Mercenários ou falsos pastores fazem chantagens com seus fiéis, manipulando suas consciências.
Por Roberto Malvezzi (Gogó)*
A parábola bíblica do Bom Pastor é uma das mais conhecidas. Jesus se compara a um bom pastor, que cuida bem de suas ovelhas, que dá sua vida por elas e as defende dos lobos vorazes (João 10, 1-18). Porém, o contrário do Bom Pastor não é o lobo, mas o “mercenário”, aquele que finge ser pastor, mas quando apertado abandona suas ovelhas e foge.
O mercenário é mais que um fujão. Ele pode explorar suas ovelhas, ficar rico às custas delas, manipular sua boa vontade, manobrá-las como se fossem um grupo de idiotas.
No mundo contemporâneo e urbanizado não é fácil sustentar a parábola do Bom Pastor. Ninguém mais hoje em dia quer ser ovelha, no sentido que simplesmente obedece a uma voz de comando sem entender o que está acontecendo. Por isso mesmo, em outro contexto, Jesus vai dizer aos seus discípulos que eles não são servos, mas amigos, porque o servo não sabe o que faz ao seu Senhor, mas o amigo sabe (João 15,15).
Quem conheceu o sertão nordestino anterior à década de 1990 sabe o que eram os currais eleitorais. A voz de um coronel era capaz de determinar os votos de toda uma comunidade, até de um município, até de uma região. Eram os senhores da vida e da morte da população. Ainda é atual o célebre livro de Victor Nunes Leal “Coronelismo, Enxada e Voto”. Mas, as oligarquias nordestinas foram caindo no curto período democrático que passamos, e a última a cair foi a dos Sarney no Maranhão. Hoje temos novos governadores no Nordeste e as viúvas dos coronéis hoje encontram alguma guarida no bolsonarismo, por isso não passam muito de 20% da população do Nordeste.
Mas, novos currais eleitorais passaram a ditar a vida de milhões de brasileiros no Brasil atual. São massas humanas dominadas por mercenários, que se dizem pastores, mas que obrigam por chantagens religiosas suas ovelhas a votarem em candidatos pré-determinados, a fazerem arminhas, a não frequentarem outras igrejas, a ouvirem somente suas músicas religiosas, a entregarem seu dízimo e suas consciências aos seus orientadores. Isso acontece tanto em setores da Igreja Católica como em igrejas evangélicas.
Os tempos são outros, mas o medo à liberdade faz com que muita gente prefira ser ovelha que pessoa humana. Os currais eleitorais continuam vivos, agora como currais eclesiais.