O pensamento complexo é um desafio, não uma resposta. (Edgar Morin)
Por Roberto Malvezzi (Gogó)*
O mundo jamais voltará a ser como era antes da pandemia. A pandemia indica a mudança do mundo.
Como já se diz, passamos não por uma época cheia de mudanças, mas por uma mudança de época. Não são várias crises, mas uma crise civilizacional que se expressa em múltiplas dimensões (Papa Francisco).
Para alguns, uma mudança de Era Geológica. Essa é a tendência posta, é dela que falaremos. Entretanto, é sempre bom considerar a possibilidade das mudanças históricas imprevisíveis, como já dizia Bento XVI, como foi a queda do Terceiro Reich e da União Soviética. Como dizia Casaldáliga: “a humanidade tem o DNA de Deus e não é suicida”. Portanto, falamos de tendências, não de afirmações absolutas. A humanidade pode reagir, porém, a gravidade das tendências é real e factual: “Se tardar mais, tarde demais” (Papa Francisco).
O mundo das tecnologias avança, o mundo e o número das populações descartadas também (Papa Francisco). Avança o “apartheid tecnológico”.
Cresce o confronto geopolítico dos Estados Unidos e Europa em relação à China e aos BRICs. O Brasil atual optou por ser servo dos Estados Unidos.
Avança a disputa pelos bens naturais como minérios, petróleo, gás, água e biodiversidade. Países como o Brasil optam pelo enjaulamento nos bens primários, como grãos, minérios e carne in natura.
A tendência de expandir o “mercado” de bens primários para além da Terra, para o espaço, a Lua, Marte e asteroides vai se intensificar, inclusive de forma privada (Helon Musk). Um asteroide de ouro massivo valeria mais que toda riqueza da Terra. As descobertas cosmológicas tendem a se desenvolver com maior velocidade. Objetos não identificados, como os tic-tacs encontrados pela Marinha dos Estados Unidos, deverão ter sua origem decifrada e publicada. Emirados Árabes, China e Estados Unidos chegaram a Marte quase no mesmo dia.
Intensifica-se a guerra híbrida pela disputa das consciências e o controle das pessoas, também a internet das coisas.
O trabalho em casa chegou para ficar, para alguns, mas o maior empregador continuará sendo o de aplicativos, aonde se vai de carro, moto, bicicleta e a pé. Enfim, a precarização do mundo do trabalho tende a ser definitiva.
A mudança no mundo trabalho e a destruição da legislação trabalhista tendem a ser permanentes, mas os prejudicados tenderão a se organizar diante dessas novas formas de exploração do trabalho.
As privatizações acontecidas tendem a ser definitivas. No Brasil, o Estado construído por Guedes permanecerá como permaneceu no Chile após Pinochet. E Guedes foi colaborador íntimo de Pinochet.
A destruição da saúde pública tende a ser permanente, da Universidade Pública, da Educação Pública.
O fosso social entre bilionários e povo pobre se aprofundará.
O apartheid social já é visível nas cidades através dos condomínios e das favelas enjauladas nos morros, beiras de rio e lugares insalubres.
A alma brasileira estará dividida por longo tempo. Os construtores da cultura da paz terão um longo e sombrio tempo pela frente.
Num Brasil estruturalmente injusto só o Estado policialesco, militarizado, milicianizado, com a elite armada privadamente, será possível sufocar e reprimir revoltas populares. A democracia e o Estado tendem mínimos cada vez mais. O capitalismo pode amenizar as revoltas com políticas tipo “renda mínima”.
Nas periferias o povo continuará com suas artimanhas de sobrevivência, nos corações justos o desejo e o empenho por mudanças continuarão.
O ódio permanecerá, porque ele se baseia na divisão social real da sociedade, entre quem têm riquezas e quem vive na miséria. Muitos pobres continuarão adorando pessoas como Bolsonaro, seguindo como rebanho pastores e lideranças religiosas, mas os ricos continuarão odiando gente pobre, índios, pretos, nordestinos, LGBTs etc. A classe dominante jamais erra na sua “luta de classes”.
O fundamentalismo religioso – incluindo o propósito da Teocracia Evangélica - permanecerá como aliado dos nazifascistas, até como fundamentação teológica, porque todo fundamentalismo se identifica com outros fundamentalismos semelhantes, mesmo que tenham outros matizes de origem. As igrejas não terão mais unidade, fora as exceções honrosas de sempre, mas o comportamento de “manada”, de “rebanho” tende a permanecer pela busca de alguma segurança das pessoas jogadas nas agruras de um mundo inseguro.
A mudança nos costumes, que tem por mãe a revolução dos costumes de 1968, tende a avançar, mas as forças reacionárias se tornarão cada vez mais belicosas na área dos costumes. Os liberais e neoliberais são a favor dessas mudanças, vide Rede Globo.
O cristianismo originário da justiça, misericórdia, fraternidade, partilha, permanecerá nas periferias da humanidade e do cristianismo, com poucas adesões, as “minorias abraâmicas” das quais falava Dom Hélder. De resto será o poder, a prosperidade, a hipocrisia, as aparências, as vestes, as mídias, com predomínio do “deusnheiro”. Nos países mais abastados e com bom nível de educação devem crescer o ateísmo e a indiferença religiosa, sobretudo a indiferença eclesial.
A destruição da Amazônia indica não ter mais volta e, sem ela, muda o território brasileiro, com a diminuição drástica de chuvas do Centro-Oeste para baixo, indo até Argentina, Uruguai e Paraguai.
A proposta dos povos originários, do “Bem Viver”, com seu comunismo primitivo, que não aceita a privatização da terra, da água, da biodiversidade, do ar, do sol, resiste subalternamente - como sempre resistiu -, porém, sem a força para tornar-se hegemônica.
Sem Amazônia, com enfraquecimento dos rios voadores, enfraquecem os aquíferos do Cerrado que alimentam as bacias brasileiras, inclusive a do São Francisco.
Com a diminuição da biodiversidade vegetal, habitat dos animais, novas pandemias e endemias vão surgir, sempre com maior velocidade, com eliminação massiva de seres humanos, como acontece agora no Brasil e no mundo.
Com o agravamento das mudanças climáticas, o território brasileiro, em grande parte, se torna inóspito para a vida, particularmente a humana (Lovelock).
A temperatura elevada permitirá vidas somente em alguns pontos do território e da Terra. A elevação dos oceanos mudará a geografia física e humana dos litorais, particularmente no Brasil.
Enfim, a vitória total do capitalismo significará uma Terra hostil e uma humanidade reduzida, altamente tecnificada, mas depois, nem os capitalistas sabem o que será.
Parcela riquíssima da humanidade prepara bunkers para sobreviver caso venha a catástrofe. Os sobrevivencialistas têm seus motivos (UOL). Porém, tendem a sobreviver aqueles que sempre sobreviveram nas condições mais adversas e hostis.
Até o final desse século a Terra e a humanidade serão completamente diferentes do que são hoje.