Davi Kopenawa na Feira Literária de Paraty: "não quero ser o novo Chico Mendes"

Guilherme Freitas

A tradicional cerimônia de encerramento da Feira Literária de Paraty (Flip), em que autores leem trechos de seus livros de cabeceira, ganhou uma adesão de última hora na tarde deste domingo, 4. O líder ianomâmi Davi Kopenawa, que participou de um debate na sexta-feira com a fotógrafa Claudia Andujar e não estava previsto para a última mesa, pediu à organização da festa para fazer um pronunciamento. Em um discurso depois das leituras, ele denunciou as ameaças de morte que tem sofrido e as invasões de territórios indígenas na Amazônia.

- Tenho uma mensagem para vocês sobre a ameaça ao povo ianomâmi e a mim. Estou muito preocupado. Fazendeiros e garimpeiros têm muito dinheiro para matar índios. Não quero que se repita o que aconteceu com meu amigo Chico Mendes, que foi morto porque defendia a floresta - disse Kopenawa.

Kopenawa criticou a presidente Dilma Rousseff e acusou o senador Romero Jucá Filho (PMDB-RR), ex-presidente da Funai e ex-governador de Roraima nos anos 1980, de incentivar invasões a terras ianomâmi na região. Também criticou a polícia e as autoridades do estado por não responderem às ameaças contra ele e seu povo.

- Nossa terra é demarcada por lei, mas a Constituição continua sendo desrespeitada. Ianomâmi não é bicho, é gente. Sabe falar, lutar, reclamar e se defender - disse Kopenawa, que pediu apoio do público. - Peço que vocês façam manifestações para chamar atenção do governo. Ajudem os povos indígenas brasileiros, lutem com a gente. Sem os índios, o mundo não vai funcionar. A floresta amazônica pertence a todos nós, para que nossos filhos vivam em paz.

Antes da cerimônia de encerramento, Kopenawa se encontrou com lideranças indígenas de Paraty. Realizado em plena Rua do Comércio, o encontro atraiu cerca de cem pessoas, que acabaram participando de um debate improvisado, com direito a perguntas do público para Kopenawa.

Na mesa "Livros de cabeceira", o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro leu um trecho do "Sermão do Espírito Santo", do padre Antonio Vieira. Nele, o religioso fala sobre a dificuldade de converter índios ao Cristianismo, comparando o caso dos povos do Brasil aos de outras regiões. Enquanto estes permaneciam fiéis após vencida a resistência inicial, diz Vieira, os índios no Brasil aceitavam a catequese, mas logo voltavam à sua situação original, indiferentes à fé.

- É por isso que, até hoje, os índios estão a salvo de seus salvadores - disse Viveiros de Castro.

Fonte: www.oglobo.com

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