Desesperança em relação às conferências do clima da ONU

A indústria dos combustíveis fósseis venceu mais uma vez, tendo à frente a indústria petrolífera. Nada ficou estabelecido em relação a um cronograma de redução dos gases que causam as emissões do efeito estufa.

Por Heitor Scalambrini Costa

Um fiasco total. Assim se poderia definir a 27ª Conferência do Clima, organizada pelas Nações Unidas, realizada no Egito, e que termina neste final de semana. Uma das prioridades desta Conferência seria a necessidade de agir e transformar as promessas e anúncios feitos nas conferências anteriores, em resultados e ações concretas. Com essa intenção o lema adotado foi “Juntos para a implementação”.

desmatamento-semi-aridoMuitos estavam céticos de que esta reunião, com a participação dos mandatários de 196 países, pudesse chegar a resultados promissores na direção de conter as emissões de gases de efeito estufa (GEE’s), produzida pelo tipo de energético que consumimos e pelas diversas atividades humanas realizadas. Principalmente pelo uso crescente dos combustíveis fósseis, o petróleo como centro do maior problema atual da humanidade.

Infelizmente os céticos tiveram razão. A indústria dos combustíveis fósseis venceu mais uma vez, tendo à frente a indústria petrolífera. Nada ficou estabelecido em relação a um cronograma de redução da produção/consumo destes energéticos que contribuem com mais de 75% de todas as emissões de GEE’s.

O documento final, ora em discussão, deixou de fora o ponto essencial para diminuir a crescente emissão de CO2, e assim evitar um aumento da temperatura acordada no Acordo de Paris. A urgentíssima necessidade de reduzir a participação dos combustíveis fósseis na matriz energética mundial, ficou de fora, apesar da ciência reconhecer os prejuízos causados por estes energéticos, e elegê-los como o grande vilão do aquecimento global.

Como amplamente anunciado pela imprensa nacional e mundial, os “lobistas do petróleo” compareceram massivamente nesta conferência, batendo os recordes das reuniões anteriores. Foram mais de 600 pessoas “infiltradas” nas diversas delegações que impediram avanços na definição de um cronograma, mais que urgente, para a redução da produção/consumo do petróleo, gás e carvão.

Não tem nenhuma possibilidade de êxito nas próximas reuniões para discutir o clima, com a presença das grandes empresas de combustíveis fósseis. São interesses completamente antagônicos, diametralmente opostos aos que estão em jogo. A vida e a morte se opõem neste tabuleiro, em que os interesses econômicos estão acima de qualquer outro interesse, inclusive da vida em nosso planeta. E o poderio dos “lobistas do petróleo” acabam dificultando as soluções adequadas para o tamanho do problema.

O histórico das empresas de combustíveis fósseis é no mínimo criminoso. Já na década de 80, do século passado, propagandeavam mensagens negacionistas em relação ao clima. Campanhas de desinformação, propaganda e lobby, envolvendo vários bilhões de dólares, tiveram o objetivo de retardar ações de enfrentamento, confundindo não só o público em geral, mas também os legisladores sobre a crise climática, suas causas e soluções. Um “modus operandi” semelhante ao que a indústria tabagista também adotou.

Em relação às promessas não cumpridas, acordado na COP15 realizada em 2009, em Copenhague foi a criação de um fundo de US$ 100 bilhões. Os países ricos se comprometeram, a partir de 2020, a depositar anualmente esta quantia para financiar as indenizações aos países de baixa renda na adaptação aos efeitos devastadores do clima. Até na COP27 ainda se espera o cumprimento desta promessa, mas nada indica que estes valores serão atingidos. Muito menos o que avalia os ambientalistas, valores na faixa de trilhões de dólares.

Segundo relatório da ONU os prejuízos causados pelos eventos climáticos extremos estão calculados acima dos US $200 bilhões, e o que se tem em caixa são US $300 milhões de dólares. Uma proposta da ONU seria a corretíssima cobrança de um imposto junto às petroleiras, que serviria para indenizar as “perdas e danos” dos países pobres.

Além de banir os lobistas das energias fósseis das reuniões do clima, de impor um imposto para estas “empresas da morte”; outro ponto fundamental para as próximas reuniões do clima é a participação da sociedade civil organizada nas reuniões e nas decisões que oficializam os compromissos assumidos.

O planeta é um só, e a luta para conter o desastre anunciado é de responsabilidade de todos seus habitantes, e não somente dos governos e seus representantes. Assim, acredito que se poderia reduzir em muito o descompasso entre o discurso e a ação clamada pelos 8 bilhões de moradores, caso tais reuniões incorporassem os principais atores, Nós.

Heitor Scalambrini Costa, doutor em Energética é professor aposentado da Universidade Federal de Pernambuco.

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