19 de julho - Dia Nacional do Futebol

Elaine Tavares *

O dia 19 de julho marca um momento importante na história da pequena cidade do Rio Grande, na ponta sul do Rio Grande do Sul, e também na história do futebol brasileiro. Foi nesse dia, em pleno inverno gaúcho, que nasceu o primeiro clube de futebol do país, no despontar do século XX, em 1900, com o nome de Sport Club Rio Grande. Desde aquele momento, o clube nunca parou de funcionar, completando, agora, em 2014, 114 anos de atividades junto a comunidade riograndina. Por conta desse acontecimento histórico, a CBF instituiu o dia 19 de julho como o Dia Nacional do Futebol. Assim, a cidade de Rio Grande tem muitos motivos para celebrar.

O futebol, diz a história, chegou ao Brasil em 1849, através de Charles Miller, que, tendo estudado na Inglaterra, tomou conhecimento desse jogo que já fazia escola por lá. Ao voltar ao Brasil, trouxe com ele uma bola, uma agulha de encher, um uniforme e as regras do jogo. Mas, as origens do futebol remontam a tempos mais antigos. Fala-se de um jogo parecido praticado na China há 2.600 anos, com oito jogadores em cada time, num campo de 14 metros. Também há notícias de um jogo semelhante entre os Maias, que viviam no que hoje corresponde ao território da Guatemala.

No Brasil, a prática do futebol foi se espalhando a partir de Charles Miller na região sudeste, e logo clubes de regatas como o Flamengo, Vasco da Gama e Vitória começaram a incorporar o esporte. Em Rio Grande o conhecimento do futebol chegou a partir do porto, com os ingleses e outros europeus que passavam ou decidiam fincar raízes na cidade. Assim, aconteciam as partidas, nas ruas mesmo, com bolas que vinham importadas da Inglaterra. Como a gurizada foi tomando gosto pela disputa da bola, um pequeno grupo de pessoas (21 esportistas) entendeu que era preciso formar um clube, onde o esporte pudesse se organizar. Sabe-se que o processo de criação começou em 1895, mas foi só em 1900 que a fundação foi efetivada, com pompa e circunstância, sob a direção de um alemão: Johannes Minnemann. Era o primeiro clube, exclusivamente de futebol, no país. Vinte e três dias depois, a Ponte Preta também apareceria como clube e depois, o processo se espalhou.

As cores do clube acompanham o verde, vermelho e amarelo, as mesmas da bandeira do Rio Grande do Sul, e seu pavilhão tricolor nunca deixou de tremular na cidade. Desde os primeiros campeonatos que disputou, o clube foi se consolidando como um patrimônio da cidade, chegando a viver fases áureas no futebol gaúcho. Hoje, o futebol já não é a marca registrada, o clube enfrenta problemas, mas segue confiando na vida esportiva da cidade. Toda a sua história de ligação com os riograndinos fez, inclusive, com que o clube apoiasse - através da Fundação Sócio Cultural Esportiva do Rio Grande - um importante projeto de esporte e saúde, hoje coordenado pelo Centro de Referência Esportiva Rio Grande, em parceria com a Petrobras.

O esporte como educação

O futebol para os riograndinos sempre foi uma festa. E, mais do que ganhar campeonatos, o importante era disseminar a prática pela cidade, para que a garotada pudesse ter a oportunidade de "sacudir o esqueleto" e, quem sabe, até tomar a prática como uma profissão. Foi pensando nisso que o Sport Clube Rio grande criou, em 1995, a Fundação Sócio Cultural Esportiva do Rio Grande - FUNSERG, para trabalhar com atividades esportivas e recreativas, que pudessem garantir à crianças e adolescentes um espaço prazeroso de esporte, sem o desespero da competição.

Esse também foi um passo pioneiro do clube, porque trouxe para o mundo do esporte um pensar totalmente inovador, integrando as atividades esportivas à vida social. E foi essa tradição sócio/esportivo/cultural, que vem desde as primeiras peladas de rua até os dias atuais, que deu o foco para a parceria com a Petrobras no projeto de construção do Centro de Referência Esportiva, que tem como objetivo proporcionar práticas esportivas que contribuam para a formulação de políticas públicas de esporte e lazer para toda a população.

O trabalho do Centro de Referência Esportiva (CRE) atua em oito frentes: futebol, basquete, vôlei, natação, taekwondo, box, capoeira e atletismo. Todos são oferecidos gratuitamente e envolvem mais de 900 crianças e adolescentes da comunidades de Rio Grande, além de estudantes de cidades vizinhas, que tomam contato com o processo através dos seus professores, formados pelo projeto. No Centro são 130 professores que cuidam do processo educacional, buscando romper com a esportivização das práticas corporais. A proposta básica é: ensinar as bases técnicas dos esportes, sem perder o vínculo com a alegria e a democratização dos jogos populares.

Como é o trabalho

As atividades desenvolvidas pelo CRE Rio Grande, com o apoio do Sport Clube Rio Grande, que inclusive cede as suas dependências, não apenas centram o trabalho nas crianças. Elas igualmente se espraiam para a formação de professores, uma vez que é base da proposta ampliar o espectro desse olhar original e inventivo sobre as práticas corporais. Assim, são realizados sistemáticos encontros de formação de professores de Educação Física, com oito redes municipais envolvidas, potencializando as novas práticas para além da cidade de Rio Grande.

Com a parceria da Petrobras esse atendimento é efetuado sem custo para as escolas, para os professores e para as crianças. Além disso, e justamente por conta da força da rede de esporte educacional que vai se formando pela ação dos educadores, sistematicamente são melhoradas as áreas físicas e os equipamentos de esporte e lazer que andam sucateados, principalmente nas comunidades mais empobrecidas, que acabam proliferando na mesma medida em que outra áreas vão se desenvolvendo. São os educadores, na comunhão com os educandos, que descobrem a melhor forma de atuar na batalha pelas demandas de áreas qualificadas e bons equipamentos para a prática esportiva e corporal, junto às prefeituras. Assim, a ação educativa no esporte também se transforma em ação política coletiva.

E foi assim, seguindo a velha tradição de ligação visceral com a cidade, pensando nas crianças que vivem nos bolsões de miséria, que o Sport Rio Grande e a Funserg decidiram apostar nessa nova prática com relação ao esporte. Por isso, aliados à universidade local, que tem um curso de Educação Física, e às comunidades que reclamam políticas de esporte e lazer, decidiram que era hora de irradiar, desde seus compromissos históricos, uma cultura esportiva que atuasse também no campo da transformação social.

Tanto as melhorias físicas como o trabalho de formação já leva quase dois anos. A intenção é chegar ao atendimento de 1.200 crianças só em Rio Grande, com ampliação das oficinas de formação para os seis municípios vizinhos (São José do Norte, Canguçu, Arroio Grande, Santa Vitória do Palmar, Capão do Leão e Chuí), o que amplia para 10 mil crianças envolvidas. Tudo isso consolida uma poderosa rede de educadores que qualifica a prática desportiva e irradia para todo o Estado outra forma de vivenciar o esporte, não só como competição e rendimento, mas como alegria e brincadeira.

Nesse processo, o compromisso é atuar com novos conhecimentos teórico-metodológicos que incorporem práticas esportivas de cunho educacional, solidário e cooperativo, o que permite um olhar alternativo sobre o esporte que, acredita-se, possa se refletir também em todo o processo educacional, seja formal ou não. Juntar esportes clássicos com práticas populares como a capoeira, por exemplo, leva o jovem a compreender que aquilo que ele traz como cultura e vivência da rua igualmente tem valor. Assim, a cultura popular também aporta significados ao trabalho sistemático, típico da ciência.

Tudo o que acontece hoje em Rio Grande, a partir desse espaço histórico, é um grande desafio, mas, para os educadores envolvidos, essa parceria entre a técnica e a alegria das ruas, só pode render resultados positivos. O esporte não é apenas uma forma de manter o físico ou disputar competições. Pode ser também espaço de construção de novas práticas que, saídas do movimento corporal, possam se incorporar na vida mesma, na política, na economia, no modo de organizar a existência. Quando abstrações como solidariedade, equidade e cooperação começam a ser vividas na prática, a tendência é uma mudança radical no cotidiano.

É assim, que o velho Sport Club Rio Grande vai mantendo firme as suas raízes, acompanhando as mudanças e apostando numa nova forma de viver o esporte. Num tempo em que o futebol se transforma em mercadoria, perdido de sua alegria, caminhar na contracorrente, aliado à juventude, é um ato corajoso e vitalizante, digno de um campeão.

Nesse dia nacional do futebol, vida longa e próspera ao clube e ao projeto de Esporte Educacional.

* Elaine Tavares é jornalista.

Fonte: www.eteia.blogspot.com

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