Odilo P. Scherer
Nesta semana, de 8 a 12 de março, o clero da Arquidiocese de São Paulo está em retiro, em Itaici; Dom Bruno Gamberini, arcebispo de Campinas, é o pregador. Este é um momento importante do Ano Sacerdotal, que deverá contribuir para realimentar a vida espiritual e a mística dos padres na vivência do sacerdócio. Se eles estiverem bem alimentados espiritualmente, o povo também estará bem servido.
O Ano Sacerdotal é uma oportunidade especial para que o próprio padre e a comunidade dos fiéis redescubram a verdadeira identidade do sacerdócio,, a grandeza da vocação sacerdotal e a importância do serviço dos padres para a vida da Igreja. Sem eles, a Igreja não vive. A natureza própria da Igreja Católica inclui o ministro ordenado, como presença sacramental de Jesus Cristo à frente e no meio da comunidade dos fiéis. A Igreja é mais que uma simples organização humana, uma vez que ela também é obra da graça de Deus e da ação do Espírito Santo. Ela é um mistério humano-divino e, se quisermos entendê-la bem, nunca devemos esquecer nem separar esta sua dupla dimensão.
São Paulo dizia que ela é como um corpo, do qual Cristo é a cabeça e todos nós somos membros; Para São Pedro, ela é o templo, no qual Deus habita e todos nós somos pedras vivas desse templo espiritual. No Evangelho de São João aparece a imagem bonita das ovelhas e do pastor: a Igreja é o rebanho do Bom Pastor, que está à frente dela e ama, guia, nutre, defende cada uma de suas ovelhas; João também traz a imagem da videira e dos ramos: Cristo é a videira, nós somos os ramos; só produziremos frutos, se ficarmos inseridos nele. "Sem mim, nada podeis fazer".
É também nesta realidade humano-divina da Igreja que devemos entender a figura do sacerdote; sendo humano como todos os seus irmãos, ele, no entanto, foi chamado por Deus e colocado à frente da comunidade dos fiéis para representar Cristo, bom Pastor e Cabeça do corpo; em nome de Cristo e com seu poder, ele serve e santifica o povo, que não pertence a ele, mas a Deus. O sacerdote está a serviço dos homens nas coisas que são de Deus. Por isso, dizemos que ele representa sacramentalmente Jesus Cristo diante da Igreja e, em nome de Cristo, desempenha sua missão na Igreja. Sem esta relação com Cristo e a Igreja, não se compreende bem a figura do padre e se corre o risco de ver nele um funcionário de coisas ("negócios") religiosas, um mago que "mexe" com coisas sagradas, ou um simples agente de serviços sociais.
O padre permanece humano e sujeito a todas as fraquezas da condição humana; por isso, deve valorizar suas boas qualidades e capacidades humanas, para melhor colocá-las a serviço do dom divino que recebeu pela vocação e a ordenação sacerdotal. Ele deve andart no caminho da santidade e os defeitos e fraquezas humanas não devem ofuscar a grandeza do dom que recebeu, não por mérito seu, mas por graça e bondade de Deus; não para a própria vaidade, mas para servir ao reino de Deus e para o bem dos irmãos. Por isso, o padre também é chamado a exercitar-se na prática das virtudes e na ascese, para a sujeitar as fraquezas humanas à lei da graça e da santidade de Deus. No união profunda com Deus e na sintonia constante com a sua vontade encontrará sua força.
Infelizmente, em nossos dias, a imagem verdadeira e bonita do sacerdócio fica frequentemente ofuscada pela difusão de notícias sobre fraquezas humanas de sacerdotes. E também aparecem falsários, que usurpam as funções sacerdotais e enganam o povo, exploram comercialmente a fé e colocam em descrédito o serviço dos sacerdotes da Igreja. Tudo faz sofrer os padres, que nada devem e procuram viver dignamente o sacerdócio; mas tenho a certeza de que a Providência de Deus fará com que esse sofrimento seja purificador e, longe de destruir o sacerdócio, fará com que ele volte a emergir em toda a sua grandeza e beleza; assim também voltará a atrair mais jovens bem dispostos a se consagrarem inteiramente ao sacerdócio de Cristo no serviço da Igreja e da humanidade.
São João Maria Vianney, proclamado por Bento XVI como Padroeiro de todos os padres, na sua condição de humilde pároco de aldeia, tinha uma noção muito apurada da dignidade do sacerdote e, vivendo como autêntico homem de Deus, também sabia falar ao povo com simplicidade e encantamento sobre o padre: "se eu encontrasse um padre e um anjo, cumprimentaria o padre, antes de cortejar o anjo; este é amigo de Deus, mas o padre faz as vezes de Deus... Quando virdes um padre deveis dizer: Eis aquele que me tornou um filho de Deus e me abriu o céu pelo santo Batismo!" E observava também, com perspicácia e realismo: "quando se quer destruir a religião, começa-se por atacar o padre."
A oração pelos padres, diáconos e seminaristas, junto com o apoio e a colaboração com eles, reverterão na vitalidade das comunidades da Igreja e em abundantes frutos na missão da Igreja.
* Cardeal arcebispo de São Paulo.