Elaine Tavares *
Quem assiste TV deve se lembrar. Quando o então senador Barak Obama era candidato à
presidência dos Estados Unidos havia uma espécie de "esperança" no sujeito. Era,
afinal, um negro, coisa inédita naquele país, bonito, simpático, charmoso, um
"democrata". E, por conta disso, a mídia cortesã o pintava como uma novidade, aquele
que iria mudar a cara dos EUA , dar uma certa leveza ao império. Bem, substituir
George Bush já significava isso. Mas, entre os "arautos da desgraça" - que são os
que tem olho crítico e conhecem a história - já se vaticinava. "Não haverá
novidades. Os democratas não se diferenciam dos republicanos em quase nada, a não
ser talvez numa certa simpatia tal como se pode encontrar em Carter, Clinton e agora
em Obama". Havia a certeza de que as coisas não mudariam. Bem, aí está o cenário
latino-americano se redesenhando na era Obama. E aquilo que Bush, na sua truculência
não conseguiu,
o jovem charmoso parece lograr.
George Bush saiu de cena com um grande osso na garganta: a Venezuela bolivariana.
Durante todo seu mandato não havia conseguido dobrar o país de Bolívar, comandado
agora por Hugo Chávez. Este, por sua vez, foi comendo o mingau pelas beiradas.
Colocou água no plano da ALCA, desestabilizou alguns Tratados de Livre Comércio
bilaterais, criou a PetroCaribe, amealhou aliados como a Nicarágua, a Bolívia, o
Equador e conseguiu com que alguns dirigentes auto-denominados à esquerda se
aliassem em algumas propostas pontuais dentro da lógica da ALBA, o contraponto da
proposta estadunidense. Era um avanço e tanto no território de poder dos Estados
Unidos que, por seu lado, andava atolado nas guerras do Afeganistão e do Iraque, que
ainda não logrou concluir em face da resistência heróica do povo, que podia até não
querer os talibãs ou Sadam, mas também não quer nenhum governo de dominação.
Pois agora com a chegada de Obama, os Estados Unidos tentam recuperar as rédeas da
sua reserva estratégica de riquezas, a América Latina. E, para isso, nada melhor do
que uma boa e velha receita, tantas vezes já utilizada em momentos de tentativas de
rebelião da massa do "quintal": o golpe militar. Assim, ao contrário do que fizera
Bush, que tentara desalojar Chávez em seu próprio país, num golpe de estado
articulado pela mídia e pela classe dominante, a jogada do governo Obama é muito
mais inteligente. Organiza e leva a cabo um golpe militar numa pequena república da
América Central, periférica ao território "rebelde", mas com algumas ligações
políticas capazes de levantar a fúria dos seus aliados. Escolhe Honduras, governada
por um latifundiário bem intencionado que já se atrevera a realizar negócios com a
Venezuela, buscando melhorar a vida do povo hondurenho.
Manuel Zelaya começou a orbitar o caminho da alternativa bolivariana quando acordou
entrar para a PetroCaribe e realizou negócios de compra de petróleo em condições
bastante justas e vantajosas para seu país. Foi o que bastou para ficar na mira do
império. Assim, quando acenou com a possibilidade de consultar o povo sobre uma
mudança constitucional, veio o golpe. Claro, querer ouvir o povo era um pouco
demais.
Agora o império se rearticula na América Latina. Dá uma boa lição nos pequenos que
tentam fugir de sua órbita, acusa o governo do Equador de ligações "obscuras" com as
FARC e acena com a possibilidade de criar várias outras bases militares na Colômbia,
uma vez que está para perder a que tem no Equador. Assim, vai cercando os seus
potenciais inimigos - Venezuela e Equador - e recuperando o controle na região. É
uma grande ofensiva estadunidense o que se vê desde o golpe de Honduras. Nas
declarações de seus governantes, o que fica claro é que a única legalidade possível
em Honduras é o não retorno de Zelaya. Pode até haver novas eleições, mas sem
Zelaya. Ora, isso é apoio explícito ao golpe.
Por conta destes novos movimentos no xadrez político a América Latina está em estado
de alerta. Os ataques contra os governos orientados ao socialismo vão recrudescer e
isso fica claro nas notícias dos jornais e na histeria dos jornalistas a soldo.
Basta ver como tratam a questão do Equador, os conflitos na Bolívia e as posições da
Venezuela.
A política imperialista dos Estados Unidos segue, portanto, tão dura
quanto sempre foi. A diferença é que agora quem a comanda é um jovem negro,
charmoso, bonito, sorridente e bom bailarino. Não é à toa que Luis Inácio, o
presidente brasileiro, o tenha convidado para uma pescaria no Pantanal. Tristemente,
nosso país está mais para capacho do que para território soberano, e certamente
ainda se prestará a sujos papéis neste jogo que recomeça.
* Jornalista