Irmã scalabriniana recebe Prêmio de Comunicação da CNBB por dissertação sobre menores refugiados.
Por Redação
Com a dissertação Menores estrangeiros não acompanhados – uma análise da representação no fotojornalismo italiano, a jornalista Rosa Maria Martins Silva, 53 anos, da Congregação das Irmãs Missionárias Scalabrinianas e atuante na Igreja Matriz de Santo André, da Diocese de Santo André (SP), venceu, na categoria Papa Francisco (Pesquisas), a 53ª edição dos Prêmios de Comunicação da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). Em razão da pandemia, a premiação foi realizada de modo remoto.
Rosa Martins nasceu em Inhapim (MG). É mestre em Comunicação, Imagem e Entretenimento pela Fundação Cásper Líbero (SP). Também é licenciada em Filosofia pela Universidade Salesiana de Lorena (SP) e Bacharel em Teologia pelo Instituto São Boaventura de Roma, na Itália.
Rosa, poderia falar sobre como surgiu a inspiração para a realização da sua dissertação sobre os menores refugiados?
Trabalhei por 16 anos a fio na educação em nossa Rede Scalabriniana de Educação. Tenho uma paixão especial por crianças. Uni essa paixão àquelas da missão própria, pelo jornalismo, somadas a um olhar sensível pela causa de quase 200 mil crianças desacompanhadas que buscaram asilo na Europa no período da pesquisa, a saber 2016-2018. Ademais, me chama a atenção no fenômeno migratório e me causa grande compaixão, a diáspora africana que continua nos dias de hoje e as perigosas travessias no Mediterrâneo.
Quanto tempo para elaboração da dissertação? Como foi essa experiência para você?
Foram dois anos intensos de estudos. Em 2017 e 2018 passei uma temporada na Itália nas cidades de Roma, Siracusa, Lampedusa, Catânia, Lamezia Terme, Calábria, Napoli, Lucca, Porcari e Massa Macinaia, para acompanhar as travessias dos imigrantes e encontrar os menores e conviver com eles.
Você me pergunta como foi a experiência. Única. Ímpar. O período da minha pesquisa foi um tempo fortíssimo de migração para a Europa. Os jornais só falavam disso todos os dias. As travessias eram intensas. Não dá para descrever o que vi e vivi em tão poucas palavras. Como é duro ver o sofrimento humano e não poder aliviá-lo. Eu só podia ouvir, buscar forças em Deus para escutar tamanha dor, tamanha necessidade de arriscar a vida para viver. Parece contraditório, né? Narro uma das experiências: em Catânia, sul da Itália, quando entrevistei um menino africano, de 15 anos. Ele me contou: “Eu saí sozinho, parte do caminho da Guiné para a Líbia fiz de carro, depois caminhei uns 10 dias pelo deserto. Encontrei restos de roupa, pedaços de braços, corpos de mulheres, homens, crianças deterioradas pelo caminho e eu pensei: quando acabar minha comida, eu também vou morrer. Mas graças a Deus estou aqui. Fiquei escravo dos traficantes por dois meses na Líbia. Amontoados em um galpão, quem pedia comida eles batiam ou atiravam, faziam sexo com as pessoas ali no meio de todo mundo. Fugi por um buraco na parede e caminhei de noite com outras pessoas, em silêncio para ninguém nos ouvir e pegamos o barco para a Itália. Graças a Deus, estou aqui”.
São histórias duras, inacreditáveis, que causam indignação, revolta, como também uma tremenda paixão por esta missão. Tenho tanto a contar… Não caberia num livro o que vivi e ouvi. Havia momentos que a história era tão dura, que as lágrimas desciam ali mesmo sem eu querer. Por outro lado, me encanta e apaixona, o sorriso, a alegria e a esperança mesmo na dor. A primeira coisa que um migrante faz quando desce do barco é ajoelhar, agradecer e sorrir. É emocionante. Quanto ensinamento!
E a emoção de receber o prêmio? O reconhecimento ao trabalho e dedica para quem?
Muita emoção! Esse prêmio em primeiro lugar é dedicado a essa gente pequena, infante, corajosa, protagonista da própria história e que me ensina muito. Eles ultrapassam todas as barreiras porque tem amor a si próprio, amor à vida e seguem em frente. Dedico em especial a cada um deles que confiaram a mim as suas histórias pessoais. Eles me inspiram a cada dia na minha vocação. Meninos, esse prêmio é de vocês! Obrigada!
Receber um prêmio da Igreja por um trabalho como esse que toca a carne humana sofrida, dilacerada, marcada pela opressão, é sinal para mim, de que a Igreja Católica é, de fato, testemunha do Evangelho de Jesus. Ela entende de Evangelho. Quanta satisfação! Pelas crianças, pelos migrantes e refugiados, obrigada, CNBB, Igreja do Brasil, que eu tanto amo e respeito. Quero dedicar esse prêmio a papai e mamãe (in memoriam) que me educaram na fé, formaram o meu caráter e me incentivaram a estudar sempre, à minha família e à Irmã Romilda Cappellini, missionária scalabriniana que tudo fez para que eu entrasse na faculdade de comunicação e ao Papa Francisco por ser a voz por excelência que, num mundo conturbado, se levanta, sem medo, em favor dos migrantes e refugiados. Uma voz eficaz que tem causado efeitos importantes para a acolhida, a proteção, a promoção e a integração desses migrantes e refugiados. E, mais ainda, quando se constata que são muitos milhões os refugiados e outros migrantes forçados que pedem a proteção internacional, sem contar as vítimas do tráfico e das novas formas de escravidão nas mãos de organizações criminosas. Ninguém pode ficar indiferente perante este sofrimento. Um papa assim tão humano, tão sensível com a causa do outro, me enche os olhos!