Dois amores fundaram, pois, duas cidades: o amor próprio, levado ao desprezo a Deus, a terrena; e o amor a Deus, levado pelo despojamento de si próprio, a cidade celestial. (Santo Agostinho)
Por Geovane Saraiva*
Na vastidão do enorme teatro da história e da vida humana, na ampla dinâmica de seu todo, duas dramáticas, inquietantes e abissais forças edificaram duas cidades, a saber, na repetição da pertinente afirmação do doutor da graça, Santo Agostinho: “Dois amores fundaram, pois, duas cidades: o amor próprio, levado ao desprezo a Deus, a terrena; e o amor a Deus, levado pelo despojamento de si próprio, a cidade celestial". Aos olhos da fé, como é imprescindível o sentido da transcendência! Ela agarra-se à compaixão de Deus como irresistível, no seu coração em chamas num olhar elevado, indo às alturas: “Chamaste, clamaste e rompeste minha surdez”.
Neste mês de agosto pensemos, pois, nas vocações, no chamado que Deus constantemente quer fazer a nós, interpelando com insistência, no exemplo do vocacionado do primeiro dia do mês, Santo Afonso Maria de Ligório, uma vocação a serviço da vida e do Reino de Deus; ele com o crucifixo às mãos, sem esquecer o Livro Sagrado e a imagem daquela mulher da mão grande, a Senhora do Perpétuo Socorro, estava sempre pronto para o bom combate da fé. A inspiração, que venha mesmo de Jesus, que, humanamente entristecido com a morte de João Batista, não se sente impedido; ao contrário, move-se de compaixão, não permitindo que a tristeza O torne insensível à dor e à fome de uma multidão de irmãos (cf. Mt 14, 14).
Que saibamos, pois, ver a vida como insuspeita e comprovada, inaudito mistério de amor, como dom e graça de Deus. O agosto vocacional pede de nós discernimento no chamado de Deus, pede ânimo e coragem diante da falta de compromisso, no desapego de si próprio, em vista da cidade celestial, idealizado por Santo Agostinho e que se concretizou em Afonso Maria de Ligório, mas na convicção de que o amor é gigantescamente maior e incomparável à tristeza de uma multidão incontável de irmãos, pelos que passam a não existir mais. É o mesmo Espírito de Jesus de Nazaré, diante da morte de João e da Covid-19, dizendo-nos: deixe-nos livres, pois a morte de muitos irmãos nos inquieta e nos compromete.
Só mesmo num compenetrar sedutor e esperançoso, na alegria da manifestação do Cristo Senhor, a nos dizer que em tudo somos mais que vencedores, graças àquele que nos amou, na certeza de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os poderes celestiais, nem o presente, nem o futuro, nem as forças cósmicas, nem a altura, nem a profundeza, nem outra criatura qualquer nos poderá separar do amor de Deus por nós (cf. Rm 8, 38-39). Assim seja!