Presidente de El Salvador homenageia dom Oscar Romero

Discurso de Maurício Funes *

Discurso do Presidente de El Salvador, Maurício Funes, pedindo perdão à família, ao povo salvadorenho, à Igreja e às famílias afetadas pelo assassinato de Dom Oscar Romero

Senhoras e Senhores,

Hoje, como todos vocês sabem, nos une neste lugar a eterna recordação de dom Oscar Arnulfo Romero, líder espiritual da nossa Nação. Estou profundamente comovido em poder partilhar este dia com vocês, porque muitas vezes em minha vida eu pensei que a nossa Pátria não alcançaria nunca a paz se não recuperássemos a memória de dom Romero. O que jamais imaginei era que eu mesmo seria um dos protagonistas desta recuperação, ao dirigir o destino do país.

Queria dizer-lhes, em primeiro lugar, que este é um dia de dor, sem dúvida, porque está viva, em nossos corações, a lembrança do cruel assassinato de nosso bispo mártir; mas também, e principalmente, é um dia para a celebração da vida, para a reivindicação da figura e da obra do homem mais importante de nossa História recente. Como eu disse em outra ocasião: não recordamos nem celebramos a morte de dom Romero. Honramos a vida, sua vida, o maior exemplo que temos as salvadorenhas e salvadorenhos.

Hoje, 24 de março de 2010, é um dia de esperança para nosso povo e um dia histórico para a recuperação da nossa memória coletiva. Para que seja assim começarei expressando publicamente algo que deveria ter sido dito antes, mas que hoje é minha responsabilidade dizer. Uma responsabilidade que não pesa sobre mim, porque sei que alivia à sociedade, que é um bálsamo para um povo cansado de violência e que anseia pela reconciliação dos espíritos.

Queridos salvadorenhos e salvadorenhas,

Em nome do Estado salvadorenho, como Presidente da República, reconheço que o arcebispo de El Salvador, Oscar Arnulfo Romero Galdamez, no dia 24 de março de 1980, foi vítima de violência ilegal que perpetrou um esquadrão da morte. Este tipo de grupos armados ilegais exerceu o terror generalizado entre a população civil durante aqueles anos infelizes, deixando milhares de vítimas. Esses esquadrões, infelizmente, atuaram sob a cobertura, colaboração, obediência ou participação de agentes estatais.

Os integrantes do violento grupo que consumou o assassinato de dom Romero já haviam sido identificados por agências internacionais de investigação, tanto do sistema das Nações Unidas, como do Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Nosso governo já reconheceu a validade jurídica destes relatórios diante da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, o que torna inquestionável o nosso reconhecimento oficial da verdade no caso do assassinato de dom Romero.

Nestas circunstâncias e na qualidade de Presidente da República, peço perdão, em nome do Estado salvadorenho, por esse assassinato perpetrado há 30 anos. Peço perdão, em primeiro lugar, à família de dom Romero, a quem faço chegar minhas mais sinceras condolências e meu apoio institucional na sua luta pelo esclarecimento da verdade. Peço perdão ao povo salvadorenho que foi, é e será a "grande família" de dom Romero, seu herdeiro, o guardião da sua pregação e de seus ensinamentos. Peço perdão à Igreja Católica, salvadorenha e universal, que tem dom Oscar como um de seus mais exemplares pastores. Peço perdão às milhares de famílias afetadas por este tipo inaceitável de violência ilegal e especialmente, aos membros das comunidades religiosas que são representados pelo espírito de dom Romero e que mantêm vivo seu legado de paz e de respeito aos direitos humanos.

E repito o que disse no dia 16 de janeiro passado, ao pedir perdão pelas aberrantes violações dos direitos humanos durante o conflito armado por parte de agentes do Estado. Nos comprometemos a colaborar com a Justiça, nacional e internacional, colocaremos tudo o que seja necessário à sua disposição para o esclarecimento dos crimes investigados.

Queridos salvadorenhos e salvadorenhas,

Ninguém como dom Romero soube falar-nos do perdão. Ninguém como ele soube dizer a este povo sobre a importância do amor ao próximo, o respeito pela dignidade humana e a convivência pacífica acima de tudo, inclusive da própria vida. Ninguém como ele nos ensinou o valor da verdade e da justiça, que são pilares da doutrina social da Igreja. Permitam-me citar uma de suas homilias, pronunciada em 19 de junho de 1977: "Eu entendo - nos dizia então dom Romero - que é difícil perdoar depois de tantos abusos; e, no entanto, este é a palavra do Evangelho: ‘Amai os vossos inimigos, fazei o bem aos que vos odeiam e perseguem; sede perfeitos como vosso Pai celeste que envia sua chuva e ilumina com seu sol aos campos dos bons e dos maus'. Que não haja ressentimentos no coração".

Estas foram suas palavras: "Que não haja ressentimentos no coração".

Essas palavras resumem o significado que para mim e para meu governo tem este dia. É meu maior desejo que este ato de reconhecimento, este ato de amor do povo salvadorenho ao sacerdote que deu sua vida por ele, sirva para levar consolo e confiança no futuro a todos e a cada um de nossos cidadãos e nos ajude a desfazermos de uma vez por todas todo ressentimento.

Sigamos os ensinamentos de nosso líder espiritual, olhemos para frente com a paz em nossos corações, com amor a nossos irmãos e irmãs. Façamos, finalmente, que esse sacrifício de nosso bispo mártir tenha sentido. Construamos, a partir da memória reparada, um país mais justo para todos, mais feliz para todos. Um país, finalmente, mais perto de Deus.

Amigos e amigas,

Vamos inaugurar agora um mural. Uma obra que é uma expressão artística, uma interpretação de um artista salvadorenho da nossa figura de nosso mártir. A idéia de fazer esta obra aqui, na porta de entrada e saída internacional do país, é de minha querida esposa Vanda e tem a intenção de dizer aos que está a nos visitar que El Salvador honra a memória de Dom Romero. Que El Salvador passa pelo caminho da reconciliação. Que El Salvador partilha com a comunidade internacional o pleno respeito pelos direitos humanos. Que El Salvador ingressou no caminho da paz, da concórdia e da unidade para não mais sair.

A obra foi realizada por Rafael Varela, que foi ajudado por outro artista salvadorenho, Rafael Escamilla. Eles trabalharam 45 dias, com uma média diária de 18 a 19 horas. Foi um grande esforço que quero destacar. Mesmo para o próprio artista, que disse "ter elaborado neste mural, com grande satisfação, me permitindo conhecer mais sobre dom Oscar. Foi uma honra pintá-lo e agradeço à Presidência por haver-me dado este privilégio".
A honra é para a Presidência querido amigo Varela, por haver contado com seu talento para imortalizar esta homenagem. Sou eu, minha esposa Vanda e o governo de El Salvador que agradecem a você por sua grandeza, humildade e naturalmente, pela sua obra. Com este mural, com outras atividades que têm sido realizadas desde os dias anteriores e com um concerto que será realizado esta noite no Teatro Nacional, celebramos a memória de dom Romero.

Obrigado Rafael Varela e Rafael Escamilla. Obrigado a todos aqueles que organizam estes atos. Obrigado à Fundação Monsenhor Romero, à Secretaria de Inclusão Social. Obrigado a todos vocês, por nos acompanhar neste dia histórico, dia de esperança, como eu disse.
Que Deus abençoe a todos; que Deus abençoe a El Salvador.

El Salvador, 24 de março de 2010 (30 anos do assassinado de dom Oscar Romero).

Acompanhe o discurso em vídeo.

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