Alfredo J. Gonçalves *
Eu o vi nos grandes centros comerciais, os shopping-centers, deitado num simulacro de manjedoura, no interior de uma gruta, rodeado de Maria, José, os pastores, os reis magos e alguns animais; mas as atenções das pessoas concentravam-se sobre o Papai Noel: sentado num trono, distribuía sorrisos, abraços e presentes;
o protagonista da festa, permanecia ignorado pela imensa maioria, acanhado a um canto, a exemplo de tantos meninos e meninas, filhos de pais estrangeiros e sem pátria nos porões da cidade.
Eu o vi em algumas ruas ou praças da grande metrópole, presépios artísticos, profusamente iluminadas e enfeitadas; mas os transeuntes, embriagados pelo brilho das luzes e presentes, viam-se arrastados pela frenética sede de encontros e compras; o personagem principal desaparecia na torrente da multidão ansiosa,
da mesma forma que milhares de crianças filhas de migrantes sós e perdidas, em busca de pão e carinho, como órfãs de pais vivos, nos becos sem saída do álcool ou da droga.
Eu o vi no interior das casas, como parte da tradição cristã: o mesmo menino, os mesmas animais e figuras, o mesmo arranjo; mas a família tinha outros afazeres, próprios do final de ano: roupas e sapatos, eletrônicos e móveis, novidades de todo tipo; pouca ou nenhuma atenção merecia a imagem do recém-nascido,
como milhões de crianças recém-chegadas do campo ou de outro país, sem casa nem escola, poucas possibilidades de futuro, marcados pelo abandono, o preconceito e a discriminação.
Eu o vi em muitas Igrejas, com a sagrada família e demais imagens; porém, como aos saduceus e fariseus de todos os tempos, a miopia e a cegueira impediam de sentir a aurora do Reino de Deus na face simples e singela do Menino que acabara de nascer, como também no rosto desfigurado de inúmeros meninos e meninas,
refugiados, prófugos, exilados, fugitivos da violência e da guerra: longe da terra natal, já nascem à margem da estrada e da vida.
Entretanto, Ele ali estava como Boa Nova para os pobres, esperança viva daqueles que, apesar das adversidades,
se põem a caminho, na tentativa de abrir horizontes novos!
* Alfredo J. Gonçalves, cs, Roma, 15 de novembro de 2013.
Fonte: www.feepolitica.org.br