Nei Alberto Pies*
Viveremos, nos próximos meses, momentos singulares para revisar a nossa cidadania a partir do lugar onde moramos: as nossas cidades. A coincidência dos outonos com os períodos pré-eleitorais potencializa as nossas ações cidadãs e nos convida a estarmos espertos neste período de anúncios e prenúncios. Os outonos forram o nosso chão de folhas deixando as árvores dormentes. Os outonos anunciam a chegada do frio que nos deixa menos mobilizados e atuantes fisicamente, mas não acomodam nossas consciências. Pelo contrário, este é um período em que nossas consciências devem estar despertadas para compreendermos as manhas e as artimanhas da nossa política.
Prestemos atenção aos rituais, aos comportamentos, aos discursos, às estratégias dos candidatos. Revisemos a sua vida pessoal e comunitária para perceber se guardam coerência e consistência em seus propósitos. Vivamos este tempo como um tempo de graça para aperfeiçoarmos a nossa cidadania e nosso poder de decidir os rumos que desejamos para as nossas cidades.
A disputa eleitoral que se aproxima é antecipadamente marcada por disputas, promessas, jogos e seduções de muitos e difusos interesses, jogados nos bastidores. Estes interesses são calorosamente alinhavados para que possam traduzir-se em propostas concretas para melhorar a qualidade de vida em nossas cidades. A aparente acomodação do outono contrasta com os intensos movimentos que geram os debates, as reuniões, os acordos que geralmente se operam na "calada das noites". Ao fim e a cabo, anunciam-se os protagonistas que representam este ou aquele projeto político: os candidatos a prefeito, vice-prefeito e a suas nominatas de candidatos a vereadores.
Embora seja sagrado o nosso direito de votar, as eleições não esgotam a democracia, mas são um momento mais intenso de debate dos rumos de nossa cidadania. A verdadeira democracia se concretiza a partir do protagonismo cidadão e da participação da sociedade na proposição, encaminhamento e cobrança de políticas públicas. Por isso mesmo democracia é uma forma de convivência que exige que superemos a "alienação dos sujeitos". As pessoas envolvidas e interessadas nas políticas devem participar das decisões, em diferentes níveis e situações. A separação entre aqueles que decidem e executam e os beneficiários, além de possibilitar manobras, gera desinteresse por conviver em grupo e em sociedade.
As contradições da democracia não param por aí e exigem ainda que incluamos a todos, em sua condição de cidadãos e sujeitos de direitos. A verdadeira democracia não tolera a existência de excluídos. A fome, a miséria e a discriminação dos mais pobres, além de agredir e negar a dignidade humana, "abortam" a cidadania. Em tempos eleitorais, estes são os alvos mais fáceis de manipulação e enganação. Em tempos outros, quem aborta a cidadania de muitos é a burocracia. Mas este já é tema para uma reflexão.
*Nei Alberto Pies, professor e ativista de direitos humanos.
Fonte: Nei Alberto Pies / Revista Missões