??Vida e economia?? no cooperativismo

Edivaldo Del Grande *

O cooperativismo inicia o ano de 2010 com vigor renovado pelo tema da Campanha da Fraternidade Ecumênica (CFE) 2010, "Vida e Economia". O documento escrito pelo Conselho Nacional das Igrejas Cristãs do Brasil (Conic), que traduz o lema, objetivos e estratégias da campanha que se estenderá por todo o ano, é uma defesa da economia solidária, com distribuição de renda justa e valorização da pessoa. Em boa parte, a CFE traduz a atividade cooperativista.

Não é de hoje que expoentes da Igreja defendem formas de organização econômica que em muito se assemelham ao cooperativismo. Em 1891, sensibilizado pelas más condições dos trabalhadores, o Papa Leão XIII publicou a Encíclica Rerum Novarum, motivado pelo fato de que a Igreja, defensora da dignidade e integridade da vida, não poderia mais ignorar as relações de trabalho desumanas. O documento propunha a reforma do capitalismo, tornando-o mais humano pela harmonização do capital/trabalho, ao mesmo tempo em que defendia a propriedade privada.

Essa encíclica suscitou a produção de novos estudos, fazendo a questão social figurar definitivamente entre as preocupações eclesiais. Em 1931, o Papa Pio XI escreveu a encíclica Quadragesimo Anno; em 1961, João XXIII publicou a Mater et Magistra e, em 1991, o Papa João Paulo II, considerado um dos mais populares da história, divulgou a encíclica Centesimus Annus. Esses documentos, somados ao texto de Leão XIII, levaram à chamada Doutrina Social da Igreja, que determina a postura da instituição frente aos desequilíbrios e injustiças sociais.

A Campanha da Fraternidade 2010 é a confirmação do posicionamento das igrejas cristãs, condenando a desigualdade social, a predominância do lucro sobre o trabalho. É o chamado para a urgência de encontrarmos o modelo que permita o crescimento sustentável do país, criando oportunidades de desenvolvimento para todos. É nesse contexto de convergência que o cooperativismo se apresenta. O documento produzido pelo Conic traz três itens sob o tópico "estratégias": 1) "Denunciar a perversidade de todo modelo econômico que vise em primeiro lugar ao lucro, sem se importar com a desigualdade, miséria, fome e morte"; 2) "Educar para a prática de uma economia de solidariedade, de cuidado com a criação e valorização da vida como o bem mais precioso"; e 3) Conclamar as igrejas, as religiões e toda a sociedade para ações sociais e políticas que levem à implantação de um modelo econômico de solidariedade e justiça para todos.

Independentemente de preceitos religiosos, o fato é que a essência dessa proposta em muito se identifica com os princípios do cooperativismo, que tem seu modelo econômico baseado no trabalho cooperado, na distribuição de renda mais justa e no desenvolvimento social de seus membros e, por consequência, da comunidade onde estão inseridos. Pesquisa da USP de Ribeirão Preto indica que o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) é maior em municípios que contam com a atuação de cooperativas.

O cooperativismo brasileiro é uma experiência vitoriosa, mas conhecida por poucos. Situação diferente ocorre em países desenvolvidos, onde o cooperativismo tem grande importância nas relações econômicas e sociais, como é o caso do Canadá, da Itália, Alemanha, Estados Unidos. Por isso, um dos maiores desafios do setor cooperativista brasileiro é se tornar conhecido e respeitado e, com isso, permitir que mais e mais pessoas possam usufruir de seus benefícios. A Campanha da Fraternidade é, sem dúvida, um impulso importante para sensibilizar um maior número de pessoas para essas questões, que há 166 anos são a "alma" do cooperativismo.

* Presidente da Organização das Cooperativas do estado de São Paulo (Ocesp).

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