Perdoar sem limites. Viver a alegria da compaixão!

Não é possível ser cristão sem manter viva na comunidade a união e a fraternidade, aonde são plantados os valores da caridade, da solidariedade, da tolerância e do respeito.

Por dom Eurico dos Santos Veloso*

No final de semana que passou celebramos o 24º Domingo do Tempo Comum, que teve como tema central o PERDÃO. Deus ama sem cálculos, sem limites e sem medida. Deus nos convida a assumir uma atitude semelhante para com os irmãos que, dia a dia, caminham ao nosso lado. E, de minha parte, faço um digressão: nenhum padre e nenhum bispo ouse celebrar a Eucaristia se não perdoar o irmão e se não tiver compaixão.

amizadeA compaixão foi o tema central do Evangelho do domingo que passou, em que não te digo perdoar até sete vezes, mas até setenta vezes sete (cf. Mt 18,21-25). São Mateus nos apresenta um Deus cheio de bondade e de misericórdia que derrama sobre os seus filhos – de forma total, ilimitada e absoluta – o seu perdão. Nós que somos batizados somos convidados a descobrir a lógica de Deus e a deixar que a mesma lógica de perdão e de misericórdia sem limites e sem medida marque a nossa relação com os irmãos.

Perguntado por Pedro a respeito de quantas vezes devemos perdoar, Jesus responde que o perdão deve ser dado “até setenta vezes sete” (cf. Mt 18,24) E o perdão vem seguido da parábola contrastante do modo de agir. Primeiramente temos um patrão que, diante da súplica insistente do devedor, que lhe devia enorme quantidade monetária, foi capaz de perdoar (cf. Mt 18,27). Do outro lado, o que foi perdoado regiamente pelo patrão não soube perdoar ao seu devedor, que lhe devia pequena e insignificante quantia monetária (cf. Mt 18,30). Jesus, com isso fala da reação do patrão, que procurado pelos entristecidos outros empregados, vai ao encontro daquele que fora perdoado e não perdoou e diz categoricamente: “Não devias tu também ter compaixão do teu companheiro, como eu tive compaixão de ti” (cf. Mt 18,33).

Infelizmente observamos muitas pessoas, na sociedade e na Igreja, pedir perdão de suas faltas e não perdoar, na mesma medida que foram perdoados, aqueles que lhe devem alguma quantia. Jesus acentua, neste Evangelho, o valor do perdão na comunidade cristã e a sua medida deve ser sem limites. O perdão de Deus não é negado para ninguém. Ninguém cumpre pena perpétua. Toda pena tem a sua remissão, desde que se tenha arrependimento e mudança de vida.

Entretanto, sabendo que muitos querem ser perdoados e não sabem perdoar a primeira leitura (cf. Eclo 27,33-38,9) deixa claro que a ira e o rancor são sentimentos maus, que não convêm à felicidade e à realização do homem. Mostra como é ilógico esperar o perdão de Deus e recusar-se a perdoar ao irmão; e avisa que a nossa vida nesta terra não pode ser estragada com sentimentos, que só geram infelicidade e sofrimento. O livro do Eclesiástico é categórico: “O rancor e a raiva são coisas detestáveis; até o pecador procura dominá-las. Quem se vingar encontrará a vingança do Senhor, que pedirá severas contas de seus pecados. Perdoa a injustiça cometida por teu próximo: assim, quando orares, teus pecados serão perdoados” (Cf. Eclo 27,33-28,1-2). A vingança é nefasta, por isso devemos escolher sempre a prática do perdão e da compaixão. Somente obterá a divina recompensa quem perdoar a injustiça cometida por teu próximo. A vivência da misericórdia deve ser acolhida, partilhada e vivenciada individualmente e comunitariamente. A sabedoria do homem é perdoar e recomeçar, agradecendo a Deus todas as vezes que perdoamos os que nos ofendem: “O Senhor é bondoso, compassivo e carinhoso” (Sl 102(103).

Na segunda leitura (cf. Rm 14,7-9) São Paulo sugere aos cristãos de Roma que a comunidade cristã tem de ser o lugar do amor, do respeito pelo outro, da aceitação das diferenças, do perdão. Ninguém deve desprezar, julgar ou condenar os irmãos que têm perspectivas diferentes. Os seguidores de Jesus devem ter presente que há algo de fundamental que os une a todos: Jesus Cristo, o Senhor. Tudo o resto não tem grande importância. Não é possível ser cristão sem manter viva na comunidade a união e a fraternidade, aonde são plantados os valores da caridade, da solidariedade, da tolerância, do respeito, tudo por amor a Jesus Cristo, porque ninguém se esqueça que todos vivemos para o Senhor (Cf. Rm 14,8).

Experimentar o amor de Deus e se deixar transformar por Ele significa assumir uma outra atitude para com os irmãos, uma atitude marcada pela bondade, pela compreensão, pela misericórdia, pelo acolhimento, pelo amor.

*Dom Eurico dos Santos Veloso é arcebispo Emérito de Juiz de Fora, MG.

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