Igreja na Ásia: entre o diálogo e a resistência

José M. Rebelo *

"A Ásia constitui um grande repto para a Igreja Universal. Os desafios são vários, mas os dois maiores interpelam-na a colocar o seu dinamismo missionário ao serviço da interação com todos os seus povos, culturas e religiões e põem à prova a sua capacidade de se incarnar e exprimir a fé de maneira contextualizada".

O Padre Bob McCahill, 70, é um missionário Maryknoll americano. Vive há 33 anos em Bangladesh. No seu estilo semi-itinerante de fazer missão, muda de lugar a cada três anos. Na cidade onde decide residir, aluga ou constrói uma barraquita de bambu onde cabe a cama, uma pequena secretária, as suas parcas coisas e possa guardar durante a noite a bicicleta, o seu meio de locomoção. Geralmente escolhe lugares onde não haja cristãos. Neste momento, vive em Narail, uma cidade a sete horas de ônibus da capital, Dhaka.

Num contexto predominantemente muçulmano como é aquele em que vive, a sua maneira de testemunhar o Evangelho é proporcionar tratamento médico aos doentes sem esperança de serem curados, sobretudo devido à pobreza das famílias. Quase todos os dias pedala umas dezenas de quilômetros para encontrar os doentes, combinar as visitas médicas e os internamentos. Não procura fazer cristãos. Diz claramente que "não serve a religião, mas Allah e os seus pobres."

O caso do padre Bob, de dedicação completa à evangelização direta, é deveras impressionante e talvez único. Num continente em que a liberdade religiosa é escassa em muitos países e os entraves ao trabalho pastoral dos cristãos abundam, grande parte das forças eclesiais e missionárias optou por se dedicar ao ensino. Tal compromisso dá à Igreja uma grande visibilidade e relevância social, mas esse trabalho não se traduz certamente num crescimento significativo da Igreja.

A Ásia constitui um grande repto para a Igreja Universal. Os desafios são vários, mas os dois maiores interpelam-na a colocar o seu dinamismo missionário ao serviço da interação com todos os seus povos, culturas e religiões e põem à prova a sua capacidade de se incarnar e exprimir a fé de maneira contextualizada. Ao longo dos séculos, o Cristianismo não tem sido capaz de tocar de maneira profunda a alma asiática. Não obstante o fato de ter tido origem no Médio Oriente, a Igreja não ganhou grandes raízes na Ásia. Não é de surpreender, por isso, que os cristãos sejam uma pequena minoria no continente.

As Filipinas e Timor-Leste são os únicos dois países onde o Cristianismo se implantou, ainda que mais transplantado do que inculturado. O diálogo do Evangelho com aquelas culturas, o que em termos teológicos é chamado de processo de inculturação parece ter sido até agora bastante superficial. Pelo menos nas Filipinas, o país onde trabalho há três anos, a Igreja encontra-se entre ritos importados do Ocidente e rituais pré-cristãos, sem que tivesse havido um enriquecimento mútuo entre Evangelho e cultura, como pode ser constatado pelas raras expressões locais de arte religiosa.

Na maior parte dos outros países, a Igreja não tem a vida fácil: cristãos e comunidades frequente ou sistematicamente experimentam hostilidade, discriminação e mesmo perseguição por causa da fé. Especialmente perpetrada pelo ateísmo de Estado (ex-países comunistas) e pelos fundamentalismos de caráter Islâmico e Hindu (a começar pelo Médio Oriente).

Por exemplo, a aplicação da lei anti-conversão em alguns Estados Indianos vai contra o direito à liberdade religiosa defendido pela Constituição. E, no Paquistão, as leis discriminatórias, como a da blasfêmia segundo a qual alguém acusado, frequentemente sem evidência, de comentários derrogatórios sobre o Profeta e o Corão pode ser enforcado ou condenado à prisão perpétua violam os direitos humanos e as mais elementares normas democráticas. Ataques de todo tipo fazem a Igreja sofrer um silencioso martírio.

O Evangelho tem muito a dar e a receber destas culturas e povos milenares. Mas, o tamanho reduzido de tantas comunidades cristãs e a intolerância religiosa a que estão sujeitas fazem delas comunidades de resistência, mais do que de missão. Apesar disso, o número de Católicos tem vindo a crescer na Ásia (ainda que ligeiramente menos do que na África), especialmente em paίses como a China, o Vietnã e a Coréia, e dá sinais de vitalidade.

* José M. Rebelo, missionário comboniano português, desde Manila (Filipinas).

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