No distrito de Faisalabad, locais de culto e casas cristãs foram devastados por uma multidão enfurecida, incitada por extremistas islâmicos. Centenas de pessoas viram-se forçadas a fugir. O presidente dos bispos paquistaneses, Dom Arsad: “Nossa gente não está segura. Uma investigação transparente sobre esta violência para restaurar a primazia da lei e da justiça".
Um episódio de suposta blasfêmia contra o profeta Maomé e a profanação de páginas do Alcorão atribuídas a um cristão, Raja Masih, provocaram uma onda de violência no Paquistão na quarta-feira, 16 de agosto, com ataques a igrejas e residências em Jaranwala, distrito de Faisalabad. Uma multidão instigada por extremistas atacou até seis igrejas e várias casas de cristãos.
Na ordenação do novo núncio, Parolin fala dos desafios do Paquistão
A recordar que, na homilia de ordenação episcopal do novo núncio no Paquistão, em Ondjiva (Angola) no dia 12 de agosto, dom Germano Penemote, o cardeal Pietro Parolin chamava a atenção para o fato de que o Paquistão é “um país com potencial considerável, mas que deve enfrentar difíceis desafios; um país de maioria muçulmana onde, para além das normas em vigor, nem sempre é fácil garantir o pleno respeito pelos direitos das minorias religiosas".
O cardeal secretário de Estado convidou o novo núncio a testemunhar aos cerca de um milhão e meio de fiéis católicos residentes no país asiático "a atenção do Papa e da Santa Sé para sua comunidade, para que, sentindo o forte vínculo com a Igreja universal, possam ser fortalecidos em sua fé e buscarem caminhos de diálogo com os fiéis do Islã e de outras religiões. Este diálogo é muito necessário se quisermos nos reconhecer como irmãos e irmãs, independentemente de nossas diferenças, e eliminar qualquer risco de manipulação da religião e qualquer inaceitável legitimação da violência”.
O estopim da violência
A simples descoberta de páginas do Alcorão no chão, acompanhadas de uma carta contendo comentários blasfemos e o nome de Raja Masih foi suficiente para desencadear a fúria e indignação da população local, desencadeando protestos em grande escala. A situação saiu do controle quando multidões passaram a atacar casas de cristãos e incendiar igrejas, entre as quais três igrejas presbiterianas, uma igreja católica, uma igreja Assembleia do Evangelho Pleno e uma igreja do Exército de Salvação foram afetadas.
Centenas de cristãos de Jaranwala foram forçados a fugir com medo de suas casas que foram invadidas. Yassir Bhatti, um cristão de 31 anos, disse à agência AFP: “Eles quebraram as janelas e portas e levaram geladeiras, sofás, cadeiras e outros utensílios domésticos para empilhá-los na frente da igreja e queimá-los. Eles também queimaram e profanaram Bíblias, eles foram implacáveis."
O pastor Imran Javed, coordenador do Voice for Justice, testemunhou o ataque. Descrevendo o ambiente como tenso, ele contou à Asia News que a tensão cresceu ainda mais quando multidões se reuniram do lado de fora das mesquitas locais, exigindo ação rápida em retaliação à suposta profanação do Alcorão e do profeta Maomé.
Em resposta à violência crescente, os comerciantes fecharam suas lojas e os manifestantes bloquearam alguns cruzamentos importantes. Os policiais tentaram restaurar a ordem e garantir a segurança. O comandante, ladeado pelo mufti Muhammad Younis Rizvi, dirigiu-se à multidão, apelando à moderação e assegurando aos manifestantes que medidas imediatas devem ser tomadas contra o acusado. Apesar desses esforços, no entanto, algumas facções continuaram a pressionar por ações extremas.
Presidente do episcopado: lei e justiça devem prevalecer
O presidente da Conferência Episcopal do Paquistão, o arcebispo de Islamabad-Rawalpindi dom Joseph Arsad, condenou veementemente o ocorrido em Jaranwala, apelando ao governo de Punjab para tomar medidas imediatas contra os perpetradores dos ataques. “Estes incidentes – escreveu em uma nota divulgada pela diocese – abrem caminho para a insegurança das minorias que vivem no Paquistão. Nossos locais de culto e nosso povo não estão seguros. Há uma investigação transparente sobre este trágico incidente para que a primazia da lei e da justiça seja restabelecida e uma sociedade melhor seja construída em harmonia e respeito às religiões”.
Outras reações
O primeiro-ministro interino Anwar ul Haq Kakar - encarregado de conduzir o Paquistão às eleições - respondeu pedindo uma ação rápida contra os responsáveis pela violência.
Pe. Khalid Rashid Asi, diretor da Comissão de Justiça e Paz da Diocese de Faisalabad, pediu a intervenção imediata da polícia e a salvaguarda das residências e igrejas cristãs para evitar maiores danos e desordens. “O incidente de Jaranwala - declarou à AsiaNews - mostra a extrema necessidade de lidar com a escalada das tensões. Estou com o coração partido: nos últimos dias, expressamos nossas preocupações e pedimos ao governo que protegesse as minorias religiosas. Passou apenas um dia desde o Dia da Independência e estamos testemunhando um incidente tão brutal. Esta é a verdadeira razão pela qual o nosso país não se dá bem com a comunidade internacional e enfrenta múltiplos problemas políticos e financeiros”.
Instrumentalização das leis da blasfêmia
Joseph Jansen, presidente da Voice for Justice, condenou veementemente os violentos ataques a igrejas e casas de cristãos, destacando a importância fundamental de investigações minuciosas antes de qualquer ação extrajudicial. A crescente tendência à intolerância religiosa e ao preconceito leva cada vez mais no Paquistão a acusações infundadas e perseguições contra grupos religiosos minoritários.
Também o presidente da Minority Alliance Pakistan condenou com veemência os ataques. As notórias leis de blasfêmia do Paquistão, que prevêem pena de morte ou prisão perpétua por blasfêmia contra o profeta Maomé, levam a perseguições direcionadas contra os cristãos, que muitas vezes são usadas para resolver vinganças pessoais, como também tem alertado a Comissão Independente de Direitos Humanos no Paquistão. E tais incidentes violentos, estão aumentando há vários anos.
Os cristãos, que representam cerca de 2% da população, ocupam um dos escalões mais baixos da sociedade paquistanesa.