Maneira de ver a religião como amuleto da sorte ou objetos sagrados é defeituosa e caricata.
Por Fernando Altemeyer Junior*
Certas falas de católicos e da Canção Nova me assustam. Falam de amuletos e proteção como se Deus escolhesse uns e matasse aos outros de forma sádica ou como algo inevitável da roda cíclica da morte. Afirmo convicto que não é Deus quem permita ou não as mortes como um Zeus raivoso ou um Odin cruel. Isso se assemelha mais a uma roleta russa e não as atitudes e palavras do Deus Pai de Jesus.
Essa maneira de ver a religião como amuleto da sorte, ou posse de objetos sagrados que me salvassem do mal que todos estamos submetidos é tremendamente defeituosa e caricata. Falsifica Deus e o faz ser um agente do mal. A oração não é vacina nem é antídoto. Se fosse assim a dezena de padres mortos em Bolonha estaria viva! Fé é a força da esperança de quem crê e confia sem resultados aparentes. Pessoas de fé também morrem e às vezes mais que os incrédulos. Fé não salva uns e mata outros, protegendo uns e discriminando outros. Se fosse assim estaríamos dizendo que Deus detesta a Itália e ama o Brasil.
Isso tem outro nome: é sistema econômico opressor. Quem seleciona mortes é a eugenia feita por pessoas humanas e poderosos ricos. Deus nos ama por igual, todos e cada um, crente ou ateu, mesmo se não rezássemos nem um pai-nosso. Deus que é Pai perdoa antes que abramos a nossa boca. Atenção para esse tipo de religião mágica de barganha e privilégios. Meu pai, o Sr. Fernando, morreu dolorosamente e eu rezei muito. Não posso culpar Deus nem os médicos.
Preciso entrar no mistério da morte. É um enigma. Permitir ou suspender as mortes do corona será tarefa humana. Deus está do nosso lado nessa batalha e chora por cada um dos mortos até hoje. Ele não se alegra nem seleciona os vivos e antecipa os mortos. Religião de Jesus não é aquela que faz barganhas. Quem assim pensa são os amigos falsos de Jó, que o condenam por pensar em deuses feiticeiros e cruéis. Deus é distinto de bolsa de valores. Fé é graça e aposta. Não há certezas, só amor convicto. Sei em quem confio. Mesmo se eu padecer duramente, nenhum mal temerei. Deus é meu cajado."