O Dia da Celebração da Laudato Si é 24 de maio, mas desde 2016 essas celebrações passaram a abranger uma semana toda, a chamada SEMANA LAUDATO SI.
Por Juacy da Silva
Por pior e extremamente caótica que seja a realidade, sempre existe um “fio” de esperança para que mudanças ocorram e novos rumos, novas saídas sejam vislumbradas, desde que novos paradigmas sejam construídos em substituição aos paradigmas que alimentam a má política e a economia da morte, que geram pobreza, violência, fome, exclusão e, também, degradação e destruição ambiental.
“Esta irmã clama contra o mal que lhe provocamos por causa do uso irresponsável e do abuso dos bens que Deus nela colocou. Crescemos pensando que éramos (somos) proprietários e dominadores, autorizados a saqueá-la. A violência está no coração humano ferido pelo pecado, vislumbra-se nos sintomas de doença que notamos no solo, na água, no ar e nos serres vivos”. Papa Francisco, Encíclica Laudato Si, 2 (2015).
“Devemos considerar, também, a poluição produzida, incluindo os perigosos presentes em variados ambientes. Produzem-se anualmente centenas de milhões de toneladas de resíduos, muitos deles não biodegradáveis: resíduos domésticos e comerciais, detritos de demolições, resíduos clínicos, eletrônicos e industriais, resíduos altamente tóxicos e radioativos. A terra, nossa Casa (Comum), parece transformar-se cada vez mais num imenso depósito de lixo”. Laudato Si, 21 (2015).
Dentro de poucos dias estaremos comemorando NOVE anos da publicação de uma das mais emblemáticas e “revolucionárias” Encíclicas que um Papa já publicou ao longo de séculos. Nesta Encíclica, o mesmo consegue unificar o pensamento da Igreja sobre as questões e os desafios socioambientais e qual o papel que os Cristãos (Católicos e Evangélicos) e também os adeptos de todas as demais religiões devem desempenhar no enfrentamento desses desafios, inserindo-a no contexto também da Doutrina Social da Igreja.
O Dia da Celebração da Laudato Si é 24 de maio, mas desde 2016 essas celebrações passaram a abranger uma semana toda, a chamada SEMANA LAUDATO SI, possibilitando refletirmos sobre diversos temas que fazem parte dos debates e da realidade socioambiental, inclusive o maior desafio que é a CRISE CLIMÁTICA e o cumprimento do Acordo de Paris, principalmente no que concerne às ações que todos os países há nove anos firmaram visando evitar que a temperatura média do planeta exceda 1,5º Graus centígrados ou no máximo 2º acima do que era a temperatura média da terra no período pré-industrial.
A crise climática decorre de diversos fatores, todos ligados à ganância humana que não respeita os limites da natureza e nem o direito que as próximas gerações tem em viver em condições que garantam todas as formas de vida, inclusive a vida humana, ameaçadas pelo intenso processo de degradação ambiental, destruição da biodiversidade, poluição do ar, a transformação de todos os cursos d’água, inclusive os mares e oceanos em uma verdadeira lixeira planetária, a destruição de todas as florestas e tantos outros males que a busca incessante e irracional por lucros imediatos colocam em risco o futuro do planeta.
Assim, entre 19 e 26 de maio corrente estaremos “celebrando” a SEMANA LAUDATO SI, 2024, cujo lema é “Sementes de Esperança”, como certeza de que, apesar da irracionalidade humana que fundamenta modelos econômicos predatórios da natureza e também a exploração dos trabalhadores, ainda nos resta uma “réstea” de esperança de que podemos despertar a população e também governantes e o setor empresarial de que podemos alterar esta trajetória de uma corrida rumo a um precipício.
É importante que em nossas reflexões sobre os desafios socioambientais tenhamos presentes alguns aspectos que embasam a Encíclica Laudato Si, incluindo, a ideia e o conceito de Ecologia Integral, e neste processo de integralidade precisamos considerar o ser humano como parte da natureza e que “tudo está interligado”, ou seja, o Planeta Terra, que na Encíclica também é denominado de “Casa Comum”, e “obras da criação”.
Diante disso, espera-se que a humanidade, cada um de nós, independente do gênero, classe social, cor da pele, religião, ocupação e nível socioeconômico ou classe social, somos responsáveis tanto pelo que fazemos e que está destruindo esta Casa Comum, quanto pelas ações e, principalmente estilo de vida, que possam representar uma “luz no fim do túnel”, ou seja, nós também temos capacidade de restaurar e recuperar os danos que temos feito contra a mãe terra.
É significativo quando Francisco escreve na Laudato Si, por exemplo, “O meio ambiente é um bem coletivo, patrimônio de toda a humanidade e responsabilidade de todos. Quem possui uma parte é apenas para administrá-la em benefício de todos”, esta exortação vem ao encontro do que há década o então Papa João Paulo II (São João Paulo II) afirmou que “sobre toda propriedade privada pesa uma hipoteca social”.
Outro aspecto também enfatizado na Laudato Si é a de que na origem de todo o processo de degradação e destruição da natureza estão as ações humanas e que este processo afeta de uma forma mais direta os pobres e isto fica claro quando Francisco diz que “o gemido da terra é também o gemido dos pobres”.
Voltando a SEMANA LAUDATO SI 2024, os temas a serem utilizados para as reflexões durante os oito dias (de 19 a 26 de maio), são aspectos e problemas bem concretos e que tantos males tem feito tanto à natureza quanto às pessoas, principalmente as grandes massas excluídas, empobrecidas e violentadas ao redor do mundo, inclusive em nosso país.
No primeiro dia, 19 de maio, que também é o DIA DE PENTECOSTES, o tema objeto de reflexão será CONVERSÃO ECOLÓGICA, no contexto da Espiritualidade ecológica e libertadora; no segundo dia, 20 de maio o tema será TRANSPORTE SUSTENTÁVEL, uma reflexão sobre os impactos que os atuais sistemas de transporte, baseados fundamentalmente em combustíveis fósseis contribuem para o aumento da emissão de gases de efeito estufa, o aquecimento global e as terríveis mudanças climáticas.
No terceiro dia, 21 de maio, o tema será ALIMENTAÇÃO E SUSTENTABILIDADE, envolvendo a questão da fome, da insegurança alimentar, o uso abusivo dos agrotóxicos, a degradação dos solos, apontando como saída a agroecologia e a produção de alimentos orgânicos.
No quarto dia, 22 de maio, o tema para reflexão será ENERGIA SUSTENTÁVEL, destacando os malefícios para o meio ambiente e para a saúde humana que os combustíveis fósseis produzem e enfatizando a necessidade da eliminação dessas fontes sujas de energia, substituindo-as por fontes renováveis de energia como solar, eólica, biomassa, hidrogênio verde. Também faz parte desta reflexão a substituição de veículos movidos a combustíveis fósseis por veículos elétricos, que sejam também alimentados por fontes renováveis de energia, isto inclui também uma reflexão sobre eficiência energética e combate ao desperdício nesta área.
No quinto dia, 23 de maio, a reflexão deve girar sobre a questão do lixo, resíduos sólidos, principalmente os desafios do lixo eletrônico e o lixo plástico, altamente poluentes para o solo, as águas e o ar, como alternativas devemos repensar nossos sistemas produtivos e de consumo, incluindo o consumismo, o desperdício, o descarte e a obsolescência prematura de bens produzidos pelos sistemas econômicos.
No Sexto dia, 24 de maio, a reflexão será sobre a questão da água, tanto em termos de qualidade quanto de quantidade, tendo em vista que diversas regiões do planeta, inclusive em nosso país, passam ou enfrentam o desafio da escassez da água, tanto para consumo humano, quanto para as atividades econômicas, incluindo a produção agropecuária. Fazem parte também dessas reflexões a questão da degradação de todas as fontes, nascentes, córregos, rios e também os mares e oceanos. Lembrando sempre que sem água de qualidade e em quantidade não há vida.
No Sétimo dia a reflexão deverá girar sobre Catequese (iniciação a vida cristã ou processo semelhante em outras religiões) e Ecologia Integral. O que se propõe é refletir mais profundamente sobre como podemos incluir noções de ecologia integral junto às crianças, adolescentes e jovens, para que despertem a consciência de que “quando os seres humanos comprometem a integridade da terra e contribuem para a mudança climática, desnudando-as das suas florestas naturais ou destruindo as suas zonas úmidas, quando os seres humanos contaminam as águas, o solo, o ar... tudo isso é pecado. Por que, um crime contra a natureza é um crime contra nós (todos) mesmos e um pecado contra Deus”. Para as Leis dos homens a destruição e degradação ambiental é um crime, mas para a Igreja é um PECADO ECOLÓGICO, que exige uma CONVERSÃO ECOLÓGICA.
Finalmente, no oitavo e último dia da SEMANA LAUDATO SI de 2024, a reflexão deverá girar em torno a urgente necessidade de UM MELHOR CUIDADO COM A CASA COMUM, antes que este processo de destruição e degradação ambiental atinja o chamado “ponto do não retorno”, ou seja, a possibilidade de restauração ou até mesmo de mitigação tornam-se altamente onerosos ou tecnicamente impossíveis.
Oxalá a SEMANA LAUDATO SI, possa ser objeto de muitas reflexões por parte de todas as Igrejas Cristãs e também das demais religiões ao redor do Mundo, mas, principalmente, em nosso país, como um passo importante para o que deverá acontecer em 2025.
Se 2015 foi um ano de muito significativo para o despertar de uma consciência da importância de colocarmos as questões das preocupações socioambientais na ordem dia dia, ou das agendas públicas e privadas em todos os países, tendo como base a Laudato Si; o estabelecimento dos OBJETIVOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL pela ONU e o ACORDO DE PARIS; 2025 será também um marco significativo para o Brasil, quando a CNBB terá a Campanha da Fraternidade abordando o tema “Fraternidade e Ecologia Integral”, no contexto das Comemorações dos 10 anos da Laudato Si; em Belém será realizada a COP 30, quando o Brasil estará sob os holofotes internacionais e no âmbito municipal teremos o início de novas gestões, quando prefeitos e vereadores estarão iniciando seus mandatos, esperando que as questões ambientais passem a fazer parte dos planos de governos e de políticas públicas.
Finalizando, transcrevo um trecho da mensagem do Papa Francisco aos participantes da COP 28, na Exortação Apostólica Laudate Deum, quando afirma “Não há mudanças duradouras sem mudanças culturais, sem maturação do modo de viver e das convicções da sociedade; não há mudanças culturais sem mudanças nas pessoas... O simples fato de mudar os hábitos pessoais, familiares e comunitários alimenta a preocupação com as responsabilidades não cumpridas (pelos governantes), pelos setores públicos e a indignação contra o desinteresse dos poderosos”.