Roberto Naime *
A regulamentação das barragens e grandes reservatórios pela primeira é objeto de lei no Brasil. Embora o diploma legal não aborde de forma muito abrangente a questão fundamental da governança socioambiental da água, até mesmo porque este assunto transcende às barragens e invade as questões das bacias hidrográficas e outras.
Como este projeto foi patrocinado fundamentalmente pela área técnica da construção de barragens, ele se denomina Política Nacional de Segurança de Barragens e este é o principal escopo. A lei 12.334/2010 define responsabilidades e atribuições a respeito do cuidado com a segurança das barragens brasileiras. Cria também o Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de Barragens (SNISB).
Portanto, em vez de lamentar a falta de abrangência para questões que envolvam a governança socioambiental deste bem natural imprescindível como a água, esta lei deve ser saudada como um enorme avanço porque é uma conquista da sociedade brasileira no sentido que vai dar maior segurança a todos quanto ao monitoramento de segurança das barragens.
A lei traz princípios, objetivos e instrumentos que os profissionais, proprietários e órgãos fiscalizadores deverão seguir para conseguir projeção, construção e operação adequada dos barramentos e reservatórios em bacias hidrográficas.
Como toda lei, resulta de uma mobilização que é sempre um processo, e como tal tem que ocorrer e maturar tanto na sociedade quanto na representação política desta sociedade.
A lei busca solucionar zonas de sombreamento de atribuições entre os órgãos, tentando esclarecer as competências de cada instituição de forma que o sistema funcione com eficiência. São definidos os princípios mínimos a sem seguidos pelos empreendedores de barramentos e reservatórios para operação e manutenção com a segurança adequada. As estruturas serão classificadas em função de seu impacto associado nas áreas econômica, social e ambiental. A legislação define claramente as atribuições e responsabilidades de todos os atores destes cenários.
A engenharia brasileira é reconhecida internacionalmente pela capacidade de projetar, construir e operar estes estruturas. Dentre os fatores predominantes na ocorrência de danos nas barragens e reservatórios estão listados deficiências nos estudos geotécnicos, nos próprios projetos de engenharia e na construção. A aprovação desta política é o primeiro movimento no sentido de regularizar, disciplinar, fiscalizar e monitorar a construção e operação de barragens e reservatórios em todo território nacional.
Os índices internacionais considerados toleráveis são de 1 acidente para cada 10.000 barragens enquanto no Brasil ocorre 1:250 barragens por ano. Isto significa que este atraso em desenvolver um sistema de gerenciamento das barragens gera índices de acidentes até 40 vezes maior que o tolerável.
Estudo da agência nacional de águas registra a existência de 8 mil reservatórios artificiais no Brasil, sendo que os estados com maior número de reservatórios são o Rio Grande do Sul e o Ceará por motivos opostos. No Rio Grande do Sul pela elevada disponibilidade hídrica e a existência de uma cultura de irrigação. Enquanto no Ceará existem muitos reservatórios como tentativa de regularizar a carência hídrica e a falta de água até mesmo para uso e consumo das populações.
O empreendedor é o responsável pelo monitoramento e deve exigir documentação comprobatória do comissionamento, uma espécie de validação da estrutura que deve ocorrer durante a obra e antes do fechamento da barragem ou reservatório.
A lei atribui à Agência Nacional de Águas (ANA) a articulação, implantação e responsabilidade pelo Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de Barragens (SNISB).
A fiscalização sobre a segurança das barragens caberá ao outorgante do direito de uso do recurso hídrico no local. Existem prazos para elaboração de laudos e cronogramas de implantação de melhorias, mas tudo em relação à segurança. É um grande passo, mas a lacuna sobre governança socioambiental sobre a utilização do recurso hídrico no contexto da bacia hidrográfica ainda merecerá ser contemplado.
* Roberto Naime, colunista do EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
Fonte: www.ecodebate.com.br