Os problemas psiquiátricos inerentes ao tradicionalismo

O tradicionalista cria para si a fantasia de um passado eclesial ou até mesmo de tempos que nem sequer existiram na bimilenar história da Igreja.

Por Edson Luiz Sampel

Em primeiro lugar, entendemos por tradicionalismo a cosmovisão gnóstica – reles caricatura da tradição – que repudia o progresso, principalmente a progressiva interpretação do dogma, já que nos restringimos ao âmbito religioso do tradicionalismo. “Em seu aspecto material, consiste o verdadeiro progresso no reto aproveitamento das forças da natureza, segundo a lei de Deus e a serviço do homem” (Revolução e Contrarrevolução, p. 79).
Dias atrás tivemos a infausta notícia de que mais um padre de uma das dioceses do município de São Paulo (são 5 Igrejas particulares em São Paulo) apostatara para o tradicionalismo! Acontecimento deveras triste!

Sem dissertar acerca do absurdo doutrinário que envolve o tradicionalismo (que não se confunde nem com a tradição nem com o conservadorismo saudável), queremos aqui ressaltar alguns problemas de ordem psicológica e psiquiátrica que grosso modo afligem as pessoas que se voltam a atitudes tradicionalistas.

Uma imagem já conhecida ajuda-nos a perscrutar a mente sandia do tradicionalista. Figuremos a Igreja Católica como uma frondosa árvore (que, de fato, ela é!), com folhas que caem frequentemente. Os fiéis, de um modo geral, perceberão que a substância da Igreja, isto é, o tronco da árvore ou a própria árvore, continua inalterável. Por outro lado, o tradicionalista intuirá que é necessário recolher todas as folhas deitadas ao chão e pregá-las novamente na árvore, a fim de que a Igreja não se desconfigure.

A atitude do tradicionalista é psicologicamente anacrônica. Em outras palavras, o tradicionalista cria para si a fantasia de um passado eclesial ou até mesmo de tempos que nem sequer existiram na bimilenar história da Igreja. É sempre perigoso querer viver uma fantasia, gênese de patologias psiquiátricas! Porque o tradicionalismo inculca um estilo quimérico, como, por exemplo, a fascinação pelo rito extraordinário da missa (missa tridentina), fanatizando-se mormente os jovens. Mas, por exemplo, o padre que debandara para rincões tradicionalistas não vive na Idade Média, da qual tanto gosta. Sem embargo, assume taxativamente padrões mentais que conflitam com o dia a dia. Como tal pessoa logrará, na sua mente e no seu espírito, concatenar não só ideias dissonantes, mas mecanismos intelectuais (formas de elaborar o pensamento) conflitantes? Refugir-se-á numa bolha como malogradamente experimentaram os quakers nos Estados Unidos? Abre-se a porta para o desequilíbrio: neuroses e psicoses!

Em suma, o tradicionalismo é um comportamento revolucionário da extrema-direita! Pode adoecer quem nele se inspira. Por isso, o papa Francisco, verificando o estreito liame entre o rito extraordinário da missa e o adestramento, máxime de jovens, contra o caráter vinculante do Concílio Vaticano II (ou seja, a tentativa doentia de se fixar no passado), exarou a carta apostólica Traditiones Custodes, salvaguardando a verdadeira tradição e, profilaticamente, dando as bases para a escorreita vivência da fé, uma vez que a missa é o centro da vida do cristão.

Lamentamos veementemente as defecções de padres e leigos para o tradicionalismo! Correm risco a salvação e também a saúde mental desses diletos irmãos. A precípua causa desse fenômeno contemporâneo se deve decerto à precária formação teológica. Neste diapasão, sugerimos que os institutos de teologia erijam cátedras específicas para estudar os 16 documentos do maravilhoso Concílio Vaticano II. Pode ser uma das vacinas contra o “dragão do tradicionalismo”!

Edson Luiz Sampel, Professor do Instituto Superior de Direito Canônico de Londrina.

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