Heitor Scalambrini Costa *
Nesse ano que passou havia muita esperança de que a energia solar fotovoltaica de uso residencial pudesse deslanchar no Brasil, após a edição da Resolução Normativa (RN) no 482/2011, da Agencia Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). Eu mesmo cheguei a escrever um artigo, em 19/12/2012, intitulado "A hora e a vez da geração distribuída".
Ledo engano. Em 2013, segundo o estudo "Os brasileiros diante da microgeração de energia renovável", realizado pelo Greenpeace, em parceria com a Market Analysis, os resultados decorrentes da Resolução foram pífios. De onde se conclui que a RN 482, que deveria reduzir as barreiras e estimular a instalação de geração distribuída de pequeno porte conectada à rede elétrica, principalmente nas residências, se tornou um grande fiasco.
Ainda segundo o estudo citado, somente 131 sistemas domiciliares de geração fotovoltaica foram instalados em todo o Brasil. Foi em São Paulo onde se concentrou o maior numero de instalações, 22; vindo a seguir o Ceará, com 14. Em Pernambuco, apenas 4 instalações foram realizadas.
Esses números são irrisórios diante das possibilidades que o país possui, principalmente devido à alta incidência de radiação solar em praticamente todo o seu território. Em contraste, a Alemanha, líder no mercado global de geração de energia solar, em 2012, contava com cerca de 1,5 milhão de produtores individuais de energia, a partir de painéis solares fotovoltaicos.
Então, se temos Sol em abundância porque não aproveitá-lo mais para gerar eletricidade?
Identificamos como a causa principal a falta de interesse dos gestores da área energética em relação a esta importante fonte de energia. Em países que hoje utilizam consideravelmente o potencial solar, o Estado teve uma participação fundamental, alavancando a cadeia produtiva fotovoltaica. Os incentivos foram para os dois extremos da cadeia: para quem produz os equipamentos e para quem os compra. Quer reduzindo impostos, dando subsídios, criando linhas de crédito, informando a população acerca dos benefícios, quer comprando grandes quantidades para instalar em equipamentos públicos (escolas, hospitais, escritórios dos órgãos públicos, etc.). Estas ações resultaram no desenvolvimento do mercado, e na consequente redução dos preços, tornando os equipamentos mais acessíveis.
Outros aspectos interessantes apontados pelo estudo do Greenpeace/Market Analysis foram o baixo nível de conhecimento que a população possui sobre a Resolução da ANEEL (75% dos entrevistados não sabem nada ou pouco sabem). Mesmo com o desconhecimento, 90% dos entrevistados mostraram interesse em saber mais e, caso houvesse linhas de crédito com juros baixos, optariam por produzir sua própria energia, adotando os sistemas fotovoltaicos em suas residências. Fica claro, portanto, que o governo federal e as distribuidoras responsáveis pelas instalações nada fizeram para divulgar a Resolução e as enormes possibilidades que tem a energia solar em nosso país.
Sem dúvida a eletrificação de residências com sistemas fotovoltaicos tem se mostrado como uma opção tecnológica de grande importância em vários países do mundo, com programas federais e locais que incentivam e oferecem condições financeiras adequadas para que tais sistemas contribuam efetivamente para a diversificação da matriz elétrica.
No Brasil, estamos distantes de aproveitar nosso enorme potencial, principalmente na região nordeste, onde ao longo do ano o Sol brilha por mais de 3 mil horas. Verificam-se atualmente iniciativas pontuais de geração centralizada de energia fotovoltaica, como as instalações nas recém construídas arenas para a Copa de 2014, e a experiência bem sucedida do governo de Pernambuco, que realizou um leilão exclusivo para esta fonte energética e selecionou 6 projetos, totalizando 122,8 MWh de potencia instalada, a um preço médio de R$ 228,00/MWh. No entanto, estes são projetos de geração industrial e não de micro geração descentralizada.
Resumindo: no Brasil, a contribuição da eletricidade solar na matriz elétrica é desprezível, pois a falta de interesse do governo federal dificulta uma maior disseminação dessa tecnologia - madura e promissora. Entendemos ser completamente sem cabimento a falta de apoio à eletricidade solar. E a justificativa de ela ser mais cara esbarra com a experiência mundial que mostra ser o apoio do Estado necessário para desenvolver o mercado.
* Heitor Scalambrini Costa é professor da Universidade Federal de Pernambuco.
Fonte: Heitor Scalambrini Costa / Revista Missões