As áreas úmidas e a ecologia integral

Dia 2 de fevereiro é comemorado O Dia Mundial das Áreas Úmidas.

Por Juacy da Silva

Em 2 de fevereiro é “comemorado”, “celebrado” em 172 países, O Dia Mundial das Áreas Úmidas, sobre este tema precisamos refletir de forma mais crítica e profunda a cada ano. É importante destacar também que estamos em plena Década das Nações Unidas para a Restauração dos ecossistemas degradados, que vai de 2021 até 2030, e um desses ecossistemas que está em processo de degradação/destruição acelerada são as áreas úmidas.

Desde a aprovação da Convenção da ONU sobre as áreas úmidas em 1971, nesses últimos 53 anos foram destruídas, degradadas aproximadamente 35% de todas as áreas úmidas no mundo, a continuar este processo com certeza dentro de poucas décadas esses ecossistemas estarão extintos, com sérias consequências para o meio ambiente no planeta.

“As áreas úmidas têm a importância para os seres humanos porque elas fazem parte do ciclo da água – algo essencial para a manutenção da vida e da garantia da biodiversidade no planeta”. Cátia Nunes da Cunha, professora, doutora (Ph.D) e pesquisadora da Universidade Federal de Mato Grosso e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em áreas úmidas, do Centro de Pesquisa do Pantanal (CPP), que são parceiros da Wetlands International Brasil e Mupan – Mulheres em Ação no Pantanal e profunda conhecedora tanto do tema em geral quanto do Bioma Pantanal, em particular.

É ela (profa. Cátia) quem enfatiza a importância das áreas úmidas para a ecologia integral, tanto os aspectos socioambientais, quanto os econômicos e sociais, quando diz, em relação à importância das áreas úmidas, que “A torneira que você abre, o banho que toma, tudo entra no ciclo hidrológico e as áreas úmidas exercem um papel nisso. Elas são esponjas que absorvem a água da chuva, o que evita enxurradas e depois solta, por vias subterrâneas, alimenta os rios, os lençóis freáticos e que servem na captação de água às cidades, ao agronegócio. Não à toa que elas são frequentemente chamadas de “rins da terra”, pois auxiliam na regulação das águas e ainda ajudam a retardar os efeitos do aquecimento climático por serem capazes de absorver até 50 vezes mais carbono do que as florestas tropicais”.

Com certeza que foi esta ideia e preocupação com o futuro do planeta, antevendo a degradação dos biomas e ecossistemas que hoje estamos assistindo, a grande causa do aquecimento global e da mudança e crise climática que em 1971, ou seja, há 53 anos, antes mesmo da 1ª Conferência Mundial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano, que aconteceu em Estocolmo, Suécia, em 1972, que a ONU realizou a Conferência de que redundou na “Convenção de Ramsar” a convenção internacional sobre as áreas úmidas, em referência à esta cidade do Irã, onde foi realizada a conferência, dado base para a criação do DIA MUNDIAL DAS ÁREAS ÚMIDAS, a ser celebrada em 2 de fevereiro, anualmente.

Desde 1977, quando foi estabelecido oficialmente pela ONU, o Dia Mundial das Áreas Úmidas, passou a celebrado na grande maioria, mais de 172 países que passaram a fazer parte da referida Convenção Internacional, inclusive o Brasil.

Amazonia-rioEm 2021, através de Resolução da Assembleia Geral da ONU, todos os países tem sido, INSISTENTEMENTE, convidados a realizarem ações que motivem as pessoas, instituições públicas e também não governamentais, inclusive o empresariado, a zelarem mais pelas áreas úmidas e a despertarem a consciência ecológica, com destaque para a sustentabilidade e a mudanças de paradigmas no que concerne às relações do ser humano com a natureza em geral e com as áreas úmidas em particular.

Para marcar e uniformizar as celebrações/comemorações e manter um mesmo foco a nível mundial, em cada ano o DIA MUNDIAL DAS ÁREAS ÚMIDAS, tem um tema, em torno do qual devem girar essas ações.

No ano de 2015, quando alguns marcos ecológicos importantes aconteceram, como a publicação da Encíclica Laudato Si, pelo Papa Francisco; o estabelecimento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, pela ONU, em substituição e ampliação dos Objetivos do Milênio, o tema escolhido foi “Áreas úmidas para o nosso futuro”; em 2019 “ Zonas (áreas) úmidas e mudança climática”; 2020 “Áreas úmidas e biodiversidade”; 2021 “A importância das áreas úmidas para o futuro urbano sustentável”; 2022 “Agir pelas áreas úmidas é agir pela humanidade e pela natureza”; 2023 “ Restauração das áreas úmidas” e, neste ano de 2024, o tema é “As áreas úmidas e o bem estar humano”, com ênfase na questão da relação entre ecologia integral/meio ambiente e saúde humana.

No mundo existem milhares de áreas úmidas que, apesar de representarem apenas 6% da área terrestre do planeta, com 12,1 milhões de km2 ou seja, 1,21 bilhão de ha, abrigam e oferecem condições para a vida e reprodução de uma imensa biodiversidade, em torno de 40% de todas as espécies animais e vegetais, além de entre 650 e 700 milhões de habitantes dependerem das mesmas para a sua sobrevivência, incluindo como fontes de alimentação.

Cabe também destacar que as áreas úmidas prestam diversos “serviços ambientais”, para o equilíbrio e a vida no planeta, entre as quais podemos mencionar: 1) fornecimento de água para uso humano, animal, industrial e irrigação; 2) contribui para a filtragem e purificação da água e, assim, reduz a poluição dos mananciais; 3) contribui para a produção de alimentos; 4) ajuda a controlar as inundações; 5) ajuda a armazenar gases de efeito estufa e, indiretamente, contribui para combater a mudança/crise climática; 6) é importante para o equilíbrio ecológico e para a manutenção da biodiversidade; 7) contribui para a sustentabilidade e; 8) alimenta os aquíferos que são as grandes reservas de água subterrâneas.

O Brasil possui 27 áreas úmidas, com destaque para o Pantanal que abrange no Brasil os Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, além do Paraguai e da Bolívia, que é a maior área úmida do planeta, mas que, LAMENTAVELMENTE, está sendo degradado, destruído de uma forma acelerada há algumas décadas.

A degradação/destruição do Pantanal tem sido objeto de inúmeros estudos, pesquisas e reportagens especiais e, parece, tudo leva a crer que esta destruição aumenta a cada ano, tanto pelo desmatamento, pelas queimadas quanto pela poluição urbana, incluindo esgotos in natura e lixo urbano doméstico, industrial, hospitalar, rejeitos de agrotóxicos utilizados de forma sem controle, pesca predatória, assoreamento. Erosão, destruição de matas ciliares e também rejeitos de mercúrio oriundo de mineração e garimpos ilegais nas bacias e sub bacias dos principais rios que “abastecem”/formam o Pantanal, como os Rios Paraguai, Cuiabá, Vermelho/São Lourenço, Itiquira, Rio Verde, Miranda, Taquari, Bonito e outros mais.

Além da poluição urbana e demais aspectos mencionados, o Pantanal também está fadado a “secar” e acabar como uma grande planície em processo de desertificação resultado da construção de mais de 133 barragens, para instalação das famigeradas PCHs (pequenas centrais hidroelétricas), em todos os Rios e seus afluentes já mencionados.

Oxalá, não apenas neste 2 de fevereiro de 2024, quando estará sendo “comemorado”, “celebrado” mais um DIA MUNDIAL DAS ÁREAS ÚMIDAS, mas também ao longo de todos os dias e anos seguintes, possamos, não apenas refletir sobre toda esta degradação que está afetando a maior área úmida do planeta, mas também pressionar para que os organismos públicos, responsáveis pelas políticas econômicas e socioambientais implementem ações que mudem o rumo deste processo de destruição ambiental.

Finalizando, é importante que possamos entender uma exortação que o Papa Francisco, da mesma forma que cientistas, ambientalistas tem enfatizado de que, neste planeta, em nossa mãe natureza ou Casa Comum, tudo está interligado e que na origem de todos os problemas e desafios socioambientais, ecológicos está a ação humana, bastante irracional e criminosa, que prima pelo desrespeito ao equilíbrio que deve existir entre os sistemas produtivos, o consumo/consumismo e os limites da natureza. Enquanto isto não fizer parte do pensamento, das atitudes, ações e omissões tanto da população quanto dos organismos públicos e dos governantes, estaremos sempre “chorando em cima do leite derramado”.

Esta é uma herança maldita que as atuais gerações deverão ou irão deixar para as futuras gerações, deixando um planeta destruído e doente.

Ao longo de cada ano, inclusive deste 2024, temos vários momentos para refletirmos sobre importantes questões e desafios socioambientais e, em particular neste ano, quando estaremos elegendo prefeitos e vereadores de todos os municípios, é o momento de exigirmos dos mesmos, quando eleitos, independente dos partidos aos quais sejam filiados e das ideologias que defendam, que reflitam um pouco mais sobre tantos desafios socioambientais, inclusive a preservação e maiores cuidados com as áreas úmidas e transformem a choradeira em políticas e ações públicas que mudem o curso desta triste caminhada!

Juacy da Silva, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista e articulador da PEI Pastoral da Ecologia Integral. Email profjuacy@yahoo.com.br

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