Ao falarmos em Vida Consagrada, estamos falando de um tema que possui significativa amplidão, considerando as suas diferentes vertentes e manifestações.
de Fábio Pereira Feitosa
Como sabemos a história da Igreja Católica é vasta e rica em acontecimentos, desta forma, ao observamos de mais perto esta instituição, percebemos que ela é detentora de uma complexa estrutura, na qual coexistem diferentes grupos, bem como diversas formas de se viver a fé no Cristo encarnado.
Outra constatação que podemos fazer ao realizarmos a observação mencionada anteriormente, é que as atuais estruturas desta organização foram sendo moldadas, adaptadas e evoluindo com o passar do tempo, porém, é importante que se afirme, que tal processo não significou o abandono ou esquecimento de suas raízes, assim, a Igreja encontra-se em permanente atitude de atualização, mas sempre observando e zelando por sua unidade e identidade própria.
Como dito acima, ao longo do tempo as estruturas da Igreja passaram por transformações, mas que respeitaram suas as características próprias, desta forma, diferentes níveis e segmentos desta instituição foram atingidas por diferentes sopros de atualização, como exemplo, podemos citar a Vida Consagrada em suas diferentes vertentes.
Ao falarmos em Vida Consagrada, estamos falando de um tema que possuí significativa amplidão, considerando as suas diferentes vertentes e manifestações, desta forma é preciso delimitar este conceito, ao fazermos menção a tal assunto, estamos nos referindo ao movimento de cunho religioso que teve início no interior da Igreja por volta do século IV com os chamados Padres do Deserto e que com o passar do tempo foi evoluindo e sendo sistematizada em Ordens, Congregações Religiosas e Institutos. É importante salientar, que este não é o único modelo de vida consagrada que existe, considerando que outras religiões também possuem formas distintas de vida consagrada.
Como podemos perceber, este tema é amplo e encontra-se presente na Igreja desde os seus primeiros séculos. Mas quem eram os chamados Padres do Deserto? Para entendermos quem eles foram, precisamos reconstituir o cenário no qual eles estavam inseridos. Ao iniciarmos esta tarefa devemos estabelecer aqui alguns esclarecimentos: 1º Os Padres do Deserto não eram necessariamente padres ordenados; 2º este grupo não surgiu de uma dissidência no interior da Igreja, ao contrário, este movimento era composto por pessoas que possuíam o forte desejo de viverem integralmente a Boa Nova e testemunhá-la por meio de suas vidas, para tal abandonaram tudo e partiram para o deserto, lá abraçaram uma vida de oração e de contemplação à Deus, longe das distrações e comodidades tão presentes nos centros urbanos.
Quando analisamos os primeiros séculos da história da Igreja, percebemos que estes foram marcados por ondas de perseguição estatal (em diferentes níveis), o que resultou em um significativo número de martírios. Em 313, o Imperador Constantino por meio do Edito de Milão findou as perseguições aos Cristãos e no ano 380 o Imperador Teodósio reconheceu o cristianismo como religião oficial do Império, desta forma Igreja e Estado foram unidos. A cordata entre estas duas esferas de poder resultou no acumulo de privilégios por parte da hierarquia do cristianismo e com isso tivemos um afrouxamento da fé cristã, haja vista que a soma de tais privilégios associada ao fim das perseguições desencadeou uma espécie de torpor anestésico na fé cristã. Os Chamados Padres do Deserto são frutos desta conjuntura.
Estes novos tempos, trouxeram consigo o aumento considerável de conversões ao cristianismo, porém, muitas destas acabavam sendo feitas por meio de uma fé de conveniência, considerando que diante do reconhecimento do cristianismo como religião oficial professada pelo Império, ser cristão acabava representando uma forma para obtenção de privilégios junto ao Estado. Findada a era dos martírios contra os cristãos no Império Romano, surgiu no interior da Igreja uma nova forma de testemunho e de fidelidade à essência evangélica e que naquele momento adquiriu uma função profética, assim os Padres do deserto por meio do seu êxodo, denunciavam a situação na qual a Igreja estava inserida, bem como anunciavam que é preciso se manter fiel ao Jesus, Obediente, Casto e Pobre, cujo modelo de vida parecia ter sido deixado de lado por muitos cristãos daquela época e para reencontra-lo era preciso “fugir” para o deserto, longe das mais variadas distrações, tão comuns nas cidades.
Os Padres do Deserto foram e continuam sendo exemplo de profetismo na Igreja, tal como eles, nós precisamos assumir a nossa missão de batizados e assim deixarmos o conforto das salas de reuniões, nas quais passamos muitas horas, pensando, planejando ações em prol dos mais necessitados, porém, estas muitas vezes elas acabam não saindo do papel. Devemos atender ao pedido do Papa Francisco e sermos uma Igreja em Saída, atenta aos clamores do tempo e as monções do Espírito Santo, desta forma precisamos ir aos desertos da atualidade, também conhecidos como periferias, sejam elas físicas ou existências. Desta forma, precisamos adotar uma postura de contemplação do transcendente, mas sem esquecer o plano terreno, assim teremos homens e mulheres com o pensamento voltado para Deus, mas com os pés no chão, inseridos e comprometidos com a anúncio e a construção do Reino em realidades concretas.