Governo Bolsonaro continua claudicando

Parece que o presidente e seus filhos gostam muito mais das redes sociais do que do diálogo e da atuação política mais direta.

Por Juacy da Silva*

Primeiro devemos identificar os sinônimos do verbo claudicar que, segundo o dicionário da língua portuguesa, significa capengar, errar, falhar, coxear, mancar, manquejar e afrouxar. Dito isto, podemos, sem sombra de dúvida entender como age o governo Bolsonaro, tendo como parâmetro as formas de pensar, sentir e agir do Presidente da República.

Oriundo das fileiras do Exército Brasileiro, onde a hierarquia, a disciplina e a obediência são fundamentais, segundo a máxima de que “manda quem pode e obedece quem tem juízo”, foi nesta instituição centenária onde Bolsonaro chegou no máximo a patente de capitão e não teve a oportunidade de burilar-se em cursos mais graduados como da ECEME – Escola de Comando e Estado Maior do Exército, requisito básico para atingir a mais alta patente na Força Terrestre, que é o generalato de 4 estrelas, com certeza teve uma grande lacuna em sua formação intelectual, militar e capacidade de formulação estratégica. Apesar dessas limitações, como Presidente, ele é hoje o Comandante supremo das Forças Armadas Brasileiras.

Deixando as fileiras do Exército, adentrou na política e por 28 anos foi eleito e reeleito deputado federal pelo Rio de Janeiro, tendo passado por nada menos do que sete partidos, sendo que seu nicho político para não dizer curral eleitoral sempre foi a chamada “família militar” e alguns setores que vicejam ao redor dos militares.

Portanto, não deve causar espécie que durante quase três décadas no Parlamento Nacional jamais se destacou na defesa de grandes causas nacionais, sociais, políticas, econômicas ou culturais, ou seja, foi um parlamentar integrante do chamado “baixo claro”, sem muito expressão ou quase apagado aos olhos da mídia e da opinião pública.

Por uma obra que ele chama de destino ou vontade divina e com uma ajudazinha da Lava Jato ou República de Curitiba, como sobejamente veiculado pelo site intercept Brasil e outros veículos de comunicação, foi possível implodir com a candidatura de LULA, até então disparado na preferência dos eleitores e, graças à demonização do PT e de seu líder maior, o caminho para que Bolsonaro pudesse aglutinar as forças de direita e boa parte de centro que sempre votaram nos candidatos do PSDB, MDB e DEM, a vitória, se bem que em segundo turno, caiu no colo do capitão Bolsonaro. É bom lembrar também que houve uma “ajudazinha’ por parte de Ciro Gomes, que integrando o PDT, considerado de esquerda, o mesmo colocou muito mais sua metralhadora verbal contra Lula, o PT e Haddad do que contra Bolsonaro.

Na Presidência, Bolsonaro parece que não consegue dialogar nem com seu então partido, tanto é verdade que se desfiliou do PSL e tenta fundar um novo partido, para ter como seu e de seus filhos. Não consegue também um bom dialogo com sua base de apoio no Congresso Nacional e nem com tantos outros setores sociais, religiosos, culturais e políticos do país. Sua forma intempestiva ou as vezes até usando palavreado chulo o coloca sempre como um brigão, um estopim curto, o único dono da verdade, vale dizer, reforça os traços de uma personalidade autoritária, um risco para qualquer regime democrático.

Parece que o Presidente e seus filhos gostam muito mais das redes sociais do que do diálogo e da atuação política mais direta, prova disso foi o esgarçamento de suas relações com o oitavo partido a que esteve filiado, o PSL, que, na verdade funcionou como uma mera sigla de aluguel, para viabilizar sua candidatura a Presidente.

Outro aspecto é sua forma precipitada para apresentar suas “verdades”, utilizando muitas vezes de meias verdades ou até acusações sem provas, o que lhe tem gerado certo desgaste junto a diversos setores, uma vez que suas mensagens ou narrativas como ultimamente tem estado na moda, afetados por “fake news” ou forma um tanto insultuosas de se relacionar a outros poderes, como no caso do vídeo onde aparece um leão, que seria o próprio Bolsonaro, atacado por hienas, que seriam instituições, entre as quais o próprio STF, o que não deixa de ser um desrespeito e falta de postura de um Presidente da República em relação a outros poderes.

bolsonaro-armasDiante do clima caótico e do nível de corrupção que existia em nosso pais ao final do Governo Temer e que ainda persiste nos dias atuais e do elevado nível de violência que também amedrontava e ainda amedronta a população brasileira , das elevadas taxas de desemprego, baixo desempenho da economia, enfim, de um caldo de cultura muito propício ao surgimento de salvadores da pátria, que se dirigem e se comunicam diretamente com o povo, sem a necessidade da intermediação dos partidos políticos, é fácil perceber que as figuras carismáticas e autoritárias ganham notoriedade.

Foi isto que aconteceu com o “mito”, um quase semideus na mente de seus seguidores, a grande maioria fanatizada e em busca de um milagre e um Messias que possam salvar nosso país. Esta seria uma vontade divina. Deus para esses fanáticos/lunáticos toma partido nas disputas ideológicas e políticas mundanas. Basta ler nas entrelinhas o slogan “Brasil acima de tudo e Deus acima de todos”. Hitler e Mussolini, Salazar, Stroesner, Pinochet e tantos outros ditadores mundo afora e no Brasil, sempre associaram religião e política.

Todavia, à medida que o tempo passa e com tantos problemas, desafios não equacionados e o desencanto da população, este endeusamento vai perdendo forças, boa parte de seus seguidores, milhões de eleitores que votaram em Bolsonaro começam a perceber que estão diante de um “deus” com pés de barro, que a cada dia perde parte de seus seguidores, nas classes Ae B e até mesmo no meio evangélico, seu maior reduto eleitoral fogem deste rebanho, como “o diabo foge da cruz”, como é dito no adágio popular.

Ao longo deste quase um ano de governo todas as pesquisas, dos mais diversos institutos de sondagem da opinião pública, tem mostrado que o prestígio e avaliação tanto do Governo Bolsonaro quanto do Presidente da República tem caído bastante.

Comparando-se este mesmo período de governo, praticamente final do primeiro ano, Bolsonaro tem sido avaliado pior do que praticamente todos os presidentes que os antecederam, desde Sarney até Temer, com exceção deste último e de Collor.

O resumo de todas essas pesquisas indicam, por exemplo, que avaliação positiva do Governo Bolsonaro, soma de quem menciona que o desempenho é ótimo e bom caiu de 49% em janeiro para 34% no final de outubro, e os que avaliam o governo como ruim ou péssimo saltou de 11% em janeiro para 38% no mesmo período.

A mais recente pesquisa do Instituto Quest, relativa ao mês de novembro último indica que 36% da população avaliam que o país esta piorando e apenas para 32% esta melhorando e 28% que o Brasil continua no mesmo marasmo, estagnado.

Bolsonaro, nesta última pesquisa tem sido avaliado pior do que governadores e prefeitos. O Presidente conseguiu a marca de 39% de ruim e péssimo. Os governadores 29% e os Prefeitos 33% neste mesmo quesito.

Na mesma pesquisa apenas 26% dos entrevistados avaliam o governo Bolsonaro como ótimo e bom , enquanto 36% avaliam como ruim e péssimo. Até mesmo quando o assunto é combate `a corrupção, o terceiro carro-chefe da campanha, ao lado do combate à violência e da estagnação/recessão econômica, para 36% da população a atuação do Governo nesta área tem sido positiva, enquanto para 38% tem sido negativa e para 22% apenas regular. Para 40% das mulheres esta atuação tem piorado e para 27% melhorando.

Diante de uma indagação se a ação do Governo Bolsonaro tem contribuído para que o país esteja melhorando ou piorando, em diversos segmentos e setores populacionais e geográficos a avaliação tem sido muito mais negativa do que positiva.

Por exemplo, entre os jovens de 16 a 24 anos, enquanto 41% afirmam que a situação está piorando, apenas 23% tem opinião de que esteja melhorando e a mesma tendência é observada na faixa etária entre 25 a 34 anos, onde a avaliação negativa é de 38% e a positiva 30%.

Para 43% dos integrantes das classes A e B, as camadas mais abastadas da população, formadoras de opinião e que voltaram majoritariamente em Bolsonaro no segundo turno, a situação está piorando e para apenas 35% está melhorando. No Nordeste, onde Bolsonaro foi fragorosamente derrotado por Haddad, Candidato do PT e por Ciro Gomes, a desilusão da população continua muito grande, inclusive pela forma pejorativa como Bolsonaro em certa ocasião se dirigiu aos nordestinos, naquela região 41% da população demonstram a sensação de que a situação do país está piorando e apenas para 26% que está melhorando.

Entre Católicos 35% afirmam que a situação está piorando e entre adeptos de outras religiões esta avaliação chega a 44%, bem superiores aos que acham que esteja melhorando, respectivamente 30% e 27%. O único segmento religioso que ainda imagina que a situação do Brasil está melhorando sob o Governo Bolsonaro é representado pelos evangélicos, onde 42% avaliação como melhor e apenas 27% como pior.

Não foi por acaso que o ex Presidente Collor ao comentar a falta de diálogo de Bolsonaro com o Congresso e com diversos outros setores da sociedade brasileira e pela sua forma autoritária de fazer política, preconizou que se o mesmo não mudar essa forma, pode acabar tendo o mesmo destino que ele, Collor de Mello e a ex presidente Dilma tiverem, ou seja, impossibilitado de governar.

Além dos fatores internos como baixo desempenho da economia, altos índices de desemprego, deterioração dos serviços públicos, elevado nível de violência e de insatisfação popular, aliados ao aguçamento das questões políticas e partidárias ante a proximidade das eleições municipais e os fatores externos como desvalorização cambial, encarecimento de diversos produtos de consumo popular como combustíveis, alimentos e medicamentos que sofrem impacto direto desta desvalorização, o quadro social e político nacional tende a ficar mais tenso.

Com certeza, de nada adianta o governo Bolsonaro e seus seguidores ameaçarem o que chamam de inimigos internos, as esquerdas, enfim, todo mundo que não devem obediência e adesão `a sua forma de pensar, sentir e agir, volto a repetir, poderemos observar e estaremos diante do agravamento/acirramento dos conflitos internos.

Greves, manifestações de ruas podem descambar para a violência policial, política e institucional. Talvez seja por isso que Bolsonaro, Moro, Paulo Guedes, os filhos do Presidente e tantos parlamentares apoiam a legalização da chamada excludente de ilicitude ou o que é popularmente denominado de licença para matar; ou a decretação da GLO para “resolver” conflitos agrários, ambientais e manifestações de rua.

Se mesmo sem tais medidas a violência policial e violência institucional no Brasil já é uma das maiores do mundo, imaginemos como poderá ser caso tais leis draconianas venham as er aprovadas no Congresso Nacional e sancionadas pelo Presidente.

É neste contexto que devemos ler, nas entrelinhas, as declarações do deputado Bolsonaro (filho do Presidente) e do Ministro Paulo Guedes sobre a “volta” do AI-5, o mais draconiano e perverso instrumento dos governos militares. Talvez seja este o roteiro para um golpe, como aconteceu com Getúlio, ao implantar a ditadura do Estado Novo. Esta é uma cartilha bem antiga de quebra da estabilidade institucional e todos os desdobramentos que a história tem comprovado, aqui e alhures!

Enfim, diante de tantas incertezas estamos chegando ao final do primeiro ano do Governo Bolsonaro, 2020 será ano eleitoral, quando o futuro político, econômico e institucional do Brasil começa a ser forjado, com vistas `as eleições gerais de 2022, quando, com certeza nem Bolsonaro e nem Lula serão unanimidades tanto na direita quanto na esquerda. Na direita o Governador Witzel do Rio de Janeiro, já se prepara para enfrentar Bolsonaro em seu próprio reduto e o Presidente já sentiu o golpe e tem reagido de forma bastante agressiva.

Na esquerda, onde a tão sonhada frente ampla pretende voltar novamente ao poder, Ciro Gomes não abre mão de sua candidatura e o PSB já sinaliza que quer construir seu próprio projeto. Afora isso, o Centrão tenta desesperadamente buscar uma candidatura viável, para ser alternativa ao confronto esquerda x direita, juntando os cacos que sobraram do PSDB, DEM,MDB, PTB e outros partidos que não guardam alinhamento automático com a direita e Bolsonaro, apesar de terem votado nele no segundo turno e façam parte de sua “base parlamentar”.

Vale a pena acompanhar esses cenários e tentar imaginar o nosso futuro. O que está em jogo é o futuro do país e as aspirações populares quanto ao fortalecimento da democracia e um projeto nacional de desenvolvimento com justiça social, equidade e sustentabilidade.

Quem viver verá!

*Juacy da Silva é professor universitário, fundador, titular e aposentado UFMT, sociólogo, mestre em sociologia. Colaborador de alguns veículos de comunicação. Email profjuacy@yahoo.com.br Twitter@profjuacy Blog www.professorjuacy.blogspot.com

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