No meio do caminho tinha uma pedra

Alfredo J. Gonçalves , CS*

"No meio do caminho tinha uma pedra. Tinha uma pedra no meio do caminho.
Tinha uma pedra No meio do caminho tinha uma pedra".
(Carlos Drumond de Andrade)

São inúmeras as "pedras no meio do caminho" da trajetória política brasileira. As "retinas fatigadas" de todo cidadão que acompanha minimamente o comportamento e as decisões políticas bem sabem quais são essas pedras. Aparecem como verdadeiros fantasmas difíceis de exorcizar. Ou como entraves históricos e estruturais que facilmente são naturalizados como coisas do dia-a-dia. Os cientistas sociais, com destaque para Celso Furtado ou Florestan Fernandes, não se cansam de apontar sua existência e persistência.

Entre tais fantasmas ou entraves, não custa sublinhar alguns: juros altos, inflação recorrente, carga tributária das mais pesadas do planeta, endividamento crônico e a velha dependência do mercado internacional. Mas faltaria ainda assinalar o nepotismo, o centralismo, o populismo personalista, o coronelismo, para não falar de outros "ismos" que, como chagas purulentas vão corroendo o tecido social e fazendo desacreditar dos contratos e promessas políticas. Em meio a esse terreno minado, os mandatos como que vão passando de pai para filho, numa disputa ferrenha no interior das classes dominantes pelos cargos públicos.

No decorrer dos séculos, sem exceção das últimas décadas, tropeçamos nessas pedras com uma frequência que as torna normais ou "naturais". É natural que um político, seja ele deputado ou senador, ministro ou juiz da mais alta corte, tenha seu patrimônio multiplicado por cinco, dez ou vinte vezes. Com Antonio Palocci, Ministro da Casa civil, as coisas não são diferentes. Naturaliza-se seu rápido enriquecimento com o argumento de que "vários políticos fazem a mesma coisa". Ao invés de combater o pecado, justifica-se o pecador com a alegação de que ele é "apenas mais um" entre tantos outros. Generaliza-se para encobrir o erro. Aplica-se aqui o conceito de patrimonialismo de Raymundo Faoro.

Não precisa ser economista nem falar o economês para saber quem paga a conta ou quem vai desatar esses nós da política brasileira. "A corda sempre rebenta do lado mais fraco", diz com razão o ditado popular. Um exemplo basta como comprovante: para produzir, os empresários pagam juros vultosos; mas, para consumir, os juros que pagam os cidadãos são mais elevados ainda, muito mais elevados! Prova disso está nos juros do cartão de crédito, dos empréstimos bancários ou do cheque especial. Sem falar que os custos de produção acabam sendo irremediavelmente repassados para a ponta da cadeia mercantil, que é o consumidor.

Por trás desse processo de economia míope e por trás da carga tributária, encontram-se os gastos estratosféricos e progressivos da máquina governamental, seja ela em nível federal, estadual ou municipal. No interior dessas máquinas mora um vírus que resiste a todo tipo de vacina. Quase impossível erradicá-lo! Uma verdadeira praga que mantém intocável os privilégios da Casa Grande, bem como a cultura da corrupção, do corporativismo e da apropriação privada da rex pública. "Aos companheiros da base governista, tudo; aos outros, a lei"!

Entra governo e sai governo, mas a chaga permanece. Daí a dificuldade de o Congresso Nacional aprovar qualquer projeto que mexa nos benefícios das classes dominantes e tente uma melhor distribuição de renda e riqueza. Dificuldade que contrasta frontalmente com a facilidade de aprovar o aumento para os representantes dos três poderes. Em semelhante quadro, não seria exagero falar de certa promiscuidade entre o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Quando convém, um protege e legitima o outro; quando não, todos se unem para expor, fritar e linchar politicamente determinado "bode expiatório". Assim se resolvem os escândalos: frente à estridência denunciatória da mídia, da OAB ou da CNBB, por exemplo, basta enviar algum político medíocre para o patíbulo, e tudo está resolvido. "Melhor que um só morra por todos"! E essa prática diferenciada da justiça acaba comprando o silêncio do público.

Quanto ao cidadão, segue pagando as despesas, não raro descontadas na fonte. E sabendo que será irrisório o retorno em bens públicos. Juros e impostos nem sempre se convertem em melhorias sociais. Ao contrário, parece haver aí uma proporção inversa e perversa: quanto mais se paga, menos se pode desfrutar dos progressos relativos à saúde, educação, moradia, transportes, segurança, lazer... A tal ponto que a pergunta é inevitável: para onde vão os tributos que, em média, chegam a 40% de tudo o que se produz, se compra e vende e se consome? O cidadão consciente não pode deixar de refletir sobre essa questão!

* Alfredo J. Gonçalves, CS, superior provincial dos missionários carlistas e assessor das pastorais sociais.

 

Fonte: www.provinciasaopaulo.com

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