Ka Ubanoko: migrantes ganham novo prazo para desocupar área


Comunidade Ka Ubanoko conta com 850 migrantes venezuelanos entre os quais 132 famílias indígenas. Foto: Leany Torres

O Ministério Público Federal (MPF) e a Operação Acolhida em Boa Vista, Roraima, definiram que os 850 imigrantes venezuelanos pertencentes à comunidade Ka Ubanoko, localizada no bairro Jóquei Clube, zona Oeste de Boa Vista, antigo Clube do Trabalhador, deixem o local apenas em dezembro deste ano.

Por Jaime C. Patias *

Em plena pandemia da Convid-19, a Operação Acolhida havia comunicado, no dia 17 de setembro, que a comunidade formada por indígenas das etnias warao, pemon, eñepa e kariña, e por não indígenas deveria deixar o local até o dia 28 de outubro. As lideranças do Ka Ubanoko (dormitório comum na língua warao), comunidade criada em março de 2019, não aceitam uma decisão unilateral e querem que seja respeitado o seu direito de uma “consulta livre, prévia e informada”.

A comunidade discute propostas para o futuro do Ka Ubanoko. Foto: Leany Torres

Leany Torres, liderança warao afirma que esse novo prazo do mês de dezembro também não foi uma decisão tomada em diálogo com a comunidade Ka Ubanoko e reafirma a importância de se decidir o futuro em conjunto com os moradores que vivem no espaço.

Ela explica que, no dia 1º de outubro, foram comunicados pelo general Antônio Manuel de Barros, da Força Tarefa do Exército brasileiro, coordenador da Operação Acolhida, sobre o novo prazo. A decisão, mais uma vez, veio pronta. Segundo Leany, a população indígena está construindo várias propostas alternativas e com essa nova data, “temos a possibilidade de abrir caminhos de novas propostas. Nós e as instituições necessitamos mais tempo para poder organizar melhor. Por agora gostaríamos de ir para um terreno que permita desenvolver nossas atividades segundo nossos usos e costumes. Promover a educação, a saúde, empreendimentos, cultura e produção, entre outros, para nos integrarmos à sociedade brasileira. O Abrigo não é a solução, pois queremos produzir e nos integrar à sociedade, por isso um terreno”, afirma.

Pensando na possibilidade que a Operação Acolhida acabe, outra proposta que eles não descartam é a interiorização para os que desejam. Isso por que, muitos indígenas, principalmente os jovens, já viviam em contato com os não indígenas e querem produzir e viver com suas famílias do grupo indígena.

Caso tiverem que ir para um Abrigo, os indígenas não querem o modelo de Pintolândia ou o de Pacaraima, mas que a administração seja feita em conjunto. “A experiência vivida na comunidade Ka Ubanoko com a coordenação dos caciques (aidamos) deve servir de modelo. Queremos que os ‘aidamos’, juntos com um administrador, coordenem a gestão do Abrigo com informações e decisões sobre o orçamento para garantir a educação, saúde e outras questões importantes. Que seja um Abrigo adaptado culturalmente com nosso modo de viver onde sejamos protagonistas na gestão interna a partir de um diagnóstico comunitário”. Além da administração, os indígenas sugerem também melhorar a estrutura, como o plantio de árvores.

A comunidade discute propostas para o futuro do Ka Ubanoko. Foto: Leany Torres

Segundo Leany, o ambiente agora está mais tranquilo e eles não sentem aquela pressão psicológica que vinham sentindo quando receberam a notícia do despejo. Assim continuarão com as atividades da comunidade e já planejam celebrar o Dia da Resistência Indígena (em 12 de outubro), realizar um encontro com indígenas do Brasil sobre o tema da saúde e na parte religiosa, celebrar os batismos das crianças. Devem participar também da elaboração do plano estratégico para 2021 com o Alto Comissariados das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).

Abrigo Jardim Floresta para onde desejam levar os moradores do Ka Ubanoko. Foto: Izaías Nascimento

Para o Procurador da República, Alisson Marugal, “o que preocupa o MPF é a inexistência de planos que preveja a consulta a população indígena e que atenda as diversas necessidades dessa comunidade”, disse.

De acordo com a Operação Acolhida, a transferência que estava programada não se tratava de ordem de despejos aos indígenas, mas do cumprimento do plano emergencial para ocupações espontâneas, elaborado em março, que visa desativar as ocupações na capital.

Ainda segundo a Acolhida, além da proposta de levar os imigrantes a abrigos há a possibilidade de interiorização para os não indígenas ou apoio com auxilio aluguel.

* Jaime C. Patias, com informações da comunidade Ka Ubanoko.

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