O escândalo da pedofilia

Demétrio Valentini *

Está tendo ampla repercussão a divulgação de casos de pedofilia, envolvendo membros do clero da Igreja Católica. O assunto merece ser analisado com cuidado, para perceber com objetividade sua dimensão, e distinguir os dados verdadeiros, da exploração que deles se faz com o intento de denegrir a imagem da Igreja, universalizando para toda a instituição o que se constitui em erros pessoais, de todo condenáveis, mas que não podem ser imputados como se fossem de autoria de toda a Igreja.

Em primeiro lugar, a própria Igreja se antecipa em reconhecer e em confessar a gravidade da situação, admitindo inclusive que houve culpa por falta de vigilância em coibir abusos, permitindo que padres pedófilos continuassem exercendo o ministério, favorecendo assim a continuidade dos delitos.

Independente da quantidade de casos constatados, mesmo que fosse um só, merece a clara condenação de todos, e se praticado por algum membro do clero católico, o reconhecimento de quanto isto depõe contra a imagem da Igreja.

Em recente carta à Igreja da Irlanda, onde foram constatados diversos casos de pedofilia praticada por padres católicos, o Papa Bento 16 faz uma dura advertência à hierarquia da Igreja daquele país, para que redobre a vigilância, e afaste do ministério todos os envolvidos na prática da pedofilia.

Se há uma conseqüência positiva, decorrente da discussão levantada no mundo inteiro em torno da pedofilia, é o crescimento da consciência da criminalidade dos atos de abusos sexuais praticados com crianças. Eles se constituem em crimes, que precisam ser denunciados, e devem ser condenados, com responsabilização adequada de todos os que incorrem em alguma responsabilidade por seu cometimento.

As crianças têm o direito de serem preservadas das distorções sexuais dos adultos, sejam eles quem forem. Esta consciência da necessidade de preservar as crianças da maldade dos adultos precisa avançar muito mais. É toda a sociedade que precisa estar atenta para preservar a inocência das crianças. Nisto toda a sociedade tem culpa em cartório. Se fosse usado o mesmo rigor com que agora se aponta para os padres pedófilos, quantas situações precisariam ser denunciadas, nas famílias, na sociedade, sobretudo nos meios de comunicação social, onde não despertou ainda a consciência dos prejuízos causados às crianças pelas situações a que elas ficam expostas.

Mas no que se refere diretamente à pedofilia, seria muita hipocrisia achar que ela se limita aos casos praticados por padres católicos. Existe inclusive uma evidente campanha, levada adiante por pessoas interessadas em denegrir a imagem da Igreja Católica, que está se aproveitando desta situação para tornar ainda mais virulentas as acusações contra ela. Por isto, no Brasil não é nada de estranhar que uma conhecida rede de televisão se esmere agora em ampliar o que é sua razão de ser: acusar continuamente a Igreja Católica, usando para isto todos os meios de que dispõe.

Neste sentido, sem fazer dos números uma desculpa, é importante olhar os dados com objetividade. O Professor Carlos Alberto di Franco, Doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra (difranco@iics.org.br), traz a seguinte constatação: desde 1995, na Alemanha, houve 210.000 denúncias de abusos de pedofilia. Destas denúncias, só trezentas se referem a padres católicos. Isto é, só 0.2% por cento do total. E por que só se insiste em falar da Igreja, tentando inclusive envolver o Papa, acusando-o de responsabilidade por ter aceito um padre pedófilo na sua diocese, no tempo em que era arcebispo de Munique? Por que não se fala dos outros 99,98 por cento dos casos?

Se olhamos o clero do Brasil, em sua imensa maioria constituído de beneméritos ministros devotados à sua missão, com os limites humanos de que todos somos revestidos, a proporção é certamente parecida com a análise apresentada pelo Prof. Di Franco. Os raros casos de pedofilia constatados no clero brasileiro, por mais deploráveis que sejam, não justificam a hipócrita escandalização, levada em frente por meios de comunicação que trazem evidente a marca da tendenciosidade, que fica desmascarada à luz de qualquer dado objetivo.

A Igreja Católica está disposta a uma severa autocrítica de sua própria instituição, diante dos casos reais de pedofilia praticada por membros do seu clero. Ela aceita de bom grado os questionamentos objetivos que podem ser feitos pela sociedade. Mas ela dispensa a hipocrisia de quem generaliza as acusações, escondendo seus interesses escusos, e desvirtuando uma análise objetiva do problema da pedofilia.

* Bispo de Jales (SP) e Presidente da Cáritas Brasileira.

Fonte: www.diocesedejales.org.br

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