A terra como prêmio

Egon Heck *

"Naquele momento, ao receber aquele prêmio, apertar a mão do presidente da República, não consegui sentir emoção nenhuma. Imaginava a terra dos Kaiowá Guarani. Não consegui comemorar nada. O prêmio que nosso povo espera é a terra. E essa nós não recebemos ainda. Por isso não consegui sentir nada". Com essas palavras, entrecortadas de silêncio e sentimento, a liderança indígena, professora e universitária, Leia Aquino, foi desfilando seu sentimento diante de uma grande platéia reunida na Universidade Federal da Grande Dourados, dia 21 deste mês. Ela foi uma das lideranças indicadas para receber o Premio de Direitos Humanos, conferido pela Secretaria Especial da Presidência da República, às pessoas e entidades que se destacaram na defesa dos direitos humanos. Pela primeira vez foi incluído a categoria Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas. E o primeiro prêmio foi para a Aty Guasu.

Antes de chegar à sala da entrega oficial do premio a todas as comunidades Kaiowá Guarani do Mato Grosso do Sul, a expressiva estatueta de bronze, uma mãe com um filho no colo, esteve passando de mão e mão dos indígenas participantes do ritual do batismo do milho na casa do Nhanderu Getulio Juca. Ali o prêmio parecia contagiar de animo o grupo em ritual. Depois parte do grupo foi fazer também a reza na universidade.

Apesar do angustiante grito pela demarcação das terras, as manifestações também ressaltaram a importância do premio que significa o reconhecimento por parte do governo da luta dos Kaiowá Guarani pelos seus direitos e ao mesmo tempo expressa que os direitos desse povo continuam sendo desrespeitados. A fala do deputado Pedro Kemp foi neste sentido. Por sua vez o procurador do Ministério Público Marco Antonio ressaltou que "o principal mérito do Prêmio é dar visibilidade à luta dos Kaiowá Guarani, pois essa é uma situação que não pode mais ser adiada". Concluiu dizendo "que a pior violência é a que mata um pouco a cada dia".

As lideranças indígenas expressaram sua alegria pelo recebimento do premio, pois além do reconhecimento das lutas do povo, é uma expressão de que existimos, estamos vivos. Isso é que queremos dizer ao Brasil e ao mundo. Anastácio Kaiowá lembra que o presidente Lula reconheceu o fato de estar deixando a presidência sem ter conseguido devolver as terras aos Guarani. Léia lembrou que "será que acham que ao nos conceder o prêmio vão nos calar?"

No dia 22 se realizou reunião do Conselho da Aty Guasu. Mais uma vez foi lembrado a importância desse momento histórico, em que o premio concedido à Aty Guasu e ao povo Kaiowá Guarani, anima ainda mais na luta. Mas também decidiram enviar uma carta à presidente Dilma, na qual lembram a dívida que o governo Lula e todos os anteriores deixaram ao não demarcarem as terras de seu povo. E alertam que se a identificação de suas terras não acontecer até a metade deste ano, isso representará um desrespeito ao prêmio e à Constituição.

Neste importante final de semana de celebração do premio em meio ao batizado do milho - jerosy puku, e definição das estratégias do movimento para este ano, vale lembrar que o que todos os Kaiowá Guarani desejam com urgência é o reconhecimento e demarcação de suas terras. Esse é o prêmio mais esperado. O prêmio é a terra.

* Egon Heck, Movimento Povo Guarani Grande Povo.

Fonte: Cimi MS

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