A crise é mais perceptível nos serviços e na falta de recursos para comprar produtos básicos, principalmente alimentos.
Por Jaime C. Patias*
A situação de instabilidade na Venezuela continua a desequilibrar a população em todos os níveis e desafia a missão da Igreja. Na cidade de Caracas, como nas metrópoles da América Latina, a maioria da população não tem acesso aos recursos e oportunidades que garantem melhores condições de vida. A pobreza, a desigualdade e as diferentes formas de exclusão social afetam as famílias e se tornam um grande desafio para a evangelização. Estamos em Carapita, um bairro de aproximadamente 100 mil habitantes na periferia da capital venezuelana, onde trabalham os padres Rodrick Tumaini Minja e Beni Kapala, missionários da Consolata, na paróquia de São Joaquim e Santa Ana. O bairro se estende por colinas com casas empilhadas. As ruelas são íngremes o que torna difícil chegar ao topo sem um carro de tração. No bairro tem muitos desses carros que sobem e descem carregando pessoas e mercadorias.
Fundada em 25 de janeiro de 1990, a paróquia está organizada em sete setores que são comunidades de base muito ativas, incluindo a igreja matriz que fica na parte baixa. Cada capela tem uma religiosa responsável que são as Irmãs dos Sagrados Corações e as Irmãs da Caridade, moradoras na vizinhança e um diácono permanente.
O pároco, padre Rodrick é tanzaniano e nos conta sobre a missão em Carapita e seus desafios na atual situação de crise no país. “Aqui adotamos a pastoral missionária buscando em primeiro lugar os que estão afastados. Diante da crise econômica, social e moral, encontramos tantas necessidades. De uma forma ou outra temos que atender com as nossas pastorais”. O missionário conta que a falta de transportes e espaços, afeta as atividades. “Temos que cancelar reuniões, reduzir os deslocamentos e inventar coisas para nos adaptar à situação. Não temos espaços adequados para as atividades e por isso estamos construindo salas para a catequese, mas também para a formação do espírito crítico dos cristãos. Está bem atender as emergências, mas a solução é mais complexa. Por isso, a importância da formação para que eles mesmos façam escolhas acertadas e não sejam manipulados”, afirma o padre e conclui: “Vamos caminhando com o que o Cardeal de Caracas, Dom Baltazar Enrique Cardozo chama de Pastoral da Esperança, pois a nossa missão aqui é consolar”.
Sopão da solidariedade
A crise é mais perceptível nos serviços e na falta de recursos para comprar produtos básicos, principalmente alimentos. Hoje o salário mínimo é de 40.000,00 bolívares (apenas 3.35 dólares). Com esse valor não se pode comprar quase nada. (1kg de leite em pó custa 78.000,00; 1 kg de arroz: 12.000,00; 1kg de carne: 25.000,00; 1kg de frango: 14.000,00; uma caixa de ovos: 28.000,00). Por outro lado, a gasolina sai quase de graça. Você pode encher o tanque e se não tiver notas para pagar, segue viagem. Então como vive a população mais humilde? Os venezuelanos fora do país já somam mais de 4 milhões. Muitos enviam dólares para suas famílias. A cada dois ou três meses o governo doa uma cesta básica para uma parcela da população cadastrada. Os que ganham algo alimentam os demais. É comum ver pessoas jovens catando e comendo restos de comida no lixo. Uma cena forte que revela a gravidade da situação.
Nessas condições, a criatividade e a solidariedade fazem a diferença. Como forma de amenizar as dificuldades, na paróquia de Carapita, todos os domingos um grupo de voluntários prepara um sopão que é servido para cerca de 400 pessoas. Os ingredientes são fornecidos pela Pastoral Social com o apoio da Caritas e doações, mas a iniciativa conta com a solidariedade de muita gente. Em tempos de crise os cristãos vivem com mais fervor o mandamento do amor, a exemplo de Eugênio Euclides Camejo, um dos coordenadores da iniciativa. “Aqui está tudo organizado. Aos sábados compramos a verdura e quando não temos lenha, eu e meu filho saímos a procura e trazemos aqui para igreja. Eu me sinto bem nesse trabalho. Temos fé que o país vai melhorar para a gente poder comer bem. Enquanto isso, nós vamos levando”, diz.
Evangelização
A paróquia conta com pastorais, grupos e movimentos: Pastoral da Missão, Pastoral Social, Pastoral Juvenil, Pastoral Familiar, Catequese, Legião de Maria, Movimento Luís Variara, Eu tenho Sede e Laços de Amor Mariano. Cada comunidade possui um Conselho Pastoral e um Conselho de Administração. A comunidade e os coordenadores compõem o Conselho Pastoral da Paróquia.
O coordenador da catequese, Wilmer Daniel Ramírez, fala sobre o trabalho de evangelização. “A situação social e política do país também afeta a catequese, já que muitos jovens e crianças estão migrando. O número na catequizandos que era de 250 já caiu para 120. Estamos passando por uma situação difícil. Mas nós não perdemos a esperança. Continuamos apostando no país confiando na misericórdia de Deus que tem pena de cada um de nós. Queremos voltar aos canais democráticos para reconstruir Venezuela”, afirma Wilmer.
Centro pastoral e de residência
Outro projeto ousado da paróquia de Carapita em tempos de crise é a construção do Centro Pastoral com salas para catequeses e reuniões, incluindo residência para os padres. O trabalho já começou graças à doação de material por alguns benfeitores da Venezuela. Uma vez assentadas as bases e levantadas as estruturas, a comunidade espera agora obter recursos para completar a construção ao lado da igreja paroquial. Em meio a tantas dificuldades, o que chama a atenção é o olhar de esperança em quem acredita na vida da comunidade.
Na Venezuela trabalham 13 missionários da Consolata com a Pastoral Afro, a Pastoral Indígena e nas periferias urbanas e existenciais, a Animação Missionária e Vocacional, entre outros serviços.