Wladimir Pomar*
O título acima parece ter virado chavão. Ele é o mote da Fiesp, Fiemg e de uma lista enorme de federações industriais. Ele também parece ser o mote de uma parte do movimento sindical e, provavelmente, de vários movimentos sociais e partidos políticos. Ou seja, parece ser quase uma unanimidade nacional. O que, de cara, deveria nos alertar para algo esquisito.
A esquisitice reside justamente no fato de que parece estar havendo confusão em torno do termo nacional. A Fiesp e federações industriais parecem estar considerando nacionais a Volkswagen, a Ford, a GM, a Fiat, a Toyota, a Mercedes, a Volvo, a Arcelor, a Belgo Mineira, a Bayer, a Monsanto, a Huawei, a Alstom, e algumas centenas de outras empresas, cujos capitais têm sede em países estrangeiros. Elas seriam nacionais pelo simples fato de estarem instaladas no Brasil, embora nenhuma delas tenha participação acionária de capitais brasileiros.
Com isso, borra-se qualquer diferença entre capitais estrangeiros e capitais nacionais. É lógico que se pode argumentar que tais empresas criam empregos, teoricamente contribuem positivamente para a industrialização nacional brasileira e, portanto, para gerar riquezas e transferir tecnologias para o Brasil.
Na prática, as políticas nacionais de abertura a investimentos externos jamais impuseram qualquer exigência de associação com empresas brasileiras e de transferência real de novas tecnologias. Nessas condições, as empresas estrangeiras que se instalaram no Brasil são 100% de capitais estrangeiros, em sua maior parte. Muitas delas se instalaram aqui com plantas e equipamentos ultrapassados em seus países de origem, sem qualquer compromisso de transferirem tecnologias avançadas para empresas nacionais brasileiras. E várias delas operam em cartel, ou regime de oligopólio e preços administrados, tornando o Brasil um dos países mais caros do mundo.
Objetivamente, o fato de elas terem que operar no Brasil as obrigou a realizar algum tipo de transferência tecnológica, sem o que elas não poderiam funcionar. Mas, se levarmos em conta que foi o Estado (ou seja, o povo) brasileiro que arcou com os custos de construção da infra-estrutura necessária para a instalação e funcionamento dessas empresas, podemos concluir que elas colaboram muito pouco para criar uma indústria verdadeiramente brasileira e para elevar a participação do produto nacional bruto no produto interno bruto.
Cabe ver se os movimentos sociais, sindicatos e partidos estão fazendo a mesma confusão. Principalmente porque, um dos problemas atuais do Brasil, pelo estágio de suas forças produtivas, herdado do período de estagnação e, depois, da destruição neoliberal, é que nosso país não pode prescindir dos investimentos e da instalação de indústrias estrangeiras para sua re-industrialização. Assim, se os movimentos sociais, os sindicados e os partidos, progressistas e de esquerda, estiverem envolvidos em tal confusão, a tendência é de que tais investimentos sejam realizados no antigo padrão subordinado. O que, paradoxalmente, fará com que a dependência tecnológica e financeira nacional aumente, ao invés de ser reduzida.
Há sinais de que o governo está alerta para o problema, começando a pressionar as empresas estrangeiras, propensas a investir no Brasil, para se associarem a empresas nacionais brasileiras. A orientação é positiva, mas também corre o risco de agravar a situação se as empresas brasileiras indicadas forem do grupo seleto das grandes corporações oligopolistas. Para romper com os oligopólios de qualquer tipo e quebrar o sistema administrativo de altos preços, uma das condições reside em priorizar as médias e pequenas empresas, já que aí se encontra a verdadeira indústria nacional.
Nesse processo é preciso exigir, ao mesmo tempo, que os projetos de novos investimentos estrangeiros, inclusive os de ampliação das antigas plantas já instaladas no Brasil, incorporem altas e novas tecnologias, que devem ser repassadas aos associados nacionais. Exigências adicionais de instalação de centros de pesquisa e desenvolvimento no Brasil também deveriam ser negociadas, de modo a colaborar na redução do gap científico e tecnológico que o país enfrenta.
Resumindo, ao tratar da diferença real entre indústria nacional e indústria estrangeira instalada em território brasileiro, estamos falando não só de clareza quanto à soberania nacional e à inserção soberana na globalização, mas também da democratização interna do capital, uma das condições para consolidar a industrialização e reduzir o grau de concentração e centralização capitalista que sufoca o desenvolvimento nacional.
*Wladimir Pomar é analista político e escritor.
Fonte: www.correiocidadania.com.br