para alavancar o desenvolvimento da aquicultura. Percebemos que o governo brasileiro, a exemplo da experiência chilena, tem sido bastante subserviente na criação de leis que visam facilitar da implantação de parques aquícolas, tanto no litoral quanto nas águas continentais, sem a participação da sociedade. Inclusive passando por cima de acordos internacionais do qual é signatário como a convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho - OIT, garantindo que discussões sobre mudanças em legislações que impactem nas comunidades tradicionais devem preceder de uma consulta a estes povos e comunidades.

Aprendemos com a experiência do Chile que o modelo de aquicultura industrial e intensiva baseada no monocultivo do salmão para exportação representa uma grave ameaça não somente a existência das comunidades pesqueiras, mas também compromete a saúde pública de um modo geral. Uma vez que esta produção requer a utilização intensa de produtos químicos (antibióticos, pesticidas, antifólios) bem como o uso de pigmentos artificiais para a coloração da carne do salmão tão cobiçada na Europa, Japão e Estados Unidos. Aprendemos que se trata de um modelo defendido e financiado por grandes corporações internacionais sobre a legitimação e subsídios de Estados e Governos que se dizem democráticos, mas no entanto submetem todo seu patrimônio ambiental e cultural aos interesses do capital internacional. Em verdade a experiência do Chile denuncia a face neoliberal dos Estados latino-americanos que entregam seus recursos naturais às corporações multinacionais responsáveis pela neocolonização do continente subjugando e violentando os direitos dos povos e comunidades tradicionais.

DIANTE DESSE CONTEXTO DE EXPROPRIAÇÃO DOS TERRITÓRIOS E DOS RECURSOS PESQUEIROS NA AMÉRICA LATINA, REPUDIAMOS:

O modelo de desenvolvimento baseado no lucro a qualquer custo e na produção de bens para exportação ás custas de nossos ricos ecossistemas. É um modelo destrutivo: degrada o meio ambiente, polui as águas e o solo, contamina lençóis freáticos. É responsável pela expulsão das comunidades tradicionais de seus territórios;

Esse modelo que impede a reprodução física e cultural das comunidades, que ameaça a soberania alimentar de milhares de comunidades que tem na pesca sua principal fonte de renda e de alimentação, comprometendo assim a reprodução dos estoques pesqueiros, limitando e restringindo o acesso aos recursos pesqueiros;

A falta de controle sanitário sobre a atividade, caracterizada pelo uso abusivo / intensivo de antibióticos, pesticida, antifólio (altamente poluidoras / tóxicas) e a utilização de pigmentos, por exemplo, na produção do salmão, que coloca em risco a saúde das pessoas, que não têm acesso as informações sobre os produtos que consomem. Os megaprojetos de aquicultura, que são sistemas de monocultivos (industriais e intensivos) realizados a partir de espécies exóticas que requerem alto volumes de capitais financeiros, alto consumo de energia, grandes pacotes tecnológicos e químicos associados à produção, além de processos de modificação genética para garantir eficácia produtiva;

As alterações feitas na legislação ambiental nos níveis, locais, nacionais e internacionais que facilitam a expansão desses projetos, diminuindo a proteção e permitindo o avanço sobre os espaços marinhos e costeiros e de suas áreas de influência.

DEFENDEMOS E EXIGIMOS:
A permanência dos povos e comunidades tradicionais pesqueiras em seus territórios como forma de preservação e reprodução da rica diversidade cultural, ambiental e social;

O comprimento dos acordos internacionais (169 OIT) assegurando o acesso dos povos e comunidades tradicionais aos recursos naturais, a permanência nos seus territórios, o respeito e a garantia do seu modo de ser e fazer, de participar das discussões sobre as alterações de normas que incidam sobre suas vidas e de poder discutir profundamente sobre implantação de projetos que impactem negativamente seus territórios;

O respeito à legislação das Nações Unidas que trata dos direitos dos povos indígenas (resolução 61/295 de 2007) - que assegura os direitos coletivos dos povos indígenas e das comunidades das áreas costeiras;

A responder da solicitação da Organização Mundial da Saúde que não permite o uso massivo de antibióticos na mega produção de aqüicultura;

O apoio à convocação que garanta que os povos e organizações populares participem da construção de diretrizes para assegurar a pesca sustentável de pequena escala que está sendo discutida na comissão de pesca das Nações Unidas (este documento reconhece a importância da pesca artesanal enquanto segurança alimentar, lutar contra a pobreza, bem estar social e manejo sustentável dos recursos pesqueiros);

Por fim, achamos importante fortalecer o vínculo entre as comunidades pesqueiras que lutam em defesa da pesca artesanal na America Latina: que se promova um intercambio entre as comunidades tradicionais deste continente, a fim de enfrentar o modelo de aquicultura industrial para exportação que vem sendo imposto pelas grandes corporações internacionais e os governos nacionais comprometidos com este sistema.

Fonte: Comunidades tradicionais pesqueiras

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