Francisco volta a nos lembrar que a Paz é uma aspiração profunda de todas as pessoas e de todos os povos, e particularmente de quantos padecem duramente pela sua falta.
Por Gianfranco Graziola
Faz 51 anos que o mundo dedica o primeiro dia do ano à celebração do do Dia Mundial da Paz instituído dois anos após a conclusão do Concílio Vaticano II pelo papa Paulo VI. Assim ele escrevia na sua primeira mensagem de apresentação da iniciativa:
“Nós pensamos que esta proposta interpreta as aspirações dos povos, dos seus governantes e das entidades internacionais que intentam conservar a Paz no mundo; das instituições religiosas, tão interessadas no promover a Paz; dos movimentos culturais, políticos e sociais que fazem da Paz o seu ideal; da juventude, em quem mais vivas estão as perspectivas de caminhos novos de civilização, necessariamente orientados para um seu pacífico desenvolvimento; dos homens prudentes que veem quanto a Paz é necessária e, ao mesmo tempo, quanto ela se acha ameaçada. A proposta de dedicar à Paz o primeiro dia do novo ano não tem a pretensão de ser qualificada como exclusivamente nossa, religiosa ou católica... a consonância de todas as vozes do mundo, consonância na harmonia, feita da variedade da humanidade moderna, no exaltar este bem primário que é a Paz”.
Passado meio século, Francisco, bispo de Roma, volta a nos lembrar que a Paz é uma aspiração profunda de todas as pessoas e de todos os povos, e particularmente de quantos padecem duramente pela sua falta. Entre eles o papa evidencia para o ano de 2018 os 250 milhões de migrantes no mundo dos quais 22 milhões são refugiados, homens e mulheres, crianças, jovens e idosos que procuram um lugar onde viver em paz.
Mensagem
Como é habitual, na mensagem de Francisco, e em suas palavras encontramos a concreteza das situações da vida e sua leitura a partir do projeto de Jesus que se faz palavra na concretude da história e na mudança de época. Sua proposta é a vivência da misericórdia, não como sentimentalismo, mas como expressão concreta de abraçar todos aqueles que fogem da guerra e da fome ou se veem constrangidos a deixar a própria terra por causa de discriminações, perseguições, pobreza e degradação ambiental.
Mas há um ponto chave e desafiador, no coração desta mensagem, dirigida aos cristãos e a todas as pessoas de boa vontade, para Francisco central é o nosso olhar, a maneira como enxergamos esta realidade do século XXI, que para nós é o “olhar contemplativo” que tem suas raízes na fé. Este olhar, afirma o papa, é o olhar que supera a desconfiança, a retórica da segurança nacional, da ideologia de que os recém-chegados são um peso e uma ameaça para a nação, alimentando por fins propagandísticos políticos a violência, a xenofobia, a discriminação racial. E a partir desse olhar o convite claro de Francisco a uma atitude de total confiança alimentada da sabedoria da fé que nos faz membros da única família humana com igual direito a usufruir dos bens da Casa Comum. A total confiança, fruto deste novo olhar, por sua vez nos ajuda a descobrir que, migrantes e refugiados não chegam de mãos vazias, mas trazem para nossos países uma bagagem de coragem, aspirações, novas energias, e os tesouros de suas culturas nativas que enriquecem e despertam nossas sociedades do torpor humano e cultural em que caíram.
Concretizando este olhar, o papa Francisco, indica quatro ações, que ele define pedras milhares: acolher, proteger, promover e integrar.
«Acolher» faz apelo à exigência de ampliar as possibilidades de entrada legal, de não repelir refugiados e migrantes para lugares onde os aguardam perseguições e violências, e de equilibrar a preocupação pela segurança nacional com a tutela dos direitos humanos fundamentais.
«Proteger» lembra o dever de reconhecer e tutelar a dignidade inviolável daqueles que fogem dum perigo real em busca de asilo e segurança, de impedir a sua exploração. Penso de modo particular nas mulheres e nas crianças que se encontram em situações onde estão mais expostas aos riscos e aos abusos que chegam até ao ponto de as tornar escravas.
«Promover» alude ao apoio para o desenvolvimento humano integral de migrantes e refugiados. Dentre os numerosos instrumentos que podem ajudar nesta tarefa, desejo sublinhar a importância de assegurar às crianças e aos jovens o acesso a todos os níveis de instrução: deste modo poderão não só cultivar e fazer frutificar as suas capacidades, mas estarão em melhores condições também para ir ao encontro dos outros, cultivando um espírito de diálogo e não de fechamento ou de conflito.
Por fim, «integrar» significa permitir que refugiados e migrantes participem plenamente na vida da sociedade que os acolhe, numa dinâmica de mútuo enriquecimento e fecunda colaboração na promoção do desenvolvimento humano integral das comunidades locais.
Em conclusão podemos afirmar com Francisco: «Se o “sonho” de um mundo em paz é partilhado por tantas pessoas, se, se valoriza a contribuição dos migrantes e dos refugiados, a humanidade pode tornar-se sempre mais família de todos e a nossa terra uma real “casa comum”».