Selvino Heck*
Quando começou 2008, pensei que este poderia ser um ano glorioso em todos os sentidos. Afinal, completavam-se 40 anos da revolta estudantil de 1968, quando a juventude rebelde gritava o sonho e a utopia, e de tantos acontecimentos que agitaram o mundo quatro décadas atrás.
Mas 2008 acabou sendo um ano muito difícil em muitos aspectos: perdas, despedidas, amores desfeitos, sofrimento, em meio a algumas alegrias e vitórias.
Foram muitas dores. O que mais doeu, e muito, foram algumas perdas inesperadas e imbecis, que acabaram marcando o ano fortemente, deixando sinais no coração e na alma. Primeiro foi um amigo do Seminário de Taquari, falecido de repente aos cinqüenta anos, o Luís, dono de um restaurante que eu sempre freqüentava em Porto Alegre. Depois, a dureza da morte de Frei Arno Reckziegel, primo, companheiro de sempre e confrade, de hepatite B, não detectada a tempo. Mais adiante, um acidente mata 13 companheiros da Rede Talher de Educação Cidadã, em Rondônia, batida de ônibus em caminhão; a seguir, foi-se uma grande amiga e companheira de lutas, Clara Scott, apoiadora em todas as minhas campanhas eleitorais; em seguida, a Dirce da Secretaria Especial das Mulheres do governo Lula, em acidente, o Pilla Vares, ex-presidente do Partido dos Trablahadores de Porto Alegre, grande figura e intelectual; e por fim a Rosani Cunha, Secretária de Renda de Cidadania do Ministério de Desenvolvimento Social (MDS), acidente em Buenos Aires. Perdas, muitas perdas, duras perdas, todos inesperadamente, todos/as com 60 anos ou menos.
Por outro lado, não posso me queixar. Foi um ano em que comecei a entrar para a história, talvez muito cedo. Primeiro semestre, uma tese sobre a história da Teologia da Libertação no Rio Grande do Sul, na qual eu e Frei Arno somos personagens importantes segundo Cleo Bonotto, autor da tese. Segundo semestre, o livro Abaixo a Repressão, sobre o movimento estudantil gaúcho nos anos 70/80, de Rafael Guimarães e Ivanir Bortot, onde sou personagem entre muitos companheiros e companheiros da época.
No governo Lula, fora a crise econômica internacional, que ainda vai revelar algumas de suas conseqüências em 2009, foi um ano de avanços. O Brasil tem rumo, apesar de tantas dificuldades. Os pobres comem mais e melhor, o emprego é amplo como há muito não se via, lentamente avança a distribuição de renda, as políticas públicas se espraiam Brasil afora. A política internacional soberana se afirma, com relações preferenciais com os irmãos da América Latina, inclusive Cuba, o que anuncia novos ventos e possibilidades.
A crise econômica internacional permitiu a eleição de Obama, primeiro presidente negro dos EUA. Pode não ser, e não será, uma mudança radical, mas sua eleição é cercada de simbolismos. Abre-se um novo tempo. A própria crise obriga a refletir sobre o desenvolvimento das últimas décadas. Depois de 1989, da queda do Muro, pela primeira vez é possível questionar o projeto de sociedade e começar a debater e pensar a partir de novos paradigmas, novos valores. Os projetos de desenvolvimento e de sociedade, capitalista neoliberal, mostraram sua inconsistência e irracionalidade. É preciso mudá-los radicalmente, mais que reformá-los. Destroem a natureza, não têm sustentabilidade ambiental, não trazem a felicidade e o bem-estar para homens e mulheres.
Somando e subtraindo, vejo, afinal, que não posso em queixar. A dor das perdas vai ficar presente muito tempo, a vida toda. Assim como a felicidade de ver avanços. 2008 vai acabando. A vida e o tempo têm dessas coisas, ainda mais quando a idade vai chegando, inapelavelmente.
2008 se vai, novo ano chega. ‘Vamos em frente que atrás vem gente.' Sem medo de ser feliz.
FELIZ 2009 A TODAS E TODOS!
* Assessor Especial do Presidente do Brasil