Nei Alberto Pies *
Minha atividade social militante não me condena. Passei a vida, como muitos, defendendo bandeiras como a liberdade, o respeito aos direitos humanos fundamentais, a consolidação da democracia ativa, o acesso à cidadania através da geração de trabalho e renda, o respeito, a consideração e reverência às diferentes crenças, dentre outras. Não imagino que esta luta social, feita a tantas mentes e mãos, possa me impor qualquer responsabilidade sobre desvios éticos e morais de terceiros que se apropriaram dos bens mais sagrados: as instituições e os recursos públicos.
Sempre fui otimista com relação aos potenciais da cidadania e altivez dos brasileiros, apesar da insistente passividade que nos circunda e nos envolve cotidianamente. Nem os mais recentes e noticiados episódios envolvendo corrupção no Brasil abalaram minha crença nos brasileiros que, por sua diversidade e riqueza cultural, produzem uma nação gigante. Mas em função de uma intensa divulgação midiática - certamente intencionada - sobre corrupção, estamos vivendo um tempo de "neuroses coletivas", envolvendo conceitos, julgamentos e condenações generalizadas sem a mínima sensatez que permita o senso crítico e discernimento.
Nas redes sociais ou nos relacionamentos interpessoais há pessoas que cegaram pontos de vista, agindo estupidamente com aqueles que, defensores da mesma luta ideológica, imaginam próximos ou coniventes aos já publicamente julgados e condenados "malfeitores da nação". Grosseiramente, imputem a todos os lutadores sociais, associação direta com estes. Desconsideram história pessoal, coletiva e organizada de milhares de pessoas que ajudaram este país a superar a vergonha da miséria e da fome, do preconceito e da discriminação, da falta de trabalho e oportunidades, da cidadania passiva (que sempre envolvia a noção de favores e não direitos).
Penso, como muitos, que poderemos passar a limpo endêmica e sistemática corrupção que grassa as relações pessoais e institucionais em nosso país. A corrupção que acontece a cada dia nas ruas, nos hospitais, nas organizações civis e de classe, nos poderes da República, na Petrobrás e demais empresas públicas e privadas pode ser enfrentada neste momento histórico. Escolher a corrupção como um dos problemas brasileiros talvez seja o primeiro passo em direção ao seu enfrentamento, a ser efetivado todos os dias, em todos os espaços.
Eleger a Petrobrás, alguns governos ou a presidente Dilma como "bodes expiatórios" é uma forma equivocada de enfrentar o problema da corrupção no Brasil. As mudanças reais, de efetivo resultado, virão quando mudarmos a forma de pensar e organizar a vida em sociedade mudando nosso sistema político (falido e corrompido), nosso sistema econômico (excludente e seletivo), nosso sistema social (da estratificação social), nosso sistema jurídico (burocratizado e que favorece a impunidade), para citar alguns.
Esta mudança exige outra postura dos cidadãos brasileiros: a vigilância, a denúncia e a cobrança por maior transparência em todos os atos e atividades que envolvem o interesse público. Exige em todos os espaços educativos: escolas, clubes, associações, sindicatos e partidos o estudo e o debate das implicações e problemas da corrupção para a nação. Exige cobrar que todos os que comprovadamente praticaram corrupção sejam punidos e que o dinheiro público seja ressarcido.
O pior a fazer é agir como expectadores, jogando como torcida: pior, melhor, mais corrupto, menos corrupto, mais ético, menos ético. Enfrentar a corrupção no Brasil deveria ser um dever cívico de todos, para o bem de toda nossa querida nação brasileira.
Sou todo Petrobrás para defender a importância estratégica desta empresa para o desenvolvimento do país, mantendo-a pública, saneada e livre dos ataques predadores e privatizantes. Sou nada Petrobrás se é para transformá-la em "bode de sala", mantendo tudo como está para favorecer a corrupção e a concentração da renda neste país.
* Nei Alberto Pies, professor e ativista de direitos humanos.
Fonte: Revista Missões