Câncer de todas as cores

Não basta apenas alertar a população, são necessárias políticas públicas de combate à doença, numa gestão humanizada e de qualidade.

Por Juacy da Silva*

Estamos quase chegando ao final do Outubro Rosa, mês dedicado ao alerta, principalmente às mulheres, quanto aos riscos do câncer de mama e a importância do diagnóstico precoce para que o tratamento seja viável e possível, evitando-se mais mortes, consideradas desnecessárias.

Dentro de uma semana, será iniciado o Novembro Azul, mês dedicado ao alerta, principalmente, aos homens quanto ao câncer da próstata, doença que também vem crescendo e fazendo vitimas que poderiam não apenas sobreviver mas terem uma vida digna em lugar de mortes precoces e evitáveis, em meio a um grande preconceito quanto ao exame de toque, que é a forma de detectar-se a doença.

O câncer, em seus mais de 22 tipos diferentes, mas com o mesmo estigma e pavor que causa nas pessoas e em seus familiares, é uma doença que data de milhares de anos e, mesmo com o avanço da medicina, da indústria farmacêutica e uma verdadeira revolução tecnológica na saúde, ainda está presente no mundo através de mais de 18,1 milhões de novos casos em 2018 e em escala crescente pelos próximos anos, podendo chegar a mais de 25 milhões de novos casos em 2030, além de 9,6 milhões de mortes, muitas totalmente evitáveis, caso a doença tivesse sido detectada, diagnosticada e o tratamento realizado a tempo.

Só para se ter uma ideia, em 2012 foram estimados 14,1 milhões de novos casos de câncer no mundo, passando para 18,1 milhões em 2018 e com estimativa de mais de 25 milhões em 2030. Em relação às mortes por câncer, no ano 2000 ocorreram 6,9 milhões de óbitos; passou para 8,1 milhões em 2010, este ano de 2018 deverá registrar 9,6 milhões e em 2030 estima-se que mais de 21 milhões deverão morrer vitimas de algum tipo de câncer, sendo que os principais serão: pulmão, colorretal, estômago, fígado, mama e esôfago.

saude pública1Em relação aos novos casos, em 2018, pela ordem decrescente os mais significativos são: pulmão e mama, com 2,1 milhões de casos aproximadamente cada um; colorretal com 1,7 milhões; próstata com 1,3 milhões e estômago com 1,03 milhões de casos.

No Brasil o panorama acompanha a tendência mundial, com um fator agravante que é a circunstância de sermos um país subdesenvolvido ou emergente, com poucos recursos para a saúde em geral e a área do câncer em especial, além do caos em que se encontra a saúde pública em nosso país, pela falta de planejamento, gestão empírica e deficiente, situação ainda mais agravada pela corrupção endêmica que tomou conta do Brasil em geral e da saúde pública em particular, há décadas ou séculos, pouco importando o tipo de governo ou ideologias defendidas pelos governantes de plantão.

Segundo estimativas do INCA – Instituto Nacional do Câncer e de outras instituições públicas e não governamentais, a luta contra o câncer, inclusive do o de mama, objeto do Outubro Rosa ou do de próstata que será destaque dentro de poucos dias com o Novembro Azul, tanto em 2018 quanto 2019, o número de novos casos de câncer no Brasil será de 634.880, um aumento de 35,1% em relação a 2008 e 2009 quando ocorreram aproximadamente 470 mil casos.

Neste mesmo período o número de novos casos de câncer de mama passaram de 49.400 em 2012 para 59.700 em 2018/2019; o de próstata aumentou de 49.530 em 2012 para 68.220 em 2018; o colorretal de 26.990 para 36.360 e o de pulmão de 22.770 em 2012 para 31.270 em 2018.

O que mais desafia a sociedade brasileira quando falamos de câncer é que o tratamento é caro e às vezes se prolonga por vários anos e para 80% da população que é constituída de trabalhadores, urbanos e rurais, de baixa renda, onde mais de 85% tem uma renda per capita de no máximo 2,5 salários mínimos, a única alternativa para diagnosticar a doença e realizar o tratamento é o SUS, que está praticamente falido, faltando recursos para aquisição de medicamentos de alto custo, como são os relacionados com tratamento de câncer e outras doenças crônicas, falta de equipamentos como mamógrafos, tomógrafos e para outras imagens ou mesmo falta de leitos hospitalares e profissionais nas áreas de média e alta complexidade. Por isso este número elevado de mortes e muito sofrimento.

Segundo matéria da BBC/Brasil em fevereiro último, nada menos do que 235 mil pessoas morreram de câncer no Brasil em 2017, sendo que dessas mortes 38,7% eram de pessoas entre 15 e 65 anos, ou seja, participantes da população economicamente ativa , outra parte entre crianças e a maior parte entre idosos, grupo populacional bastante vulnerável e excluído social, econômica e politicamente em nosso país.

Enfim, tanto o Outubro Rosa quanto o Novembro Azul e os demais meses com suas cores e fitas ligadas aos demais tipos de câncer, não basta apenas alertar a população, despertar a consciência para que as pessoas se previnam, se, ao mesmo tempo, nossos governantes, nos poderes legislativos, executivos e judiciário também não se conscientizarem de que tratamento do câncer e de todas as demais doenças, principalmente as crônicas, não se faz com discursos e belas mentiras, mas sim, com dotações e execução orçamentárias adequadas e uma gestão humanizada e de qualidade.

Se isto não for feito, vamos presenciar centenas de milhares de pessoas sofrendo, sendo mal tratadas e morrendo ante o descaso de quem tem por obrigação e dever de zelar pela dignidade e qualidade de vida da população. Para isso é que são eleitos ou designados para cargos importantes nos governos federal, estaduais e municipais. O resto é conversa mole ou discursos para boi dormir.

Juacy da Silva, professor universitário, titular e aposentado UFMT, mestre em sociologia, colaborador e articulista de diversos veículos de comunicação. Email professor.juacy@yahoo.com.br Twitter@ profjuacy Blog www.professorjuacy.blogspot.com

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