Seca furiosa

Roberto Malvezzi (Gogó) *

Como ainda não encerrou o período de chuvas no semiárido, não é possível confirmarmos uma das menores pluviosidades das últimas décadas, particularmente onde se convencionou chamar de Polígono das Secas. O fato é que a data simbólica de São José passou e as chuvas vieram em pouca quantidade.

Na verdade, segundo o INPE, deveríamos estar no auge de uma grande seca, que se estenderia de 2006 a 2011. Parece que o período se estendeu, o que agrava a situação. Os barreiros secaram, assim como os pequenos açudes, as cisternas estão com pouca água, muitas sem água. Na Bahia 158 municípios podem entrar em emergência.

Na verdade, se essa situação acontecesse trinta anos atrás, como em 1982, já estaríamos atravessando uma nova tragédia social no semiárido, com intensas migrações, morte dos animais, mortalidade infantil, com necessidade das famigeradas frentes de emergência, assim por diante. Hoje, com a aposentadoria dos rurais, com as cisternas como depósito para pipas (nesse momento não dá para escolher, desde que a água seja tratada), com o Bolsa Família, com a chegada da energia nas comunidades, a situação é grave, mas não é mais uma tragédia como viu a geração de Luis Gonzaga, Graciliano Ramos, João Cabral, assim por diante.

Vão surgir muitos questionamentos sobre as políticas adotadas para vencer essa situação, como vão surgir novamente propostas miraculosas para "acabar com a seca". Nós, que temos desenvolvido a lógica da convivência com o semiárido não estamos surpresos com esse momento. Sabemos que o semiárido tem uma média de chuvas que varia entre 300 e 750 mm ao ano. Há poucos anos em que há chuva excessiva. Há poucos com chuvas beirando os 300 mm. Mas eles existem.

Portanto, o grande segredo da convivência é a prevenção. A lógica de armazenar a água de chuva nos períodos chuvosos para os períodos secos, a fenagem e a silagem para os animais, a difusão e implantação de um leque poderoso de tecnologias sociais que a sociedade e a Embrapa Semiárido já dominam, a educação contextualizada das comunidades para entender melhor a lógica da região na qual vivem, são as melhores soluções encontradas até hoje.

Quando a prevenção não é suficiente, é necessário recorrer às medidas de emergência. Emergências acontecem em qualquer lugar do mundo. Não é preciso fazer loucuras como as cisternas de plástico e obras como a Transposição, já orçada em 8,2 bilhões de reais, dinheiro suficiente para fazer 90% das adutoras previstas no Atlas do Nordeste.

Pois bem, falta muito no semiárido para que a população tenha uma infraestrutura adequada para enfrentar essas situações. Além das tecnologias sociais e familiares, faltam ainda as adutoras para os centros urbanos. Com essa variedade de obras e medidas para enfrentar os períodos mais agudos, esses cenários no semiárido serão sempre mais facilmente contornáveis, já que o clima não muda, e se mudar, como prevê a mudança climática do planeta, vai ser para pior.

* Roberto Malvezzi (Gogó) é membro da Equipe Terra, Água e Meio Ambiente do CELAM (Conselho Episcopal Latino-Americano) e assessor da Comissão Pastoral da Terra - CPT.

Fonte: Roberto Malvezzi (Gogó)/ Revista Missões

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