O Papa e o Filósofo

Sandro Magister

No encontro que teve com Barak Obama, o Papa Francisco não ficou calado sobre os problemas que a igreja americana atravessa em relação ao Estado, tais como o direito à liberdade religiosa, à vida e à objeção de consciência. O papa quis que isso constasse no comunicado final sobre o encontro.

Jorge Mario Bergoglio não gosta da discussão através dos meios públicos, mas diretamente com os poderosos. Quanto aos problemas locais, prefere que sejam os bispos a intervir. Contudo não oculta os problemas quando tem a oportunidade de falar. É por isso que quando tira fotos com os poderosos não mostra sorriso. Não poderia ser diferente, uma vez que o papa mantém um discurso muito crítico a respeito dos problemas que o mundo de hoje não quer enfrentar.
O posicionamento do papa a respeito de alguns problemas mundiais não fica claro, fala simplesmente do diabo que dificulta a vida dos cristãos no mundo. Faz aceno aos poderes políticos e econômicos ou, como fez em 18 de novembro do ano passado, fala contra o posicionamento de "pensamento único" que quer colocar a seu serviço a humanidade inteira, mesmo à custa de sacrifícios humanos e formulando leis que os protejam.

Bergoglio não tem um pensamento exclusivo seu. Há um parâmetro literário de referência muito frequente em seu linguajar inspirado no romance apocalíptico de Robert Hugh Benson, "o dono do mundo". O autor é um convertido no começo do século passado, filho de um arcebispo anglicano de Canterbury

Mas o maior inspirador de Bergoglio na reflexão sobre o mundo de hoje é Alberto Methol Ferré, um uruguaio de Montevideu. Ele atravessava muitas vezes a fronteira para se encontrar com o arcebispo de Buenos Aires e morreu em 2009 com mais de oitenta anos. Esse e outros autores críticos têm inspirado o papa a refletir sobre o "ateísmo liberal", "messiânico" ou de inspiração marxista. O papa assim comenta esse ateísmo liberal:

"O ateísmo edonista e seus adendos de inspiração neognóstica tornam-se paradigmas da cultura dominante, com projeção e difusão global. Eles geram uma atmosfera que nos rodeia como um novo ópio da humanidade. O "pensamento único", além de ser socialmente e politicamente totalitário, é portador de estrutura gnóstica: não é humano, repropõe formas de recionalismo absolutista que se apresentam na forma de edonismo niilista como é descrito por Methol Ferré. Isso aparece claro no ecumenismo maçônico atual. Ferré afirma que esse messianismo muito mais do que ser humano é liberal, sem consciência ética. Não é revolucionário mas cúmplice com as situações degradantes. Não tenta se impor, mas se expande como um fenômeno de massa.

É um fenômeno parecido com o que aconteceu na época do iluminismo e do marxismo. O ateísmo liberal expande a ideia de que a vida humana tem o destino do prazer, da auto satisfação, com uma busca escondida de aparência de beleza. Neste sentido, essa ideologia deturpa a beleza porque a separa da verdade e da justiça. Esse ateísmo não é uma ideologia, mas uma prática socializada que não se vence com proibições, com regras abstratas. A uma prática é necessário opor outra prática que seja consciente e assumida.
Segundo Ferré, no mundo de hoje, a igreja é a única entidade que tem condições de se opor ao ateísmo liberal. Segundo ele somente a igreja é verdadeiramente pós-moderna. Talvez por isso que o papa diz que a igreja não pode apresentar-se no mundo de hoje como uma babá.

 

Fonte: Site Chiesa

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