A sinfonia da criação

Alfredo J. Gonçalves , CS*

Grito dos Excluídos: Vida em Primeiro Lugar. Pela vida grita a terra... Por direitos, todos nós.

A terra é fonte e berço da vida, ou da biodiversidade, a vida em todas as suas formas. Daí o termo indígena Pacha Mama: terra como a grande mãe de todo ser que sobre ela vive e se reproduz! Como todo organismo vivo, também nosso planeta respira e pulsa, vibra e sofre, geme e chora, luta e grita. Em suas veias, corre o sangue transparente da água; de suas entranhas brota a seiva que nutre todas as espécies viventes; ao seu redor, qual bolha de oxigênio, a atmosfera lhe protege e sustenta.

O planeta Terra faz parte da gigantesca sinfonia do universo. Cada ser vivo e cada coisa, orgânica ou inorgânica, tocam determinado instrumento nessa orquestra descomunal da criação. Os astros brilham e iluminam, brilha igualmente o olhar dos que amam; abrem-se e sorriem as flores, gorjeiam e dançam os pássaros, pulam e brincam as crianças; murmura e ruge a água, o vento, o mar e a brisa... No ar, na água ou no solo, cada nota em seu tom e lugar. É o fantástico cântico das criaturas, irmãs umas das outras, como lhes chamava o pobre de Assis.

Organismo enfermo
Mas um mínimo toque destoado desafina a melodia inteira. A música se faz ruído, se faz cacofonia. Como na "pauliceia desvairada" (Mário de Andrade), onde carros e pessoas, motores e máquinas ensurdecem o ambiente. A poluição sonora instala-se no lugar da sinfonia do universo. Até mesmo o coração humano, atormentado de tantos e tão variados sons, se vê lançado para fora do diapasão divino. É como se seguíssemos na onda FM, enquanto a criação permanece em AM. Em lugar de sons harmônicos e melodiosos, ouve-se o chiado da falta de sintonia. O barulho, ou barulhos no plural, nos afasta do embalo silencioso e repousante da Casa que Deus fez para nós. Fez e "viu que tudo era bom", repete insistentemente o Livro do Gênesis. Acumulam-se os ruídos dos seres humanos e de seus artefatos. E assim, conforme a sabedoria popular, "faz mais barulho uma árvore que cai do que uma floresta que cresce". Ou, de acordo com o lema do Grito dos Excluídos, "Pela vida grita a terra... Por direitos, todos nós!"

Sim, a terra também ergue ao céu seu grito. Grito surdo e mudo que, silenciosamente, expõe feridas cada vez mais fundas e sangrentas. Muitas irreversíveis! Além da desafinação sonora, o planeta sofre a poluição do ar e das águas, do lixo e do desperdício; frio e calor em excesso, além de outras mudanças climáticas que desertificam e esterilizam o solo; a devastação da fauna e da flora, em suas variadas espécies; a emissão de toneladas de gases tóxicos, de efeito estufa; o aquecimento global e o derretimento das geleiras; a destruição dos mais ricos e diferenciados ecossistemas, com o desequilíbrio do ritmo vital; o buraco na camada de ozônio, deixando-a mais vulnerável aos raios solares.

A terra está doente: sofre, grita e reage. A política e econômica de produção/consumo desenfreado, junto com a exploração exaustiva dos recursos naturais, agridem seu ritmo cadenciado e próprio. O modelo neoliberal, ao mercantilizar até mesmo as fontes sagradas da vida, faz esse organismo colossal emitir sinais crescentes de reação. Chagas de uma enfermidade crônica se abrem e supuram por toda sua superfície, com pouca esperança de remédio. As tempestades se revelam mais intensas e brutais. Nevascas e estiagens se alternam. Furacões, tornados e vendavais varrem o solo e a população. Chuvas torrenciais e inundações tornam-se rotineiras. Isto para não falar dos acidentes nucleares. Interrogava-se, com razão, a Campanha da Fraternidade deste ano: serão "dores de parto" ou estertores da agonia?

O grito dos desterrados
Grita a terra e gritam seus filhos. Na medida em que a técnica e o progresso aceleram freneticamente o ritmo natural de reprodução da vida, sofrem gradativamente as gerações que vão se sucedendo. O motor do lucro e o afã da acumulação de capital desequilibram a convivência entre o planeta e as criaturas. Impossibilitada do direito de ser mãe, a terra como que se vinga. E como toda vingança, também esta costuma se abater sobre quem mais se ama. De tudo isso resulta um número cada vez maior de "refugiados ou migrantes ambientais", como denunciam os cientistas, os movimentos sociais e as organizações em geral.

São multidões desalojadas do solo que os viu nascer, lançadas improvisamente à estrada, em vertiginosa fuga por desastres que se repetem. Arrancadas e mutiladas como as árvores, exibem ao sol e às intempéries suas raízes ressequidas. Vítimas de catástrofes cada vez menos "naturais", onde a violência humana sobre a terra precede a reação igualmente violenta desta. Pessoas e famílias, grupos e povoados inteiros deslocados pelo impacto do vento e da água em fúria, da seca ou do deserto estéril, de grandes projetos que simplesmente desconhecem as sábias leis da natureza. Sobe ao céu o grito dos desterrados, os quais, sem raiz nem direito à cidadania, perambulam pelos caminhos à procura de uma nova pátria.

Por trás desse grito, avança a derrubada da floresta, o agronegócio mantido pelos cifrões, a empresa agroindustrial, a mineração descontrolada e a irrigação das grandes fazendas, as obras faraônicas, o monocultivo de exportação, a cana-de-açúcar voltada para o transporte privado... Enfim, a fome voraz de novas fontes de energia e de matéria-prima para sustentar o luxo e o padrão de vida de poucos, ao lado da exclusão social da imensa maioria. Luxo e padrão hoje insustentáveis, se levarmos em conta o ritmo natural da terra.

Fuga que pode virar busca
Os refugiados, políticos ou ambientais, como também os migrantes em geral, nunca são apenas vítimas de um modelo concentrador e excludente. São também sujeitos. Sua fuga pode se transformar em uma nova busca. O próprio fato de migrar atesta sua condição de profetas sobre a face da terra. Verdadeiros protagonistas de uma nova sociedade. De fato, os deslocamentos constituem, por um lado, o grito de denúncia sobre uma política econômica e um progresso técnico que desaloja, mutila e mata; e, por outro, um grito de anúncio sobre a necessidade de mudanças urgentes e necessárias. Mudanças que levem a um modelo civilizatório mais sóbrio e frugal, mais solidário e sustentável. Somente então o grito da terra e dos desterrados sobre ela pode significar nova luta pela vida e por direitos.

* Alfredo J. Gonçalves, CS, é superior provincial dos missionários carlistas e assessor das pastorais sociais. Publicado na revista Missões, N. 07 - setembro de 2011.

Fonte: Revista Missões

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