Jaime C. Patias
Encontrar a cidade de São Gabriel da Cachoeira no mapa do Amazonas é fácil. Ela se situa no extremo noroeste, no limite com a Colômbia e a Venezuela, às margens do Rio Negro. Chegar lá não é tão fácil assim: são 850 km de Manaus, viajando de barco, uma semana, de lancha, 36 horas ou com o pequeno avião que parte de Manaus, duas vezes por semana. "Aqui 95% da população é indígena pertencente a 23 etnias diferentes e ainda hoje, são faladas 18 línguas. É um laboratório linguístico de primeira grandeza", explica dom Edson T. Damian, o bispo de São Gabriel da Cachoeira desde 2009.
Dom Edson é natural de Fontana Freda no município gaúcho de Juaguari, terra que já pertenceu ao povo Tupi Guarani, mas que na época das grandes migrações foi ocupada pelos imigrantes italianos. O bispo é descendente de uma dessas famílias e pela graça de Deus, foi chamado para servir a diocese da Amazônia, considerada mais indígena do Brasil. O respeito pelos povos indígenas foi demonstrado já no dia da sua ordenação. "Eu chego devagar, pedindo licença para ser acolhido como hóspede, porque eles são os primeiros habitantes e agente deve respeitá-los na sua cultura, na sua religiosidade, no seu jeito de ser", anunciou dom Edson diante das mais de duas mil pessoas, a maioria de origem indígena presentes na celebração. Ele é o quinto bispo daquela diocese e substituiu dom José Song Sui Wan, bispo chinês missionário no Brasil. Antes disso, dom Edson viveu em Boa Vista (RR), onde acompanhou momentos marcantes das lutas dos indígenas daquele estado pela demarcação e homologação da terra Raposa Serra do Sol.
Hoje em São Gabriel da Cachoeira a inculturação do Evangelho começa pela catequese quando se dá a iniciação cristã. Para intensificar esse processo, entre os dias 31 de agosto e 05 de setembro aconteceu em Yauaretê, paróquia totalmente indígena na fronteira com a Colômbia, uma Semana de Catequese Indígena Inculturada. O encontro contou com a participação de 70 catequistas, ministros da palavra, ministros da comunhão eucarística e a presença do enviado do papa Francisco, o cardeal dom Cláudio Hummes, OFM, presidente da Comissão Episcopal para a Amazônia da CNBB. Como critério, cada paróquia enviou até cinco catequistas, escolhidos entre os que participaram nas formações realizadas anteriormente. As reflexões contaram com a assessoria do padre Eleázar López Hernadez, indígena do México.
A temática recebeu grande impulso já em 2013 com três eventos: um Seminário em Manaus (AM), no mês de abril e um Encontro de Catequistas em São Gabriel da Cachoeira no mês de maio, assessorado pelo mesmo padre Eleázar López Hernadez. Além disso, em outubro, catequistas de todas as paróquias analisaram os valores das culturas indígenas que acolhem a Palavra de Deus e são por ela iluminados. Na ocasião, foram elaborados vários roteiros para encontros de catequese. Ao longo de 2014 acontecem semanas de estudo em todas as paróquias, com boa aceitação dos catequistas.
Segundo dom Edson, "como Deus não se impõe, mas propõe, a catequese inculturada só acontece quando os irmãos indígenas acolhem o Evangelho em sua cultura, com liberdade e autonomia. Encarnado na diversidade das culturas, o Evangelho gera comunidades eclesiais com rosto próprio", sublinha ele e recorda um ensinamento do papa Francisco: "Cristo não extingue o que é bom, mas o completa".
O bispo destaca ainda, a riqueza das culturas indígenas para a Igreja local. "Quando sabemos que cada língua traz tesouros particulares em relação à cultura, à antropologia, à cosmologia e à visão de Deus, então aqui nós estamos num paraíso. Isto é extraordinário. A diocese é imensa: ela tem 293 mil km2, é maior que o estado de São Paulo, abrange toda a bacia do Rio Negro, que é o principal afluente do Rio Amazonas. Abrange apenas três municípios: Barcelos, Santa Isabel do Rio Negro e São Gabriel da Cachoeira, onde está a sede da diocese".
Em termos de vocações, a diocese conta com diversas religiosas indígenas e pelo menos meia dúzia de padres.
Para dar continuidade ao processo de inculturação, no Encontro diocesano do mês de novembro próximo, o tema da Catequese Indígena inculturada será retomado.
Outro evento importante para a Evangelização na Amazônia é o Encontro Internacional para criação de uma Rede Eclesial Pan-Amazônica. O evento, que acontece na sede das Pontifícias Obras Missionárias (POM), em Brasília (DF), de 9 a 12 de setembro, pretende reunir 60 representantes de instituições atuantes na Região. Um dos objetivos deste encontro é, a partir das experiências feitas até agora, definir a finalidade, estratégias e metas em vista da consolidação da Rede Eclesial Pan-Amazônica.
Fonte: www.pom.org.br