Teologia da Prosperidade

Para entender o envolvimento de pastores neopentecostais nos supostos repasses irregulares de verbas do Ministério da Educação é preciso entender a lógica mercantil e perversa da Teologia da Prosperidade.

Por Jaime C. Patias*

O neopentecostalismo no Brasil e suas ramificações deriva do movimento de “confissão positiva” dos Estados Unidos, através de líderes como Essek William Kenyon e Kenneth Hagin. A Teologia da Prosperidade, também conhecida como “evangelho da saúde e prosperidade”, “palavra da fé” ou “movimento da fé”, tem suas raízes na “confissão positiva” que significa, trazer à existência o que declaramos verbalmente, uma vez que a fé é uma confissão.

O sistema capitalista neoliberal é um terreno fecundo para o mercado da fé e ofertas religiosas. O esquema funciona em moldes análogos aos de um mercado com disputa por mais resultado e oportunidades, mais eficiência e sofisticação em propaganda e marketing. Salvo exceções, as ações são para ganhar mais seguidores-contribuintes-consumidores de produtos da fé.

Esta é a principal característica da Teologia da Prosperidade que se baseia na ideia de que Deus quer que todo o seu povo desfrute de prosperidade. E se o crente tiver fé suficiente para reclamar o que lhe deveria pertencer, e demonstrar essa fé com doações generosas a Deus, Ele as devolverá com juros. E já que “fazer doações a Deus” é interpretado como fazê-las à igreja, a Teologia da Prosperidade se converte em uma ideologia para criar igrejas com altos investimentos nos meios de comunicação e enriquecimento fácil de seus líderes.

Essa teologia mistura o desejo de prosperidade com a ideia de empreendedorismo que encontra grande aceitação no sistema neoliberal. Além disso, não gera processos de transformação da sociedade, nem questiona o sistema econômico, social e político que produz exclusão, degradação socioambiental e o sofrimento, quebra empresas e cria desemprego. Pelo contrário, utiliza-se da desgraça e do caos para, em nome da fé na prosperidade, atrair adeptos-contribuintes.

Contudo, não devemos generalizar. A Teologia da Prosperidade, limita-se a determinados grupos neopentecostais e é objeto de crítica de alguns setores evangélicos históricos que a consideram teologicamente incorreta, moralmente condenável e psicologicamente prejudicial.

Além de apresentar ensinos questionáveis sobre a fé, a oração e as prioridades da vida cristã, e de relativizar a importância das Escrituras por meio de novas revelações, ela apresenta outras interpretações sobre Deus, Jesus Cristo, o ser humano e a salvação. Distorce o propósito do ato de doar.

Na Bíblia, fazer uma oferta é uma atitude de entrega, de gratidão, um ato de adoração, e não um investimento para obter retorno. Deus abençoa gratuitamente e não é preciso investir para se ter o direito a bênçãos. (Sobre esse tema, ver Ricardo Gondim. O Evangelho da Nova Era: uma análise e refutação bíblica da chamada Teologia da Prosperidade. São Paulo: Abba Press, 1993).
Percebe-se que essa estratégia funciona para fazer uma igreja crescer, mas não para mantê-la a longo prazo. Por isso ela será obrigada a mudar de rumo por exigência do próprio mercado.

Enquanto a Teologia da Libertação de inspiração bíblica representa uma força profética que questiona o sistema e inspira processos de transformação, a Teologia da Prosperidade alinha-se ao sistema mercantilista neoliberal. Defende e legitima valores capitalistas (riqueza, poder e sucesso) e oferece às pessoas o que elas ambicionam, e não o que realmente necessitam aos olhos de Deus. Fica fácil perceber qual é o principal objetivo das pseudos igrejas que na verdade são empresas de fachada lideradas por “empresários da fé” também chamados de “lobos” vestidos de “pastores”.

O crescimento da participação desse grupo religioso na política partidária foi influenciado pela sede de riqueza, poder e sucesso e também pelo fato de que os principais partidos, a cada pleito, passaram a estabelecer alianças para cooptar o apoio eleitoral dos evangélicos neopentecostais. Hoje temos uma disputa pelo voto dos “evangélicos”. Isso tem contribuído para reforçar a instrumentalização mútua entre religião e política e para legitimar e estimular o ativismo político-partidário de grupos religiosos e a ocupação religiosa da esfera pública. A oferta de recursos públicos atrai também “religiosos” inescrupulosos.

No atual cenário, grupos religiosos intensificaram seu ativismo político, mercadológico e midiático para ampliar a ocupação religiosa do espaço público, influenciar a esfera pública e estatal, promover sua visão da moralidade e tentar estendê-la ao conjunto da sociedade por meio da participação política partidária e do lobby político.

Esse cenário faz parte do projeto de poder dos grupos neopentecostais. Criaram partidos políticos, elegeram vereadores, prefeitos, deputados, senadores, governadores e chegaram à presidência por meio do apoio da “Bancada Evangélica” conhecida também como “Bancada da Bíblia”. Já temos dois ministros do STF dessa linha. É uma espécie de “sistema religioso” paralelo entranhado no meio político e instâncias de poder em todas as esferas onde circulam verbas milionárias.

Dinheiro fácil tem o cheiro daquilo que Basílio de Cesareia chamava “o esterco do diabo”, onde reina a ambição desenfreada e a corrupção. Com isso se inverte a lógica do próprio Evangelho. Não vale mais buscar primeiro o Reino de Deus e a sua justiça, conforme ensina Jesus (Mt 6, 33), para buscar acima de tudo e a todo o custo as demais coisas: riqueza, poder e sucesso.

*Jaime C. Patias, Conselheiro Geral IMC, é licenciado em Filosofia pela PUC-PR, bacharel em Teologia pela Universidade de Louvania, Bélgica, e mestre em comunicação pela Faculdade Cásper Líbero (SP).

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