O ex-presidente tem toda uma história ligada às instituições católicas.
Por Edson Luiz Sampel
Quando do conclave que elegeu Bento XVI em 2005, o falecido cardeal do Rio de Janeiro, dom Eusébio Scheid, disse à imprensa que Lula não era católico, mas caótico. Imediatamente, outro cardeal, dom Cláudio Hummes, recentemente falecido, contestou o colega e afirmou que Lula era católico sim, a seu modo.
A frase “a seu modo” é jargão técnico do Concílio Vaticano II e, em suma, exprime as inumeráveis idiossincrasias do devir humano. Deus sabe que o homem é lento para corresponder rápida e integralmente ao plano divino e, por conseguinte, Deus aceita as migalhas e enaltece-as, a fim de animar o viajor deste mundo. Em outras palavras, como sempre reitera o papa Francisco: Deus é misericordioso!
O ex-presidente tem toda uma história ligada às instituições católicas. A propósito, um dos trampolins da vida pública de Lula foram exatamente as comunidades eclesiais de base. A saudável teologia da libertação (refiro-me à vertente respaldada por São João Paulo II, baseada na doutrina social da Igreja) decerto inspirou Lula e seus sequazes. Houve lapsos e tergiversações, porém, o essencial continua de pé.
A doutrina social da Igreja Católica propugna a erradicação da pobreza, a reforma agrária e tantas outras providências pracejadas por Lula e pelo PT. É lamentável que a direita não fale nessas coisas; trata-se de conceitos absolutamente ortodoxos.
Lula, católico a seu modo, casou-se sacramentalmente (casamento religioso ou canônico), celebrando com a socióloga Janja um matrimônio válido, malgrado as invencionices de detratores invejosos e insipientes. O único elemento essencial para a validade do sétimo sacramento é o consentimento hígido dos cônjuges; o resto são acidentes, inclusive a forma canônica.
Há, ainda, outro fato, pouco conhecido, que conecta Lula ao catolicismo e nos deve tornar gratos ao ex-presidente. O tão importante pacto diplomático ultimado entre o Brasil e a Santa Sé (Acordo Brasil-Santa Sé), que virou o Decreto Federal 7.107/2010, só veio a lume por vontade entusiástica e vigorosa do ex-presidente. Se não, vejamos. Segundo o testemunho insuspeito de certo eclesiástico, presente a uma reunião com o presidente da república Luís Inácio Lula da Silva ocorrida em 2008, da qual participaram vários bispos e ministros de Estado, o clima era totalmente desfavorável à celebração de um acordo diplomático entre o Brasil e a Igreja Católica. Os ministros falavam e se posicionavam contrariamente à avença, inclusive o titular da pasta das Relações Exteriores. Quieto, o presidente ouvia os diversos argumentos de seus ministros. Até que, em dado momento, bateu energicamente na mesa e gritou: eu quero o acordo! Em seguida, explicou que, de certo modo, tinha uma dívida com a Igreja Católica.
Deveras, os antecessores de Lula, todos, sem exceção, engavetaram o projeto da maravilhosa avença ora em vigor.
Os pobres são os preferidos de Jesus (Lc 4, 18). Parece que são também os preferidos de Lula que, cristãmente, soergueu-os no passado e se propõe agora a resgatar-lhes a dignidade de pessoas criadas à imagem e semelhança de Deus, as quais, entre tantos direitos, têm o direito à comida, à refeição três vezes ao dia.