Os cristãos tem o dever de colocar em prática os cuidados para evitar a degradação e combater os crimes ambientais.
Por Juacy da Silva*
Logo no início da Bíblia, no capítulo primeiro de do Livro de Gênesis, versículo primeiro está escrito de forma clara e objetiva: “No princípio Deus criou os céus e a terra” e nos seguintes são detalhadas as etapas da criação, incluindo a criação do primeiro homem e da primeira mulher, Adão e Eva.
Diz também a Bíblia, livro considerado sagrado para todos os cristãos, católicos e evangélicos, que este primeiro casal foi colocado no Jardim do Éden e que tudo era perfeito, ou seja, havia um equilíbrio entre todas as obras criadas por Deus.
No Livro dos Salmos, capítulo 24, versículos 1 e 2, podemos ler outra assertiva a respeito das obras de criação de Deus, que é dito “ Do Senhor é a terra e tudo o que nela existe, o mundo e os que nele vivem; pois foi Ele (Deus , o Senhor) que a fundou (criou a terra) sobre os mares e as águas”.
Esta mesma ideia é novamente repetida na primeira Carta de São Paulo aos Coríntios, capítulo 10:26 quando diz “Porque do Senhor é a terra e toda a sua plenitude”, ou seja, todas as formas de vida animal e vegetal, enfim, os ecossistemas e toda a biodiversidade.
Podemos notar ainda esta preocupação em reforçar o princípio divino relacionado com o meio ambiente no Livro dos Atos dos Apóstolos 17:24 quando diz “ O Deus que criou o universo e tudo o que nele existe é o Senhor dos céus e da terra”.
Há praticamente cinco anos quando do lançamento da Encíclica Laudato Si, a chamada Encíclica Verde, o Papa Francisco tem insistido para a responsabilidade dos cristãos e também não cristãos no que concerne a preservação, conservação, enfim, nos cuidados que devemos ter em relação à Casa Comum, a mãe terra, o Planeta em que vivemos.
Esta responsabilidade é muito maior para os cristãos tendo em vista que os mesmos tem o dever de colocar em prática os cuidados para evitar a degradação ambiental, evitar e combater os crimes ambientais, pois quem destrói o meio ambiente, que contribui para o aumento da poluição, que provoca as mudanças climáticas está atentando contra as obras da criação de Deus e isto não deixa de ser um pecado, o chamado “pecado ecológico”.
Este aspecto tem sido muito discutido pelo Papa Francisco e o mesmo, tanto antes quanto durante e agora após o Sínodo dos Bispoas para a Pan Amazônia, vem exortando para o que tem denominado de “pecado ecológico”, “conversão ecológica” e tem dito que esses dois conceitos podem, em breve fazer parte da catequese, podendo mudar inclusive parte da doutrina da Igreja.
Se formos mais a fundo neste tema, vamos encontrar estudos e debates bíblicos e teológicos entre diversas igrejas evangélicas e até mesmo entre os muçulmanos, com exortações do Profeta Maomé, sobre a importância de se respeitar o meio ambiente.
Os cristãos representavam em 2015 em torno de 31,2% da população mundial, contando com 2,3 bilhões de habitantes, com expressiva maioria tanto na Europa quanto nas Américas; seguidos dos muçulmanos com 1,8 bilhões (24,1%); vindo depois os hindus com 1,1 bilhão de pessoas ou 15,1% da população mundial.
Em decorrência desses números percebemos que os cristãos também foram os maiores poluidores do planeta por séculos, pois a revolução industrial, o surgimento e desenvolvimento do capitalismo teve como base a Europa, a América do Norte e também parte na América Latina.
Outro país que também promoveu a revolução industrial e o capitalismo, fora da órbita do cristianismo foi o Japão e só tardiamente, a partir de meados do século passado é que a China e a Índia passaram a ter uma economia pujante e em crescimento acelerado, países de minorias cristã.
Os 20 países que mais poluem o planeta, principalmente quando se refere à emissão de gases de efeito estufa, oriundos dos setores industriais, residências, sistema de transporte e desmatamento, são responsáveis por mais de 82% do total da poluição mundial e que estão provocando as mudanças climáticas que tantos males vem causando e causarão à vida na terra.
Desses 20 países, 13 tem a grande maioria de sua população que se define como cristãos, ou seja, são e estão conscientes de que seu estilo de vida e suas ações estão destruindo as obras da criação divina e não estão respeitando os princípios bíblicos.
Isto se deve, talvez pela contradição profunda que existe entre uma fé de fachada, alienadora e por práticas definidas pelo materialismo, pelo consumismo, pelo desperdício dos recursos naturais, pela ganância em associação com a busca do lucro econômico e financeiro, o que pode ser chamada de “deus dinheiro”, pouco se importando com o passivo ambiental e com a precarização das condições de vida de seus semelhantes, principalmente as camadas mais excluídas da sociedade que, com certeza, também são filhos e filhas de Deus, segundo a fé cristã.
É neste contexto que devemos entender as exortações e reflexões do Papa Francisco, líder do maior grupo religioso entre os cristãos, que são os católicos nada menos do que 1,3 bilhões de fiéis mundo afora, a quem, tais exortações devem ser analisadas para perceber a responsabilidade que tanto cristãos em geral quanto católicos em particular precisam assumir no combate à degradação ambiental.
Este combate deve ser feito em cada localidade, em cada paroquia, comunidade, em cada igreja, templo, escola de confissão católica ou evangélica, através de projetos e ações concretas, arregimentando desde crianças, adolescentes, jovens , população adulta e também idosos, ou seja, se os cristãos se irmanassem em um verdadeiro mutirão permanente na defesa do meio ambiente, com a visão do que o Papa Francisco denomina da Ecologia Integral, com certeza podemos mudar o mundo, restaurar, se não o Jardim do Éden, como descrito em Gênesis, mas pelo menos em localidades mais aprazíveis e menos poluídas para vivermos.
No Brasil, por exemplo, existem mais de 11 mil paroquias e mais de 120 mil comunidades paroquiais, da Igreja Católica e mais de 50 mil templos evangélicos, todas essas localidades congregam centenas e as vezes milhares de pessoas, quase que diariamente.
Ora, se os cristãos devotassem um pouco mais de atenção e ações articuladas, independente de filiação a esta ou aquela igreja, com certeza, seriam milhões de pessoas em condições de atuarem efetivamente na defesa do meio ambiente, desde projetos de educação ambiental, reciclagem de lixo, arborização, reflorestamento, agricultura familiar, agricultura urbana, hortas domésticas, comunitárias, escolares, limpeza etc., além de uma maior participação no que concerne à definição de políticas públicas, planos e programas ambientais em todos os níveis.
Finalizando, apenas um lembrete e sugestão para a leitura da passagem contida no Livro de Apocalipse 11:18, onde é descrito que é chegado “o tempo de destruíres os que destroem a terra”, esta será a penalidade para quem não respeita as obras da crianção divina, aqueles que destroem impiedosamente o meio ambiente. É neste sentido que para o Papa Francisco quem destrói a natureza, o meio ambiente e não respeita a criação de Deus está cometendo um pecado.
Vamos refletir um pouco mais neste binômio: fé e meio ambiente; qual o papel dos cristãos nos cuidados com a natureza/meio ambiente e a nossa responsabilidade ética, como cristãos , em relação `as futuras gerações?
Esses temas deveriam fazer parte dos sermões, das homilias, das ações pastorais, dos debates teológicos da Igreja Católica e também das Igrejas Evangélicas.
Concluindo, gostaria de deixar uma exortação contida também na Bíblia Sagrada, no Livro de Tiago 2:17 onde é dito de forma clara: “Assim também, a fé, se não tiver as obras, é, em si mesma morta”. Não basta discursos, debates, estudos sobre a destruição do meio ambiente, orações pedindo a Deus para fazer chover ou parar de chover, precisamos agir, enquanto o grande desastre ambiental não chegue e possa representar em sentido figurado, o que no Livro do Apocalipse é definido como o “Armagedon”, e também a restauração do que é denominado de “um novo céu e uma nova terra”.
Diversos cientistas através de seus estudos estão nos alertando, bem como governantes de todos os países, sobre a iminência, os riscos e consequências do que tem sido considerado “o dia seguinte”, ou seja, as catástrofes naturais, provocadas pelas ações humanas, longe de serem um castigo divino, decorrem das ações humanas que continuam destruindo o meio ambiente e colocando em risco o equilíbrio dos ecossistemas.
Todos temos responsabilidades diante dessas ameaças, principalmente os cristãos que professam uma fé que atesta que o planeta terra e, enfim , todo o universo são obras divinas e foram criadas por Deus. Mas parece que existe um grande fosso entre esta fé e as ações e omissões desses que se dizem cristãos.
Pense nisso caro leitor, reflita sobre este tema de forma mais profunda, com uma mentalidade crítica e criadora. Não se omita ante a destruição do meio ambiente e do planeta terra. Aqui é a nossa “casa comum”, onde vivemos! A omissão também é um pecado!