Onde está teu tesouro aí está teu coração

Alfredo J. Gonçalves, CS *

Podemos iniciar perguntando onde está o tesouro, por exemplo, dos grandes empresários e comerciantes, dos latifundiários e pecuaristas, dos banqueiros e mega-investidores? Onde está o tesouro dos senhores da riqueza e do capital, dos maiores magnatas e bilionários do planeta? Não será difícil responder a essa pergunta, se levarmos em conta todo o esforço que fazem para multiplicar seus bens. E vem então a outra pergunta: onde está seu coração?

Ambas as perguntas convergem numa só resposta: tesouro e coração se entrelaçam. Um é prisioneiro do outro. Quanto mais correm atrás da riqueza, mais o coração aí se perde. Reduz-se a um segurança de fortalezas aparentemente inexpugnáveis. O coração se amesquinha e se comprime. Sobrecarregado de dólares, de ouro e prata, fica impossibilitado de voar livremente. Além disso, tesouro e coração podem a qualquer momento ser vítima da traça e dos ladrões.

E se, num segundo momento, perguntarmos onde está o tesouro dos homens e mulheres de sucesso. Aqueles que através dos meios de comunicação acumulam nome e prestígio. Onde está o tesouro das grandes personalidades, das celebridades, atores e atrizes, esportistas e cantores, modelos e apresentadores? Quantos esforços para seguir jovem, elegante, no topo da moda! Quanta malhação para manter o corpo esbelto! Quanta preocupação com o culto do "eu", com os holofotes, as câmaras e os pararazzi! A traça e os ladrões rondam seus passos.

Também aqui não é difícil descobrir onde está seu coração. Para defender esse tesouro, será necessária uma vigilância permanente. O mais grave é que, neste caso, o tesouro é volátil, efêmero, descartável. O espetáculo do sucesso é seguido, normalmente, de frustração. A queda é inversamente proporcional às expectativas da ascensão. O show pirotécnico, após a subida vertiginosa, a exploração e o colorido das luzes, reduz-se a cinzas. As cortinas se fecham, a platéia vira as costas e os aplausos são substituídos pelas vaias. Resulta um vazio que, não raro, enche o coração de saudade, tristeza e amargura.

A terceira pergunta pode dirigir-se aos cientistas e investigadores, filósofos e teólogos, historiadores, professores, inventores e médicos, enfim, aos profissionais liberais em geral. Onde está seu tesouro? Está na busca, na pesquisa, no afã de conhecer o mistério das coisas e das pessoas. Dissecam a natureza, dissecam a história, dissecam o corpo e a alma do ser humano... Tentam encontrar as leis que regulam a vida animada ou inanimada. Desvendam mistérios, "desencantam o mundo", diria Max Weber. A traça da soberba e os ladrões do saber espreitam seu árduo trabalho.

Seu coração encontra-se tomado pela vontade de conhecimento. Acumulam títulos e procuram superar os limites da ignorância, penetrar cada vez mais no segredo das relações que unem seres e fatos, moléculas e átomos. Deparam-se o tempo todo com novas fronteiras a serem vencidas. Qual o limite dessa busca? Na engenharia genética, por exemplo, até onde se pode seguir investigando? É legítimo invadir o sacrário da vida, suas fontes e origem? Onde o humano toca o mistério incomensurável e indecifrável do divino? O discernimento é difícil, duvidoso, sem contornos precisos. Orgulho e humildade entram num embate cujo resultado é sempre imprevisível. A fé e a ciência travam um diálogo de titãs, o qual tanto pode enriquecer a pesquisa quanto desvirtuá-la.

Tentemos imaginar a pergunta dirigida aos políticos: onde está teu tesouro? É inevitável a mescla entre poder e riqueza. A promiscuidade entre ambos cria um círculo de ferro em que o dinheiro compra votos e a vitória nas eleições gera a possibilidade de maior enriquecimento. Os donos dos bens se tornam os donos do poder e vice-versa. Basta uma rápida olhada para a prática seguida pelos três poderes da União, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Onde está seu coração? Além da interligação do binômio "poder e dinheiro", constata-se ainda uma nova promiscuidade entre as várias instâncias do Estado. Uns tendem a encobrir e legitimar os erros dos outros, numa espécie de corporativismo de mútua proteção.

Este e outros vícios da prática política levam à conclusão de que a democracia nos países do ocidente não passa de mais um mito da razão iluminista e instrumental. O coração se prende ao poder como meio de vida e de enriquecimento permanente. Daí a luta para manter o posto conquistado. Quantos senadores, deputados e vereadores fazem tudo para manter sua cadeira cativa? Cadeira cativa que, por sua vez, se estende aos apadrinhados e compadres, aos parentes e afilhados, além de contaminar os demais poderes. Não é essa muitas vezes a única razão de ser da política, ou da politicagem! A traça da corrupção pode levá-los a perder o cargo para os opositores, que sempre aparecerão como ladrões.

Mas a mesma pergunta poderia ser dirigida aos moradores do andar de baixo: operários e operárias, camponeses e assalariados rurais, empregados e empregadas dos serviços públicos, profissões de baixa renda, enfim, a todos os trabalhadores e trabalhadoras, povo da rua, na cidade e no campo. Onde está seu tesouro? Quantos alimentam a ilusão da riqueza fácil e mágica! A loteria, o golpe de mestre, o trabalho sem descanso podem ser expressões desse sonho. Quantos miram o andar de cima com ansiedade mórbida! Quantos deixam de viver o dia-a-dia tentando alcançar o impossível!

O fascínio e o frenesi da riqueza e do sucesso prendem não poucos corações. A teimosia e a persistência para vencer na vida são louváveis, mas podem se converter numa enfermidade incurável. Desmoronam-se os castelos de areia e, com eles, as aspirações mais genuínas. O resultado é decepção e desilusão em meio a um monte de ruínas e escombros. O mais grave é que, muito frequentemente, uns puxam o tapete dos outros para subir na vida. Tentam apagar a estrela do vizinho para fazer brilhar a própria. Um coração egoísta e ambicioso é capaz de tudo. Vive corroído pela traça da inveja e do ciúme, pelo medo dos mais espertos ou ladrões.

E se direcionamos a pergunta às religiões e aos religiosos em geral: Onde está o tesouro de bispos e cardeais, padres e pastores, religiosos e religiosas, pais e mães de santo, iluminados e gurus, enfim, devotos e peregrinos da fé em todas as suas expressões? Não é raro encontrar na religião um meio de vida. Também não é rara a exploração dos fiéis por parte dos dirigentes. Quantas vezes a Providência Divina é substituída pela providência do Bradesco, do Itaú e de grandes investimentos imobiliários ou financeiros! Talvez o problema central não seja quantos bens se acumulam, e sim a serviço de quem estão os imóveis, com seus espaços físicos, o dinheiro líquido, enfim, os recursos humanos e financeiros? O que se faz com os bens ou com o "dízimo" das pessoas que buscam aflitas o conforto e a salvação do além?

Dependendo da resposta, é fácil saber onde está o coração. Este pode ser um prisioneiro do medo e da mesquinhez, buscando garantir o futuro através de uma acumulação constante, ou um facilitador da solidariedade para com os pobres, confiante na graça de Deus. Podemos desenvolver grupos corporativistas, voltados para o bem, o conforto e a segurança de si mesmos, ou desencadear iniciativas de assistência, organização e mobilização em meio à população de baixa renda. Tanto podemos trabalhar pelos privilégios de uma classe média acomodada, quanto lutar em defesa dos direitos humanos e das vidas ameaçadas. A traça pode ser o desvio do carisma ou da missão evangélica, enquanto os ladrões são aqueles que sem qualquer tipo de escrúpulo usam e abusam do "óbolo da viúva" (Mc 12, 41-44).

Para concluir, tomemos o testemunho de Jesus Cristo. Onde estava seu tesouro, o sentido mais profundo de sua passagem pela terra? Clara e enfaticamente, no Reino de Deus, constituído de relações novas consigo mesmo, com a natureza, com os outros e com um Deus de misericórdia e compaixão. O Reino constitui o núcleo inquestionável de sua mensagem, enquanto o pobre encontra-se no centro do Reino. Duas centralidades marcantes e recorrentes nas páginas do Evangelho. Duas centralidades indissociáveis e inegociáveis. O que significava, no fundo, estabelecer uma ponte entre a intimidade com o Pai e o compromisso com as vítimas da história.

Ou seja, o tesouro estava fora da preocupação consigo mesmo ou com sua família restrita. Estava vinculação à revelação do rosto de Deus. Este é o primeiro passo do discípulo missionário: o sair de si mesmo. Passo difícil se levarmos em conta o quanto a sociedade moderna ou pós-moderna centra-se num individualismo exacerbado, levado às últimas consequências. O bem estar social foi substituído pelo bem estar pessoal. Se, de um lado, as traças e os ladrões não tinham poder sobre o tesouro de Jesus, de outro, solapam e minam os alicerces de nosso egocentrismo. Os ladrões o espreitam de todos os lados, ao passo que as autoridades da época de Jesus puderam, sim, tirar-lhe a vida, mas não o tesouro. Este o acompanhou e se revelou inteiro na ressurreição. Seu tesouro e seu coração venceram todos os inimigos, inclusive a morte.

* Alfredo J. Gonçalves, CS, superior provincial dos missionários carlistas e assessor das pastorais sociais.

Fonte: Alfredo J. Gonçalves, CS

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